Capítulo III - A Notícia da Bruxa

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No momento não estava nevando; mas pela aparência do bosque e do pátio do castelo, tinha nevado durante o dia. As árvores peladas e raquíticas estavam com neve em seus galhos de aparência morta. As nuvens pesadas cobriam o céu, e ocultavam completamente as estrelas e a lua. A escuridão era opressora.

Até ele estava com dificuldades de enxergar. Em noites um pouco mais iluminadas, Anton enxergava muito além do que via. Por mais que olhasse para aquela paisagem morta todos os dias, Anton ainda passava a maior parte de seu tempo ali.

Havia acordado há algumas horas, e desde então estava olhando para o lado de fora, como se estivesse em uma prisão. Mesmo sabendo que aquilo não era uma prisão de fato, Anton sentia como se fosse.

Estava cansado de se manter ali. Que responsabilidade tinha perante a raça vampírica? Nenhuma. Ao menos era isso que queria acreditar. Era isso que queria botar na cabeça. Não devia nada a ninguém, eles morreram, eles foram imprudentes, eles subestimaram os humanos, e não Anton. Ele tinha feito o contrario, e por isso conseguiu se manter vivo enquanto os outros caiam ao seu lado. Se eles não se importaram com suas próprias vidas, por que Anton teria que se privar de algo? Porque eles não eram o último, porque você não é mais perseguido quanto antes. Porque se você se for, sua raça deixa de existir para sempre.

Não gostava de admitir a sua verdade.

Então deveria ficar vivo e encarcerado pelo resto da eternidade? Não. Como seu pai tinha dito há muito tempo, a eternidade é longa demais.

Anton Brogger tinha se cansado de seu castelo. Era velho. Se sentia preso ao passado naquele lugar. Não conhecia nada do mundo novo. Como tudo devia ter mudado! Tantas coisas novas deviam ter sido inventadas, tantas cidades fundadas. E tantas novas armas criadas. Entretanto, ninguém precisaria saber que Anton era um vampiro. Virava-se muito bem em Bukesker, por qual razão seria diferente em outros lugares do mundo?

Não podia se apressar. Se queria realmente sair mundo afora mais uma vez, tinha que planejar bem. Enfim, não podia correr riscos.

Havia uma rachadura dentro de Anton. Um lado queria sair de seu castelo e assumir os riscos. Afinal de contas, não tinha sobrevivido todos esses anos? Agora mais do que nunca conseguiria se manter vivo. Ninguém mais devia caçar o vampiro.

O outro lado dele queria ficar ali, preso. Não podia botar tudo a perder só por que não aguentava mais a vida que levava. Uma vida sem esperança, sem expectativa. Contudo, preferia estar morto a ficar onde estava.

Anton parecia estar chegando a um veredicto. Ainda que nada estivesse certo em sua cabeça, já passaria a considerar a hipótese de deixar o castelo com mais frequência.

Pegou o pequeno Nom. O diminuto rabo da criatura escorreu por entre seus dedos pálidos. O vento estava forte, e parecia gritar lá fora. Virou de costas para a janela e sentou-se em uma poltrona confortável que fora de seu pai. O tecido já tinha se soltado há muito tempo, mesmo assim ela continuava sendo incrivelmente confortável. De lá ele ainda contemplava a janela. As nuvens em tom avermelhado pareciam um mau agouro. Porém não acreditava nesse tipo de coisa. Se fosse viver em função dessas pequenas tolices, simplesmente não viveria.

Passou a mão na cabeça do animalzinho, que parecia gostar de pequenos agrados. Ficou olhando nos olhinhos profundamente negros de Nom.

- O que você acha que devemos fazer? – Anton perguntou em voz baixa. Sentiu como se sua voz não fosse realmente sua. – Sim, você também vai se eu for. Então temos que entrar em um consenso, caro Nom.

Desviou o olhar de seu ratinho e observou as nuvens. Por mais que tentasse, não conseguia ficar muito tempo sem olhar para o lado de fora. Talvez fosse o costume.

O Inverno de AntonOnde histórias criam vida. Descubra agora