Capítulo Dezesseis

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Jin mantém-se à distância, atrás de Kathleen. Ele não deve estar pronto de verdade para outra briga, não após o que aconteceu no Eclipse. Earl, por sua vez, permanece sentado. Ele é sempre
tão tranquilo sob pressão... Mas,
claro, não foi ele quem terminou no hospital depois do último encontro.

- Está pronta para ir embora? - Kathleen diz, com a raiva ressoando em sua voz. Não fica feliz por eu estar sentada aqui com Earl. Não posso culpá-la. Preciso apaziguar a situação antes que outro testículo seja esmagado.

- Acho que preciso ir - digo a
Earl.

- Não vou tentar te impedir, Anna - ele diz.

Espera aí: Earl Grey simplesmente está me deixando ir embora? Sem uma briga? Não parece com ele, de jeito nenhum.

- Gente, vocês podem me esperar no carro? Vou já, já - digo para Jin e Kathleen.

- Cinco minutos - Jin fala. - Vamos, Kathleen.

Eles saem, e eu fico sozinha novamente com Earl.

- Então, você ia me deixar ir
embora daqui? Que te deu?

- Estou me acostumando com
isso - ele diz. Ah, não. Earl, o emo, está de volta. - Todo mundo na minha vida me deixa. Primeiro, minha mãe viciada. Então, meus pais adotivos, que me abandonaram no orfanato. Depois Suzy, minha namorada no sexto ano: os pais dela se mudaram, levando-a para uma escola distante, em Cedar Rapids. Em seguida, Ken Griffey Jr. deixou os Mariners em 2000 para jogar para os Cincinnati Reds. E agora você está me abandonando, Anna.

A tristeza é insuportável! Seus olhos cinzentos de cachorrinho
pidão são demais para mim.

- Não quero deixar você - eu falo.

- Então, não deixe.

- Mas meus amigos...

Ele balança a cabeça.

- Preciso de você, Anna. Mas não vou fazer você escolher entre mim e seus amigos. Não seria
justo.

- Obrigada. É muito generoso de sua parte.

- Posso ser gentil - ele diz -, quando quero.

O sorriso dele está de volta! Ai, como senti sua falta. Ele se levanta da mesa e me abraça. Lambe minha bochecha da linha do maxilar até minha têmpora, para cima e para baixo. Nos
beijamos apaixonadamente, cada um de nós ávido pela carne adocicada da língua. Interrompemos o beijo antes de engolirmos um a língua do outro. Eu, por exemplo já me engasguei demissão nesses últimos dias.

- Te ligo esta semana ainda - eu digo.

- Te pego esta semana ainda - ele responde.

A carona de volta a Portland dura uma eternidade. Seguimos em silêncio por muito tempo, antes de eu finalmente quebrar o gelo.

- Gente, desculpa.

Estou no banco traseiro, e Kathleen está no volante. Jin está no banco do passageiro. Ele olha
para mim pelo espelho retrovisor, e eu vejo o ódio em seus olhos verdes. Também vejo preocupação.

- Só estou feliz por você estar
bem - ele fala.

- Claro que estou bem - eu
digo. - Como estão seus... hum...

- Meus cojones? Minhas bolas?
Meus ovos? - ele responde. - Nada bem. Um teve de ser amputado.

Ai, não!

- O que você vai fazer?

- Que posso fazer, Anna? Não
estou feliz com isso, mas o que está feito, está feito. Eu estava bêbado, deixei minha raiva levar a melhor para cima de mim. Me desviei do código dos poneimaníacos de amizade e gentileza.

- Você fez o que achou que era
certo - eu digo. - Estava apenas cuidando de mim.

- Deixa eu te contar uma
história - Jin comenta. - Na segunda parte do capítulo de estreia da série do My Little Pony: a amizade é mágica, os pôneis enfrentam uma mantícora que está bloqueando o caminho. Embora os outros pôneis quisessem lutar com a fera, Fluttershy se aproxima calmamente dela e encontra um
espinho na sua pata. Ela mostra à mantícora a gentileza, em vez do ódio. Depois de ela remover o espinho, a mantícora deixa os pôneis passarem. Se eu tivesse
sido mais como Fluttershy e abordado seu namorado com
gentileza, em vez de ameaças,
talvez eu tivesse meus dois testículos hoje - ele diz.

Não sei que diabos é uma "mantícora", mas entendi a lição da sua história: Jin ficou maluco com um espinho na pata. Ou algo assim.

Ele desvia o olhar do espelho retrovisor e encara a janela.

- Envergonhei os poneimaníacos naquele dia. Não consegui mostrar meu focinho no PonyExpression.net deste então - ele comenta, com sua voz cheia de nostalgia e arrependimento.

Em seguida, uma pausa incômoda na conversa.

- Então, hum, o que está
acontecendo entre você e esse tal Earl Grey? - Kathleenpergunta.

Jin fica visivelmente tenso com o
nome de Earl.

- Não sei - eu digo. - Ele diz que "não é de namoradas".

- Então, vocês não estão
saindo? Ele está simplesmente brincando, te arrancando do


Noroeste do Pacífico de helicóptero e comprando tudo que pode no caminho? - Kathleen pergunta.

- Tipo isso - eu respondo. Não sei o quanto quero falar sobre o Dormitório do Destino. Estou morrendo de vontade de contar a Kathleen, mas não com Jin no


carro.

- Ele parece um verdadeiro


vencedor - Jin comenta.

- Só quero que vocês deem a


ele uma chance - eu falo.

- Se ele te machucar... - A


voz de Jin desaparece.

- Se machucar é um dos riscos


de qualquer relacionamento - eu falo. Exceto neste relacionamento, no qual eu posso ser amarrada num Segway e empurrada numa avenida movimentada num dia, tudo em nome do rpg erótico ao vivo. O pensamento de Earl Grey me amarrando faz meu útero inchar de desejo.

- Eu vetei a história sobre ele


na Delícias no Comando - Kathleen fala. - Não quero fazer publicidade gratuita desse cara. Seja lá o que acontecer, saiba que estamos do seu lado, tá?

Fico surpresa, pois ela está


dirigindo: é literalmente o máximo de tempo que já a vi sem tomar um drinque ou vomitar.

- Obrigada - eu digo. - É ótimo ver você sóbria pra variar.

Ela ri.

- Cara, eu tô bem louca - ela diz.

- É - Jin completa. - Estávamos fazendo "cu-de-bêbado".

- Será que devo perguntar o


que é isso?

- Claro que sim - Kathleen diz. - Primeiro, encharque um absorvente interno na vodca. E


então...

- Obrigada - eu falo. - Já entendi.

- Arde, mas dizem que o álcool


entra mais rápido na sua corrente sanguínea - explica Kathleen.

Não parece ser agradável ou seguro. E ela não deveria estar


dirigindo.

- Vai pro acostamento. Eu vou


assumir o volante - eu digo. Nunca dirigi antes, mas ao menos não estou bêbada.

Kathleen concorda com a


cabeça, então lança o carro direto para fora da pista... e na direção de um barranco! Enquanto o carro voa sobre o penhasco para o Oceano Pacífico, gritamos nossas últimas palavras em uníssono:

"Aaaarrrrrghhhh!"

Cinquenta Vergonhas De CinzaOnde histórias criam vida. Descubra agora