Ducati

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Assim que chegamos ao circuito, encontramos Roberto na entrada.
Ele me cumprimenta e me diz para esperar meu pai na reta dos boxes. Explico a Rafaela como chegar lá e ela brinca comigo, dando aceleradas que me fazem gritar e me segurar nela.
Ao chegarmos aos boxes, ninguém está lá. Descemos da moto e fico olhando para ela.
É linda.

— Quer que eu te ensine a usar?
Sua pergunta me surpreende e eu reajo como uma criança.

— Hummm, não sei.

— Tem medo?

— Nããããão.

— Então qual é o problema?
O sol bate direto no meu rosto e eu pisco um olho para enxergar Rafaela melhor.

— Tenho medo de cair e de estragá-la.

— Não vou te deixar cair — responde com segurança.

Isso me faz sorrir. Essa é Rafaela, uma mulher segura.

Por fim, incentivada por ela, subo na moto. Olho ao redor e vejo que meu pai ainda não apareceu. Durante alguns minutos, Rafaela me explica que as marchas estão no pé esquerdo, depois me indica como acelerar, como usar a embreagem e como frear.
Em seguida arranca com a moto.

— Uau, que barulho incrível!

— As Ducati todas têm esse som assim, menina. Forte e rouco. Agora vem, engata a primeira e...

Faço o que ela me pede e a moto morre.
Com um sorriso carinhoso, ela arranca outra vez.

— Isso é como um carro, querida. Se você soltar a embreagem depressa, o carro morre. Engate a primeira, solte devagarinho e acelere.

Me chamou de “querida” duas vezes em menos de duas horas. Uau!
Volto a engatar a primeira, solto devagarinho e, droga!, a moto morre de novo.

— Não se preocupe. — Ri, aproximando-se de mim.

Repete tudo e desta vez eu me concentro. Engato a primeira, solto devagarinho a embreagem e acelero. A moto começa a andar e ela aplaude enquanto dou gritinhos. De repente eu freio e a moto dá um tranco. Rafaela grita e vem correndo.

— Se você frear só com o freio dianteiro, pode cair.

— Ok.

Repetimos o processo vinte vezes e cada vez eu me saio pior. Freio pior e não me conformo. A cara de Rafaela é impagável.

— Vamos, desça da moto.

— Nããããão... Quero aprender!

— Outro dia continuamos com as aulas — insiste.

— Ah, por favor, Rafaela... não seja desmancha-prazeres.
Seus olhos não sorriem. Está tenso.

— Chega, Bia. Não quero que você quebre a cabeça.
Mas eu já tomei gosto pela coisa e agora quero continuar.

— Só mais uma vez, por favor. Só mais uma.

Rafaela olha para mim, muito séria, mas acaba cedendo.

— Só uma vez, e depois você desce, combinado?

— Ebaaaa! Então engato a primeira e... — Ao ver seu rosto tenso, pergunto: — Vem cá, por que você está tão preocupado?

— Bia... tenho medo que você se machuque.

— Você fica angustiada quando não sabe o que vai acontecer?

— Fico.

— Por quê?
Sem entender minhas perguntas e com a testa franzida, responde:

— Porque preciso saber que você está bem e que não vai te acontecer nada.
Arranco de novo. Engato a primeira, solto a embreagem e acelero com cuidado. A moto vai devagarinho e Rafa está ao lado.

— Rafaela!

— Que foi?

— Fique sabendo que a angústia que você acaba de sentir nem se compara com a que senti por sua causa nessas duas semanas. E, agora, olha só isso!

Engato a segunda, acelero e a moto se movimenta. Ponho a terceira... quarta e saio diretamente ao circuito. Pelo retrovisor eu a vejo boquiaberta e então sorrio. Estou empolgada por dirigir uma moto outra vez. É algo de que sempre gostei e que me proporciona liberdade. Enquanto faço as curvas do circuito de Jerez, penso em Rafaela. Em sua cara de preocupação. E volto a sorrir. Eu a imagino nos boxes, sozinha e
desconcertada. Acelero.
Saio da pista e entro nos boxes. Está sentada num degrau. Quando me vê, levanta-se.

Sua expressão é dura. Ice woman está de volta. Mas, feliz por tê-la feito sofrer por alguns minutos, chego até ela e freio bruscamente sem desligar o motor. Tiro o capacete e, no
melhor estilo As panteras, olho para ela.

— Vem cá, Rafaela, você achava mesmo que a filha de um mecânico não sabia dirigir uma moto?

Rafaela se aproxima de mim. Parece prestes a me dizer alguma coisa não muito amigável, até que me segura pelo pescoço e me beija com verdadeira paixão. Ainda em cima da moto, eu a agarro e devoro até que escuto a voz do meu pai.

— Eu já sabia que a mulher que estava correndo na pista era minha moreninha.

Rapidamente me separo de Rafa. Pisco para ela, o que a faz sorrir, e me viro na direção do meu pai.

— Pai, essa aqui é uma amiga minha. Rafaela Kalimann.

Meu pai sorri e a examina de alto a baixo. Sei que ele sabe que essa é a mulher que não sai da minha cabeça. Rafaela dá um passo à frente e apertam as mãos com força.

— Prazer em conhecê-lo, senhor Andrade.

— Me chame de Manuel, moça, ou terei que te chamar por esse sobrenome esquisito que você tem.
Ambos sorriem e sei que foram com a cara um do outro. Depois, Rafaela olha para mim e se dirige ao meu pai:

— Manuel, o senhor tem uma filha meio mentirosa. Tinha me dito que não sabia dirigir moto e, depois de me fazer ensinar a ela como usar a embreagem, saiu disparada como
uma flecha.

— Você disse isso a ela, sua sem-vergonha? — meu pai brinca.
Confirmo com a cabeça, achando graça.

— Rafaela, minha moreninha foi campeã de motocross de Jerez por vários anos e, hoje em dia, continua ganhando prêmios.

— Sério?

— Aham — eu digo, divertindo-me.
Durante um tempo, Rafaela e meu pai ficam fazendo graça e eu entro na brincadeira.

Estou diante das pessoas que mais amo na vida e isso me faz feliz. Alguns instantes depois, meu pai começa a andar e volta em nossa direção.

— Me acompanhem, crianças.
Quando vou seguir meu pai, Rafaela me agarra pela cintura e me puxa para si.

— Moreninha, você é uma caixinha de surpresas.

Pisco para ela e finjo lhe dar um soco na barriga que o faz rir.

— Cuidado com o olho, porque também fui campeã regional de caratê.

Eu a escuto assobiar, surpresa, quando meu pai diz ao entrar num boxe:

— Olha o que preparei pra você.
Bem na minha frente está a moto com a qual ganhei esses prêmios de motocross. Limpa e reluzente. Uma Ducati Vox Mx 530 de 2007.

Emocionada, ando até lá e subo
nela. O celular do meu pai começa a tocar e ele sai do boxe para atender. Arranco com a moto e seu som áspero ecoa ao nosso redor. Depois olho para Rafaela e digo enquanto ela
dá risada:

— Já te disse que adoro o barulho forte e rouco das Ducati?

The Boss / RabiaOnde histórias criam vida. Descubra agora