Capítulo 7: Marcas

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Pov: s/n

Acordei antes de Billie, e o primeiro raio de luz que atravessava a janela iluminou seu rosto de maneira suave e etérea. Eu a admirei por um momento, observando como ela parecia tão tranquila enquanto dormia. A maneira como seus lábios se moviam levemente em um sonho, a forma como seus cabelos bagunçados caíam sobre o travesseiro. Era quase surreal a forma como ela era linda.

Foi então que, de relance, meu olhar caiu sobre seu braço. A manga do seu moletom estava um pouco levantada, e, num ímpeto de curiosidade, me levantei mais para ver. E puxei mais a manva para que pudesse ver com clareza, entrei em estado de choque. Ali, exposta à pouca luz da manhã, estavam cortes, cortes recentes e profundos em seu pulso, linhas irregulares que transmitia dor. Meu coração disparou e uma onda de preocupação me atingiu de repente.

Aqueles cortes eram tão visíveis, tão cruéis. Não conseguia entender como algo assim poderia estar escondido sob a superfície. Billie, com toda a sua beleza e ela parecia tão bem nos últimos dias, revelava uma parte de si que eu nunca havia visto antes. Como eu não havia percebido isso antes?

Ainda olhando seu braço segurando a manga, meu celular começou a tocar, quebrando o silêncio do quarto e fazendo Billie acordar. Ela abriu os olhos lentamente, e seu olhar foi de encontro a minha reação com o que acabei de vê e ela rapidamente escondeu seu braço ajeitando a manga como se tivesse tido um susto, o toque do celular ecoava pela sala e antes de ir atender eu quis transmitir naturalidade e segurança.

- Ei, eu não tô aqui pra te julgar - disse, minha voz baixa e tranquilizadora por mais que a preocupação transpirasse pelo meu corpo, tentando afastar qualquer tipo de tensão que pudesse pairar entre nós.

Atendi o celular:

- Mãe? É. Ahã. Ai, por favor, ne? Ele não é mais criança. Minha culpa? Ok. Tá bom. Tchau.

Desliguei o telefone e a discussão da minha mãe por causa do meu irmão nem mexia tanto comigo quando Billie Eilish, eu estava mais preocupada com ela agora, do que com meus problemas familiares.

- Desculpa... Era a minha mãe, é que eu tô tendo uns problemas com meu irmão em casa.

Ela só assentiu com a cabeça, sentada no colchão enquanto eu estava em pé olhando pra ela, eu estava me segurando pra não falar, mas não resisti.

- Eilish... Eu não tô conseguindo ignorar o que eu acabei de ver no seu braço.

Ela não fala nada. Me abaixo e fico de joelho no colchão na frente dela. A encaro, mas ela não consegue olhar pra mim. Passo a mão sob seus cabelos e aliso seu rosto com carinho, meu olhar estava triste, talvez tão triste quando o dela.

Eu estava lá ajoelhada no colchão, buscando alguma resposta nos olhos de Billie, mas ela parecia longe, fechada em uma muralha de silêncio. Meu peito apertava com cada segundo que ela não dizia nada, e, antes que eu pudesse tentar novamente, ela desviou o olhar, ajeitando a manga do moletom de maneira quase impaciente.

- Meu irmão já tá voltando - ela disse de repente, a voz fria, os olhos fixos em um ponto qualquer da parede. - Acho que... é melhor você ir.

O ar pareceu sumir da sala, e uma sensação de desconforto tomou conta de mim. Eu engoli em seco, processando suas palavras como se elas fossem um aviso, uma barreira intransponível. Mas eu não podia simplesmente deixá-la ali com tudo aquilo preso dentro dela.

- Tem certeza, Billie? - perguntei, tentando manter minha voz firme, mas sentindo-a tremer. Ela nem me olhou dessa vez, apenas acenou com a cabeça, o rosto ainda impassível.

Aquilo me atingiu com um vazio que eu não esperava. Saí de lá sem dizer mais nada, sentindo como se tivesse perdido uma batalha. Assim que cruzei a porta e senti o ar frio lá fora, a tensão no meu peito explodiu. Uma onda de tristeza e preocupação tomou conta de mim, me arrastando para longe daquela noite boa que havíamos tido.

