Massacre

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- Como? - pergunto sem entender nada, como ela poderia ter conhecido minha mãe e minha avó? Minha mãe nunca falou de minha avó para ninguém e minha avó tinha vergonha de que as pessoas vissem ela.

- Eramos amigas. - Respondeu ela. - Nos encontrávamos sempre aos sábados de manhã e domingos de tarde. Hepátia sofria muito nas mãos de sua avó. E por conta disso fizemos uma coisa horrível, mas era necessário, aquele feto nunca iria se desenvolver e sua mãe iria permanecer trancada o resto da vida, e se conseguisse sair, seria vista com maus olhos pelos outros.

- Você sabe de minha mãe? Ela está bem? Está viva? - Pergunto desesperado.

- Não vejo ela há muito mais tempo que você, acredite. - Respondeu.

- Quantos anos você tem? - Pergunto à Agnes, ela tinha uma aparência jovem de apenas uns dois anos mais velha do que eu, aparenta ser a mais nova e mesmo assim lidera os outros enfermeiros.

- Muitos. - Respondeu ela.

- Não parece - Digo.

- Me conservo bem. - Respondeu com ar de riso.

- O que você é?

- Eu sou tão normal quanto você, mas tenho algumas habilidades.

- Como assim?

- Assim como sua avó, eu também consigo amaldiçoar alguém.

- Você considera isso uma habilidade? O que acha que ela ganhou com isso? Vingança? Isso não é lucro algum.

- A vingança desconforta a alma, mas conforta a raiva momentaneamente. Além disso, amaldiçoar alguém pode ser usado para proteção, ou até para justiça.

Enxugo minhas lágrimas, e me encosto na cabeceira da cama.

- E como iremos acabar com isso? - Pergunto a ela.

- Uma maldição é algo que retira uma força de nós e então é salva em nós mesmos, ocupando o lugar da força retirada, ficando presa no corpo de quem a proclamou, ela consome todas as outras forças, deixando apenas as que lhe deram origem, como o ódio e rancor. Teremos que matar Cornélia, a maldição está impregnada em seu corpo.

Ficamos alguns segundos no silêncio, Agnes está nervosa e suas mãos tremem, por um momento elas envelhecem, tornam-se mãos magras e flácidas, com veias aparentes. Ela percebe que estou olhando para suas mãos e rapidamente as bota para trás de modo envergonhado.

- Minha família pode estar viva? Pergunto à ela.

- Tudo depende de como é a maldição, se foi feita para matar ou então enlouquecer, depende muito. - Respondeu - Sinto muito, não conheci o resto de sua família, mas sua mãe era mulher divina, ela não queria matar sua tia, foi culpa minha. Complementou com os seus olhos soutando poucas lágrimas.

Dou-lhe um abraço, apesar do que quer que tenha feito todos merecem um. A loira aperta ainda mais o abraço e após soltar, enxuga suas lágrimas, passa sua mão direita em minha perna engessada, a mão envelhece rapidamente, até que sobre apenas os ossos.

- Está curada, amanhã tiraremos esse gesso. - Disse ela. - Vou deixá-lo dormir, boa noite Samuel, tente dormir. - Completou.

A loira apaga a luz e sai pela porta, me ajeito na cama mas nada do sono vir, fico pensando em tudo que ocorreu, na história das duas serem amigas, no fato de Agnes aparentar-se jovem e sua mão ter envelhecido. Todos pensamentos se repetem em minha cabeça por várias e várias vezes até que se tornem cansativos, e finalmente adormeço.

(...) A jovem está deitada, enquanto a outra cita línguas estranhas ao passar o unguento em sua barriga, aos poucos as ligações da garota vão se desfazendo e refazendo, deixando para trás e matando o corpo mal formado que parasitava seu corpo, a jovem grita de dor enquanto a garota loira tenta acalmá-la para que se cale, a dor física não era a única dor, a jovem não queria fazer aquilo (...).

TRROOUN ... acordo com um estrondo na porta, rapidamente vários homens entram e eu me jogo para o canto, sou puxado pela perna e então escuto um homem dizendo:

- Este já matou muitos. É uma ótima aposta homens.

