Circuito

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Durante seis dias, meu mundo é cor-de-rosa. Vivo num país colorido como o da abelha Maia do desenho animado e me sinto como uma princesa rodeada por duas pessoas que me amam e me protegem.
Fernando continua me procurando e, em sua última mensagem, avisa que sabe que Rafaela Kalimann está comigo em Jerez. Isso me deixa chateada. Não consigo digerir o
fato de Fernando estar a par da vida de Rafaela, mas decido ficar quieta. Se eu tentar explicar algo a Rafaela, com certeza a situação vai piorar.

Ela e meu pai estão se dando super bem e, embora a princípio meu pai tenha se aborrecido com ela por ter alugado um chalé, afinal entendeu que somos adultas e precisamos de privacidade.

Os amigos e vizinhos do meu pai logo apelidam Rafa de “a Frankfurt”, pelo fato de ser alemã, e ela acha graça disso. O temperamento espanhol, especialmente o andaluz, é tão diferente do alemão que percebo o quanto Rafaela se surpreende o tempo todo.

Todo dia meu pai se emociona com Rafaela. Noto que gosta dela, que a respeita e a escuta, e isso diz muito sobre meu pai. Inclusive saem juntos às vezes para pescar à tarde e voltam animados e felizes.

Nesses dias, sempre que posso dou uma escapada para correr e cantar pneu com minha moto. Adoro isso e me divirto como uma criança.
Numa dessas tardes, Fernando aparece com sua moto. Cruza meu caminho. Nós dois paramos.

— Você ficou louca? O que esse cara está fazendo aqui?
Irritada com sua intromissão, retiro os óculos de proteção do capacete.

— Você está passando dos limites. Não é da sua conta o que ela está fazendo aqui.
Fernando desce da moto e vem até mim.

— Pelo amor de Deus, Bia, seu pai sabe que ela é sua chefe?

— Não.

— E quando você vai contar?
A cada instante que passa, vou ficando mais irritada.

— Quando eu estiver a fim.
Fernando se move com rapidez e me segura pelo pescoço, encosta sua testa na minha e murmura:

— Bianca... eu te amo.

— Fernando, não...
Sem se afastar de mim, continua falando:

— Quero você só pra mim, com exclusividade. Essa garota não gosta de você tanto quanto eu, pense nisso, por favor, e...
Dou um empurrão nele e me afasto.

— Quero continuar meu caminho, Fernando. Sai da frente, ok?

— Você está me dizendo que prefere a companhia dessa mulher à minha? — murmura, sem se distanciar um milímetro sequer e com atitude provocativa.

— Essa garota está te usando. Quando ela se cansar de você, vai te abandonar, como fez com centenas de mulheres. Pra ela você é apenas mais uma, enquanto pra mim você é especial, não percebe? Pensei que você fosse mais esperta, Bianca, pelo amor de Deus.

Não quero ser cruel como ele está sendo comigo. Gosto de Fernando. É um bom amigo. Mas por Rafaela sinto algo tão forte que não posso ignorar. Como fico em silêncio, ele se vira e sobe na moto, mal-humorado.

— Tudo bem. Depois não diga que não avisei.

Em seguida vai embora e me deixa desconcertada e com um sabor amargo na boca.

No sétimo dia, meu pai me lembra do evento anual de motocross em Puerto Real, um vilarejo próximo de Jerez. Neste ano não estou muito a fim de participar. Prefiro curtir a
companhia de Rafaela, mas, ao ver a animação do meu pai e de seus amigos para que eu participe, acabo cedendo e convenço Rafaela a nos acompanhar.

Papai sempre quis ter um filho homem. Um menino. Mas a vida lhe deu duas filhas. Se bem que eu, com meu jeito meio moleca, talvez tenha compensado um pouco essa
carência.

The Boss / RabiaOnde histórias criam vida. Descubra agora