Capítulo Treze

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Quando acordo da minha soneca, estou sozinha na cama - nacama de Earl Grey. Ele deixou um abajur de lava verde ligado no criado-mudo, e ele parece totalmente banhado de suor sob a luz de fundo do Dormitório do


Destino. Se alguém tivesse me


dito há uma semana que eu estaria aqui, eu o teria chamado


de louco. Insano. Maluco. Mas é


real. Bem, ao menos tão real quanto vampiros brilhantes.

À distância, ouço um pandeiro


triste tocando. Saio da cama para investigar. Visto minha calcinha e encontro a camisa de botões de Earl, que tem um leve aroma de sabonete líquido de coco e limão. Visto a camisa e sigo o som da música até a sala de estar.

Enquanto dormia, o sol se pôs e o centro de Seattle iluminou-se, marcando o fim de outro dia lindo na Cidade das Esmeraldas. A visão da noite pelas janelas que vão do chão ao teto é incrível, mas não tão incrível quanto a visão de Earl Grey. Ele ainda está nu, sentado num banquinho de bar com um pandeiro na mão esquerda. Ele o balança ritmicamente, num tom que ele pode ouvir apenas na sua cabeça. De olhos fechados, ele está completamente envolvido tocando. Tem uma expressão triste, angustiada no rosto, como guitarristas brancos quando estão tocando blues. Uma única


luminária ilumina seu corpo, como se ele estivesse numa exposição de museu. Eu pagaria vinte dólares por uma exposição de Earl Grey.

Caminho em silêncio na direção


dele, atraída pelos sons tristes do pandeiro. Está segurando o instrumento com os mesmos dedos longos que estavam em mim. Minhas lembranças sorriem, mesmo que aquilo tenha acontecido apenas há poucas horas. Estou ansiosa para ter esses dedos em mim novamente.

Ele deve ter ouvido eu me aproximar, pois para de tocar e abre os olhos.

- Oi, Anna - ele diz.

- Pode continuar tocando - eu


digo. Espero que não esteja bravo por incomodá-lo.

- Tocar este pandeiro... ou


tocar no seu pandeiro?

Ai, Deus.

- Você é bom - eu digo. - Nos dois, hum, "instrumentos". Que música é essa?

- Uma coisinha do Poison. Tenho memórias vagas da minha mãe cantando para mim quando eu era criança. A música chama Toda rosa tem seus espinhos.

- Qual de nós é a rosa?

- Me pergunte isso depois - ele diz. Olha para mim de cima a baixo, sorvendo meu corpo como um bebê toma suco de maçã da mamadeira. - Negócio arriscado. Gosto disso.

- O que é arriscado?

- Esse look com camisa e roupas de baixo... Deixa pra lá - ele fala.

Parece mais triste agora do que quando estava tocando, então mudo o rumo da conversa.

- Há quanto tempo você toca


pandeiro?

- Desde o sexto ano da escola - ele diz. - O pandeiro é um dos muitos instrumentos de percussão que eu pratiquei.

Tento imaginar a criança que foi o garanhão sexy de ombros largos diante de mim, mas é impossível.

- Anna, você está com o dedo no nariz de novo - ele fala.

Eu tiro o dedo de uma vez.

- Desculpe.

- Não precisa se desculpar. Você não sabe como fico com tesão quando você faz isso - ele comenta. - Se você cutucar o nariz em público, eu não sei se vou conseguir me segurar, e te agarro onde você estiver.

Cinquenta Vergonhas De CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora