Capítulo 27: Sentença

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Pov: s/n

As luzes das sirenes giravam num ritmo hipnótico, alternando o azul e o vermelho como se o próprio mundo estivesse pulsando em um batimento irregular, sem compasso. Cada giro da luz parecia drenar mais cor ao meu redor, sugando a vida de tudo o que tocava. Dentro da viatura, o som era abafado, distante, e minha mente vagava em um silêncio ensurdecedor, como se o próprio tempo tivesse hesitado em continuar.

Eu olhava pela janela, mas tudo parecia embaçado. As vozes da polícia, dos paramédicos, os gritos dos estudantes se transformavam num burburinho confuso, longe demais para alcançar minha consciência. Lá fora, a cidade que sempre conheci se tornava uma paisagem estranha, fria. As árvores, os prédios, as ruas — tudo passava como um borrão monocromático, sem vida, sem som. Era como se o mundo tivesse perdido seu próprio propósito, e eu não era nada mais que uma sombra, um resquício de algo que havia desaparecido para sempre.

Apoiei a testa contra o vidro frio, o toque gelado trazendo um alívio passageiro, mas incapaz de preencher o vazio dentro de mim. Eu sentia cada batida do meu coração ecoar nesse vazio, mas a dor parecia distante, desconectada, como se estivesse fora do meu corpo, como se pertencesse a uma pessoa que eu não era mais. Naquele momento, minha mente voltava para os últimos instantes: o olhar de Billie, o disparo, o som dos nossos corações... e o som oco da arma disparando nas mãos de Nate.

A cada flash de memória, eu afundava mais na escuridão. O peso do silêncio me engolia. Não havia raiva, nem tristeza, nem medo. Eu era apenas uma casca vazia, uma observadora em câmera lenta do meu próprio mundo que se desmoronava.

A viatura avançava, e pela janela, eu vi as luzes da ambulância ao longe, levando Billie para algum lugar onde eu não podia alcançá-la. O aperto na minha garganta tornava-se mais intenso a cada quilômetro que nos separava. E eu só podia olhar, presa nesse estado de torpor, onde tudo parecia tão distante, tão fora do meu alcance.

Eu não tinha reação. Tudo o que existia era o vazio. E enquanto a viatura seguia, levava também os últimos pedaços daquilo que um dia fui, deixando para trás a noite, o sangue, e o amor despedaçado que restou.

Ao chegar na delegacia, tudo ao meu redor parece um borrão cinza. O som de portas batendo, as vozes abafadas, o eco de passos rápidos... tudo se mistura, mas nada realmente se fixa em mim. Sinto-me como um fantasma andando por corredores frios, enquanto minha mente está presa em outro lugar, um lugar onde Billie está no chão, sangrando. Cada passo que dou parece me afundar mais nesse abismo de culpa e desespero.

Sou guiada até uma sala de interrogatório, onde uma delegada com um olhar atento, mas cansado, se senta à minha frente, segurando uma prancheta. Ela pigarreia, puxando minha atenção, mas minha visão parece vazia. Eu mal posso me focar nela, como se estivesse olhando através dela, revivendo em um loop as imagens de Billie caindo, o sangue, o som do tiro.

— Você pode descrever como tudo aconteceu? — ela pergunta, a voz firme, mas paciente.

Abro a boca para responder, mas as palavras não vêm. Sinto uma dor esmagadora, como se um peso estivesse pressionando meu peito. A pergunta dela parece ecoar na minha mente, mas não encontro força para falar. Tudo que vejo são as imagens do rosto pálido de Billie, desmaiada, e o sangue... tanto sangue.

— Você lembra seu nome? — a delegada tenta de novo, inclinando-se um pouco mais para me alcançar.

Mas a pergunta dela se perde. Eu estou em outro lugar, em outra dor. Não consigo olhar para ela, nem para mim mesma. Meus olhos fixam-se em algum ponto indefinido da mesa, enquanto uma onda de lembranças e arrependimento me domina. Não posso fugir do que aconteceu, das escolhas que fiz e das consequências que causaram. Cada segundo me sufoca mais, e as lágrimas que não chorei parecem se acumular em um nó preso na garganta.

Um Brilho Por Trás Do Bullying - Billie Eilish & S/NOnde histórias criam vida. Descubra agora