- SOCOR - Grito, mas um dos enfermeiros tapa minha boca.

Os homens me puxam pelo ombro e me carregam, vou me debatendo até a quadra, Ernest vê e então bate loucamente em sua porta, um enfermeiro magro e alto então fala "desta vez não, mudo".

Ao chegar na quadra eles me jogam no chão, o enfermeiro magro fica para o lado de fora e tranca o portão. Me sento no chão e começo a bater meu pé no cimento para quebrar o gesso, atrás de mim surge uma voz dizendo:

- Aquele louco colocou fogo em sua própria casa, ele matou sua família inteira, pessoas de bem que só desejavam o bem dele, agora ele quer te matar e você não estará seguro se não matá-lo.

Me viro para a voz e digo:

- Você vai morrer.

O homem solta uma curta risada, aponta sua mão para frente e diz:

- Pode treinar a partir de agora.

Olho para frente, lá está o louco, o mesmo que se queimou com café no dia anterior, há um curativo em sua mão direita e provavelmente todas as suas pernas e virilha devem estar doendo, o louco está sendo segurado por um homem e olha para mim com ódio. Bato minha perna loucamente, ouço um grito e então o louco é solto e corre em minha direção, ele se joga em cima de mim e então rolo para o lado, o mesmo morde minha perna e então soco sua cabeça contra o chão, o louco se afasta e então consigo quebrar ainda mais o gesso em minha perna. Começo a me levantar mas o louco se atira contra mim, caio com tudo no chão e sou socado. O ódio então passa a me tomar, não me importo mais se o louco irá morrer ou não, começo a bater meu joelho em sua virilha queimada pelo café, bato cada vez mais até que o louco para de me socar, dou-lhe um soco e o tiro de cima de mim, soco seu rosto até sair sangue.

- PARE!! - Gritou Agnes de longe.

Paro, seguro seus braços para que ele não me ataque e vejo a loira se aproximar, o homem que trancou o portão diz à ela:

- É apenas uma brincadeira doutora.

- Vou denunciar vocês. - Respondeu ela.

Os homens se levantam e se dirigem ao portão para falar com ela, restando apenas um na pequena arquibancada, o homem que havia falado comigo no início da luta, ele está travado e olhando para frente com seu queixo caído.

Todos se distraem olhando para ele, o mesmo fecha sua mão em punho e rapidamente começa a socar o próprio rosto, em alguns momentos ele grita por dor e por perdão, o homem soca o rosto várias e várias vezes, todos ficam com medo até que ele finalmente morre. Solto o louco que também estava surpreso com tudo e manco até homem morto, olho seu rosto desfigurado, me viro para os homens e grito para todos:

- Vocês vão pagar pelo que fazem, se a justiça não é feita durante a vida, é feita durante a morte!

O homem magro entrega as chaves e corre para dentro do hospício, a enfermeira abre o portão mas ao entrar puxa uma arma do seu bolso, aponta para todos e então grita:

- Somente o Samuel irá sair.

Os homens colocam suas mãos na cabeça e ficam parados. Saio pelo portão e então Agnes tranca o cadeado, passo meu braço sobre seu ombro e então seguimos para o prédio.

- Vamos embora. - disse Agnes.

- Temos que levar Ernest. - Respondo.

- Por que? - Perguntou.

- Ele é meu avô.

- Mas ele ... Está bem. - Respondeu, mas era visível que ela não queria levá-lo.

Paramos na sala de socialização, onde somente a enfermeira de mais idade se encontrava, Agnes me deixa esperando na porta e então busca Ernest, vamos para a sala dela e lá está minha mochila, pego e então saímos para o estacionamento, entramos em seu carro, Ernest atrás e eu no banco ao lado do motorista, ao sair passamos perto da quadra. Há muitos corpos caídos no chão e alguns enfermeiros desesperados escalando para sair de lá. Agnes, de dedo meio levantado para a quadra diz ofegante:

- Pelo menos sua maldição ajudou a acabar com essa maldita briga de loucos.

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