스물둘째

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Kookie 


O cheiro de carne queimada, misturado à fumaça densa, tornava o ar quase irrespirável. A nova cela para onde me arrastaram parecia um buraco sem ventilação, claustrofóbico, como se feito para sufocar lentamente seus ocupantes. A luz fraca que balançava no teto projetava sombras inquietantes, mal iluminando o rosto do ômega à minha frente. Ele segurava um maçarico de chama azul, e seus olhos impassíveis eram um contraste perturbador ao brilho mortal que dançava na ponta da ferramenta.

Apareceu pouco depois de eu esmagar o nariz do último torturador de Hwasa com uma cabeçada bem dada. Ao contrário dos outros que vieram antes dele, o garoto à minha frente não exibia o mesmo prazer perverso. Não havia sorrisos doentios ou olhos famintos se deliciando com meu sofrimento. Ele era frio, eficiente. Um funcionário fazendo o trabalho que lhe mandaram.

Em outra ocasião, eu poderia até admirar sua postura e lhe oferecer um emprego — afinal, quem não gosta de alguém que faz seu trabalho com precisão? Mas, amarrado nessa cadeira dura e coberto com o meu próprio sangue seco, o único pensamento que me ocorre é arrancar sua língua e vê-lo engolir cada pedaço.

— Onde está o cofre? — Sua voz era seca, vazia, quase abafada pelo zumbido constante do gás que alimentava o fogo.

Eu ri, porque rir é o que faço quando estou à beira do abismo.

— Tem um cigarro? Esta fumaça está me matando de vontade de tragar.

Ele não reagiu. Apenas inclinou levemente a cabeça, como se estivesse considerando a pergunta, antes de apertar o botão do maçarico.

O calor cresceu no ar já pesado, e gotas de suor deslizaram pelo meu rosto, limpando alguns rastros de sangue seco ao passar. Ele deu um passo à frente, inclinando-se com precisão cirúrgica, e encostou a chama na minha pele. O metal quente cantou ao encontro da carne, um som grotesco que ficou gravado na minha mente junto à dor insuportável que se seguiu. Meu corpo reagiu antes de mim, arqueando-se na tentativa inútil de escapar.

O cheiro de queimado voltou, mais forte, invadindo meu nariz e minha garganta, enquanto eu mordia a língua com toda a força que tinha. A dor era um velho conhecido, mas isso não tornava sua presença mais suportável. Ele recuou, e eu engasguei, cuspindo sangue no chão frio e sujo.

— É apenas uma questão de tempo, senhor Jeon — disse ele, com o tom casual de quem discute o clima.

A chama voltou à minha pele, e, por um momento, senti uma onda de alívio. Ele estava queimando embaixo, longe do lugar onde meus ômegas gravaram seus nomes, longe das memórias que jurei proteger. Meu alívio foi passageiro. Cravei as unhas no braço da cadeira, sentindo as algemas apertarem ainda mais, enquanto o aço cortava meus pulsos com cada espasmo de dor.

 Aos poucos, minha visão começou a embaçar, e a realidade à minha volta parecia se desfazer. Em meio a isso, a saudade invadia meus pensamentos. O cheiro floral do ômega que queimava minha pele não conseguia apagar as memórias de Chimmy e Tata. Eles cheiravam a cerejas. Não era só o cheiro — os sabores eram tão doces quanto as lembranças que me preenchiam. Enquanto a escuridão tomava minha visão, minha mente buscava refúgio. Imaginei minhas mãos passeando novamente por seus corpos, sentindo o calor e a suavidade da pele que há muito tempo me aqueciam.

🐾

Despertei abruptamente. A água gelada invadiu meus ouvidos, bloqueando um lado da audição e me arrancando do breve alívio da inconsciência. A dor voltou com força, mas logo foi acompanhada por uma sensação inesperada. Algo macio estava sendo passado em meu rosto. Demorei a perceber que o ômega agora me limpava.

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