A casa dos loucos

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Fecho o bilhete e começo a rir e imaginar a cara daquele desgraçado ao fazer com que eu passe por tanta coisa para que só depois descubra que ele é meu avô. Ele só pode ser louco mesmo para fazer tal besteira, vai ver ele até sabe falar.

Levanto minha cabeça e olho em volta, vejo todas aquelas pessoas caminhando e me pergunto se um dia conseguirei viver normalmente, sem a solidão e sem animais decapitados, (...) Talvez seja possível até, de alguma forma trazer meus pais e minha Irmã de volta.

Avivei-me, pego minha mochila e saio para a calçada.

― Parado ai!

Como reflexo dou um salto para trás e vejo rapidamente aqueles dois homens de farda, apontando suas armas para mim.

Sendo o grande palerma, como se perdesse o juízo, corro para a rua, escuto uma buzina e sigo correndo no espaço entre os carros, na primeira oportunidade volto para a calçada, as pessoas assustadas acabam abrindo caminho para mim, até que um outro policial aparece em minha frente e aponta sua arma para mim, finalmente tomo consciência do risco e não me arrisco à ultrapassá-lo, levanto meus braços, ajoelho e jogo minha mochila para frente, os outros policiais que me perseguiam me alcançam e enquanto olhava aquelas pessoas me julgando, um deles me dá um forte golpe na nuca que me arremessa ao chão de cimento, deichando-me zonzo.
― Você vai voltar para o hospício, seu retardado. ― Disse policial numa voz ofegante enquanto botava meus braços para trás e os prendia com apertadas algemas.
Uma viatura chega e estaciona na calçada, um dos policiais pega minha mochila e o outro me puxa para me levantar e eu entro empurrado no banco de trás da viatura, fico olhando para baixo enquanto as pessoas observam tudo do lado de fora e os dois policiais entram no carro, se ajeitam nos bancos da frente e seguem arrancando pela estrada.

― Sabe-se lá como você fugiu, pelo que disseram você simplesmente desapareceu. ― Disse o policial que dirigia.
― Vai ver ele foi confundido com o lixo e então jogaram ele fora. ― Disse o outro gargalhando.
― Ele não é lixo?
Então os dois soltaram suas gargalhadas até que o silencio voltasse a perpetuar, e então o homem do banco direito pega minha mochila.
― Vamos ver o lixo do lixo. ― Disse ele já abrindo o zíper e então retirando minha faca. ― Parece que o meliante é violento.
O companheiro da esquerda olha a faca, olha para mim pelo espelho e diz:
― Quantos você matou com essa sua faca? ― Disse ele com tom de seriedade.
Olho para ele e ignoro.
― Fiquei sabendo que você matou um pescador, um vendedor e me disseram até que você matou sua irmã.
Calo minha boca e esfrego minhas mãos uma na outra de tamanha raiva, vejo seu rosto de deboche pelo espelho e a grade que nos separa, porem me controlo, minha vontade é de gritar que é mentira sobre minha irmã e socar a cara desse dois imbecis, mas isso pioraria minha situação, então em vez disso, olho para a janela, calado. O outro policial guarda minha faca na mochila, pega um CD de rap e bota pra tocar em alto volume.

Continuo olhando pela janela durante todo o resto da viagem, recordando-me daquele lugar, dos mosquitos nas vidraças, dos loucos que apanhavam dos enfermeiros e dos loucos nojentos que apanhavam as lesmas grudadas nos rodas-pé e esfregavam em seus rostos, e a cima de tudo (...) daquela briga de loucos, aqueles cafajestes apostando em quem mata quem, tratando os pobres diabos de forma pior que os animais e se fantasiando de verdadeiros demônios.

Meu coração acelera enquanto me aproximo do portão do hospício, é um portão grande de ferro e com um grande arco de ferro em cima. Ao passar por ele, na frente, bem centralizada está a porta de entrada do casarão branco, uma porta de madeira muito bonita, com galhos de outono esculpidos em volta.
Viramos à direita no estacionamento, o policial abre a porta e eu vou andando, escoltado pelos dois, pouco antes de chegar a porta uma enfermeira a abre e diz:
― Fomos avisados de sua chegada, fujão.
Olho para seu rosto e não me lembro dela, é uma enfermeira jovem, loira, de olhos castanhos e com uma tatuagem cinza e verde no antebraço esquerdo.
Continuo sendo escoltado até uma sala onde tiram minha algemas, sinto um extremo alivio ao mexer meus braços, a enfermeira se vira para mim, ajeitando aquela camisa de força e me ajuda a vesti-la.
― Está seguro, podem ir agora. ― Disse a enfermeira.
Ambos saíram, ela pega uma navalha e diz:
― Vamos ajeitar essa barba?
Mantenho-me calado mas faço uma expressão de "tudo bem" em meu rosto.
― Os outros enfermeiros não dão a mínima se os loucos estão bem cuidados ou não, sequer trocam as fraudas dos que precisam. ― Disse ela enquanto fazia minha barba.
Após alguns minutos ela pega um espelho, vejo minha barba mal feita e com uns 2 pequenos cortes na bochecha, faço um sinal de positivo, caçoando de seu excelente trabalho, ela dá uma gargalhada e diz:
― Como você pode ver, eu nasci para ser barbeira, acho que amanhã mesmo largo meu emprego e monto um salão. Agora é bom você descansar, eu te acompanho até a sua suíte 5 estrelas.

A enfermeira abre a porta de madeira, entro naquele muquifo mofado, sujo, asqueroso e fedorento, pulo naquela cama de ferro arame e um fino colchão e mesmo assim, depois dos últimos dias, me sinto ótimo por estar em uma cama.

― Acredito que amanhã você possa tirar essa camisa de força, não acho que você seja louco. - Disse a enfermeira.

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