Já nem lembrava dos risos, da conversa, dos sorrisos que trocamos. Tudo parecia distante e sem importância diante do que eu havia acabado de ver e da forma como ela me afastou. Senti meus olhos marejarem, e antes que pudesse me controlar, lágrimas começaram a escorrer, cada uma carregando o peso daquela despedida silenciosa, eu não conseguia mais esquecer.

***

Assim que cheguei em casa, tudo o que eu queria era afastar a confusão que parecia ter se infiltrado em cada pensamento meu. Fui direto para o chuveiro, girando o registro para que a água fria pudesse talvez lavar um pouco desse caos que ainda estava preso dentro de mim. Enquanto a água caía e arrepiava minha pele, a lembrança da noite anterior invadiu minha mente sem aviso. Eu me vi de volta na casa da Billie, a sensação dos nossos rostos próximos, nossos olhares fixos um no outro, até que o beijo aconteceu.

Meu coração acelerou novamente só de pensar naquilo. Eu mal conseguia processar o que tudo isso significava para mim. Me perguntei, pela primeira vez, se o que eu estava sentindo era algo a mais que simples amizade, algo que ia além de admiração. Mas... Ao mesmo tempo que parecia errado, parecia tão certo. Aquela dúvida começou a me corroer, misturando vergonha e uma curiosidade que parecia mais forte a cada segundo.

E então veio a mente, como será que Billie se sentia em relação aquilo. Ela apenas me correspondeu, sem me afastar, sem fugir, sem estranheza. Será que ela também estava se perguntando o que aquilo significava, ou será que tinha sido algo passageiro, sem tanto peso?

- Você não pense que vai fugir da nossa conversa, s/n. - Minha mãe entrou no meu quarto, cruzando os braços, enquanto eu tentava pegar uma peça de roupa no armário.

- Mãe, por favor - tentei cortar, o cansaço evidente na voz.

- Eu não quero que você fique criando problema com seu irmão. Ele já tem muita coisa na cabeça. - Sua expressão firme me fazia querer gritar, mas mantive o controle, por pouco.

- Eu criando problemas? Mãe, eu não sou mais uma criança! - Me virei para ela, os olhos fixos. - Você acha que ele é santo? Pois você tá muito por fora da situação.

- Ah, agora você quer me ensinar o que tá acontecendo na minha própria casa? - Ela ergueu a sobrancelha, visivelmente incomodada. - Olha, s/n, você tem suas responsabilidades, e eu espero que você saiba lidar com elas.

- Minhas responsabilidades? Ele que vive provocando e, claro, sou eu que levo a culpa de tudo!

Ela suspirou profundamente, como se estivesse em um beco sem saída, mas ainda sem ceder.

- Você pode até achar que ele é o problema, mas talvez você devesse olhar pra sua atitude também. Eu só tô pedindo que você evite mais atritos dentro de casa.

- É fácil pedir isso quando não vê o que acontece de verdade. Você não entende, mãe! Eu só... eu só quero que você pare de colocar a culpa em mim como se eu fosse a culpada por tudo.

Ela balançou a cabeça, fechando os olhos por um segundo, e então suspirou.

- Eu só quero paz aqui, s/n. Essa casa já tem problemas demais, entende? Só colabore, por favor.

Minha mãe saiu do quarto, fechando a porta com um leve bater, e o silêncio voltou. Mas eu mal estava me importando com a nossa discussão. Aquelas palavras, os argumentos... tudo parecia distante, como se eu estivesse ouvindo alguém falar atrás de uma parede de vidro.

Minha mente estava longe, presa nas lembranças de Billie Eilish. A cena daquela manhã voltava, vívida e inescapável. O jeito como vi seu braço, as marcas dolorosas, o olhar assustado e vulnerável que ela me lançou... Meu coração apertava só de lembrar, e uma onda de preocupação voltava a me dominar. Ao mesmo tempo, o beijo da noite passada parecia agora mais real, mais intenso. Eu me perguntava o que Billie estava sentindo sobre aquilo.

Sentei na beira da cama, encarando o chão, tentando organizar meus próprios pensamentos, mas era inútil. Parecia que minha mente não conseguia desgrudar dela. E, mais do que nunca, a vontade de protegê-la crescia dentro de mim, junto com uma sensação estranha, profunda, que eu nem sabia como descrever.

Um Brilho Por Trás Do Bullying - Billie Eilish & S/NOnde histórias criam vida. Descubra agora