Capítulo Um

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ARIA:

Estou faminta. O ronco do meu estômago é a única coisa barulhenta neste beco escuro de Boston, Massachusetts. Por mais que eu tenha comido um pão dormido exatamente às duas da tarde e agora, faltando quinze minutos para as duas da manhã, estou com uma fome dos infernos. E eu, sinceramente, odeio o fato do meu estômago não entender a situação em que estou.

Moro num beco qualquer onde gatos miam a todo instante, fazendo a trilha sonora da minha vida e sequer tenho um cobertor decente nesse frio de congelar o cérebro.

Banho? Muito difícil, ao julgar pelos policiais que rondam o chafariz — e é só tentar me aproximar que apanho com seus bastões retráteis. A dor é absurda, mas eu não lhes dava o gostinho de me ver chorar.

Perdi as contas de quantas vezes dormi com fome, ou nem isso. Os dias dolorosos reverberavam na minha mente e eu simplesmente não conseguia. Suplicar por esmolas é algo que eu jamais tentarei fazer novamente, pois além de ser humilhante, recorda-me de como fui negada de uma maneira terrivelmente dolorosa.

Como eu vim parar aqui? A resposta é simples e até entendível, uma vez em que a minha vida no orfanato Belas Rosas não era a das melhores, se não a pior. E Eu odiava aquele lugar, que Deus me perdoe. Mas eu odiava! Pois como se não bastasse a mágoa que eu tinha de ser rejeitada, ainda tive que lidar com o sofrimento nas mãos da freira Mariene.

Como pode uma freira agir com tamanha violência? Era um absurdo! A minha situação só piorava e as ameaças faziam-me tremer as pernas.
Nunca fui uma criança meiga ou algo parecido, pelo contrário, eu era uma pestinha; aprontava todas e sempre fiquei de castigo, mas eu não conseguia mudar. Era o meu jeito, e isso incomodava demais a maioria que ali viviam e eu acabei sofrendo o pão que o diabo amassou — Aliás, ainda sofro.

Já fazem dois anos que fugi e ninguém sequer me procurou — sempre soube que era um fardo, então não fiquei surpresa. Guardo tantas mágoas que isso não é nem metade!

A minha intenção era arrumar um emprego do lado de fora dos muros e ajeitar a minha vida já que ninguém nunca, nunca mesmo, cogitou a ideia de me adotar. A única coisa boa, contudo, foi que pelo menos consegui concluir os estudos. Já pensou se eu fosse analfabeta? Com certeza seria mais difícil do que já é!

Fugi aos dezessete anos, jovem — e sozinha — pelas ruas de Boston, já fui vítima de tantas coisas cruéis que o ser humano é capaz de fazer que se eu contasse, duvido que acreditariam.

Por alguma razão que eu desconheço, toda vez em que oferecia-me para vagas de emprego, um olhar enojado caía sobre mim e um não arrogante me era lançado. Obviamente, eu não conhecia ninguém para pedir ajuda e as casas de acolhimentos eram tão lotadas que mal dava para ter uma refeição no dia.
Então, consequentemente, eu estava nas ruas e tive que me acostumar com isso — bem ou não.

Suspirando pesadamente, dobrei o papelão onde dormia e o escondi atrás das latas de lixo. Brigar por papelão — embora mais comum que seja entre os mendigos —, era algo que eu estava fugindo; guardei o cobertor fino e um relógio antiquado de pulso na mochila surrada e levantei-me, após coloca-la nas costas. Preciso agir!

Por mais que eu tenha as atitudes erradas, não posso dormir outra noite faminta! É demais para suportar, portanto andei pelas ruas de Boston e sentei-me num banco de uma praça, analisando as poucas pessoas que por ali passavam.

Estava muito frio, e as únicas coisas que cobriam o meu corpo era uma camisa larga de mangas curtas, uma calça despojada e um tênis all star que achei no lixo — estava em perfeito estado, inclusive; pelo menos para mim.

MEU AMOR SÓ TEU [em revisão]Donde viven las historias. Descúbrelo ahora