Parte 3: Vermelho 2 - A luz dentro dos seus olhos

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Livros, tablet, câmera fotográfica, caixas de som portáteis, bermudas, calças, moletom, camisas, camisetas, calção de banho, meias, roupa íntima, sapato, tênis, chinelo de praia, artigos de higiene pessoal, barbeador, canivete, protetor de ouvido, caixa eletrônico, pagamento da faxineira, reserva de hotel, aluguel de carro, carteira internacional de habilitação, comprovante de inscrição no congresso, número do celular do Jeff, passaporte, dólares, gênio da lâmpada para realizar três desejos...

Um desejo, na verdade, já seria suficiente para Marco: ganhar superpoderes para conseguir organizar tudo aquilo em apenas uma hora. Pena que não dispunha de tempo hábil nem para encontrar um gênio da lâmpada.

Viajaria à noite e tinha acabado de voltar para casa após passar uma semana no interior, revezando-se com familiares para velar a mãe operada às pressas de uma apendicite negligenciada. Felizmente, depois de uma recuperação difícil, ela passava bem e sua situação era estável. A boa notícia havia sido dada na véspera e, devido a um problema no carro, Marco só conseguira partir aquela manhã. Agora precisava correr para não perder o avião...

Ele apanhou uma mala e abriu-a sobre a cama. Quando ia começar a enchê-la, o telefone tocou e ele atendeu. Inquietou-se ao reconhecer a voz mansa da tia Carmina - a irmã mais velha de sua mãe, uma senhora com rosto de querubim que gostava de pintar o cabelo curto de loiro e as unhas de rosa. Por que estaria telefonando? Por um momento, Marco pensou no pior e temeu pela saúde da mãe. Porém, diante do tom despreocupado da tia, relaxou.

Ela tendia a falar muito, mas muito mesmo - com tranquilidade bovina, ia ruminando devagar as palavras e deglutia várias horas assim antes que o interlocutor se apercebesse. Logo que Marco atendeu, tia Carmina ruminou que ele partira a toda pressa e ela não havia se despedido dele direito. Perguntou se já tinha almoçado, falou do calor e queixou-se de seu ar-condicionado rebelde. Por fim, disse que havia se esquecido de lhe pedir uma coisa, se não fosse incômodo, claro. E ele: incômodo nenhum, tia, pode pedir.

- Então, Marco, eu lembrei que nos Estados Unidos tem uma fôrma especial para bolo. É cheia de bolinhas e a massa leva só cinco minutos para assar. Você sabe qual é?

- Não, não sei.

- Então, eu vi numa revista. É uma fôrma fechada para fazer uns bolinhos redondos do tamanho de uma ameixa. Aí a gente espeta eles num palito (ficam parecendo um pirulito, uma graça) e decora com glacê. É um encanto! - Ela suspirou, sonhadora. - Eu vi uns enfeitados com florzinhas, com bolinhas, com carinhas... Ia ficar lindo para o aniversário das crianças, sem contar que também dá para servir esses bolinhos no chá. Ah, e você sabia que pode recheá-los? É só fazer um creme de baunilha mais espesso, pode usar ainda brigadeiro, doce de leite, nozes...

Marco atalhou que nunca tinha visto aquela fôrma, mas iria procurá-la. A tia informou com toda calma que então precisaria de duas fôrmas, pois cada uma acomodava uma dúzia de bolinhos. Será que ele conseguiria trazer? Marco jurou que sim. A presteza com que respondeu deixou-a desconfiada:

- E se você não achar as fôrmas?

- Prometo que vou tentar...

Agora ouvia-se uma voz feminina mais aguda ao fundoe o bater de uma porta.

- Ah, Marco, espera um segundo... A Laurinha acabou de chegar e vou perguntar se ela sabe onde está a revista onde eu vi a fôrma. Lá tem o nome do fabricante. Ajuda, não é?

- Tia Carmina, eu estou com um pouco de pressa, será que você não pode pedir à Laurinha para me mandar depois uma mensagem com o nome... tia? Tia?

Ela não estava mais na linha. Marco ouviu-a falando com sua prima de vinte anos (uma versão mais jovem e mais magra da tia Carmina, com um fortíssimo fraco por moda). Aflito, ele abriu o armário e começou a separar roupas. Vejamos, bermudas, calças, moletom...

VERMELHO: Uma História de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora