Capítulo 15 - Invasão

100 15 2
                                    

O cenário não poderia ser mais desolador. Um pequeno comércio se formava logo após a entrada do castelo, com soldados fiscalizando cada transação. Quando alguém tentava esconder uma mercadoria ou mesmo parar de trabalhar, era punido severamente com várias chicotadas no corpo. Tivemos a angústia de presenciar a cena umas 3 vezes, enquanto a carruagem passava no meio da estrada movimentada. Havia outras carruagens como a nossa, com homens mal encarados despejando os prisioneiros. Eu escutei os soluços de Samyra da jaula e a voz baixa de Natália, consoladora.

– Cara, isso daqui precisa mudar – Jorge comentou. – Eu não estou suportando ver essa parada assim. Parece que voltamos ao tempo da ignorância.

– Nós vamos derrubar essa bruxa – falei.

A carruagem parou na frente de um portão de madeira. Tinha sido ali que a última carruagem de prisioneiros desembarcou os coitados. Jorge se levantou e abriu a porta da gaiola, dando espaço para um bando de prisioneiros ilusórios se arrastarem pelo chão. Era engraçado ver Jorge falando sozinho, mesmo eu sabendo que ele conversava com alguma ilusão. Pensando bem, será que Samyra consegue fazer sua ilusão falar?

Essa questão não era muito importante no momento. Um guarda fiscalizava os aprisionados e apontava a lança de tempos em tempos, como se um dos prisioneiros tentasse avançar. Por último, vi Natália carregando uma Samyra fraca e débil da jaula. A verdadeira rainha estava com os olhos vermelhos de tanto chorar, mas sua debilidade física era por causa de outra coisa. Eu a segurei antes que caísse no chão.

– O que está acontecendo? – sussurrei.

– Ela está ficando fraca. Criar toda essa ilusão é muito desgastante – a curandeira me disse. – Agora se afaste. Você é um soldado real e não deve ajudar um prisioneiro.

Lógico, eu não poderia estragar o disfarce da gente. Dei dois passos para trás e ainda gritei um: "Anda logo!" em alto e bom tom. Jorge olhou feio para mim e eu dei de ombros. Nós não precisávamos parecer rudes? Samyra conseguiu chegar até a porta de madeira, sendo praticamente arrastada por Natália. Eu fiquei aliviado e andei até lá, quase marchando como os demais soldados da corte, quando o guarda olhou torto para mim.

– Para aonde pensa que vai? – Ele me encarou.

– E-Eu...

– Nós precisamos colocar os prisioneiros nas devidas jaulas – Jorge me salvou.

O guarda nos encarou por um momento. Ele parou a vista demoradamente na armadura amassada de Jorge e depois viu a minha vestimenta medieval torta, onde o capacete parecia sambar em cima da minha cabeça a cada passo que eu dava. Fechei as mãos antes que a luva caísse. Ele falou sério.

– Vocês não podem entrar e deixar a carruagem aqui fora. Além disso, existe um carcereiro lá dentro. O seu trabalho é apenas entregar a mercadoria. Podem ir embora.

Eu engoli em seco. Aquela era a pior notícia que nós poderíamos receber. Como vamos nos separar de Natália e Samyra? Principalmente com a rainha tão debilitada? Eu encarei Jorge e o vi indo para a carruagem, como se estivesse ajeitando os cavalos para partir novamente. Uma nova carruagem chegava, dessa vez ela estava realmente lotada. O barulho de chicote do outro cocheiro preencheu meus tímpanos. O tempo para reagir se esgotava.

Reparei, entretanto, que Jorge estava demorando muito para arrumar aqueles cavalos. Ele não levara esse tempo todo fora do castelo. Na verdade, ele nunca fez isso em momento algum. Jorge tentava ganhar tempo! Rapidamente, corri até o lado dele e comecei a alisar o cavalo, como se fosse um cachorro.

– Qual será o nosso plano? – Eu quis saber.

– Ficar alisando o cavalo é que não é! – Ele forçou o riso. – Olha, a gente vai ter que passar por eles na marra. O meu tacape está aqui perto, em dois segundos eu pego e mando esse guarda para longe. A parada vai ser conseguir entrar no castelo sem Natália. Vamos torcer para que ela perceba nosso atraso e volte para nos ajuda... Já estou vendo alguns soldados nos encarando.

– E se ela não vier?

– O bicho vai pegar.

O cara da carruagem atrás da gente começou a nos xingar de coisas que eu achava não existir neste mundo. De onde vieram os palavrões? Sempre pensei que fossem palavras modernas. Eu senti um movimento estranho dos soldados perto do comércio local. Eles começaram a nos cerca. Não tínhamos mais tempo, era tudo ou nada.

Jorge pegou o seu tacape da carruagem e bateu com força no peito do guarda. Este voou como uma galinha de Angry Birds e quebrou uma barraca de madeira (ponto extra!). Eu puxei minha espada da bainha (uma das vantagens de usar a armadura) e cortei as cordas do cavalo, que sentiram a liberdade pela primeira vez na vida. Os soldados avançaram na nossa direção rapidamente. Eu defendi um golpe com a minha espada e dei um chute no sujeito, batendo com o punhal na cabeça dele em seguida. O capacete da minha armadura caiu perto de Jorge e achei isso ótimo. Com um chute, Jorge fez do capacete uma bola de futebol de 10 quilos que derrubou uns dois soldados. Corremos para a porta por onde nossas aliadas entraram, sem não antes observar a imensidão de soldados que iam furiosos na nossa direção. Passamos pela porta de madeira e Jorge a fechou rapidamente.

– Será que isso vai segurá-los? – Até mesmo eu sabia que a resposta era negativa.

Uma flecha penetrou a porta de madeira, quase atingindo o meu rosto. Um golpe de espada, depois um machado, e pronto, a porta não existia mais. Vimos então o grupo de soldados batendo sem parar em uma barreira bem mais resistente do que aquela porta. Era um campo de força mágico.

– Demorei? – Natália perguntou, meio irônica. – Eu tive que resolver alguns probleminhas aqui.

Vimos dois carcereiros caídos no chão. Eles tinham marcas de flechas nos braços e dormia como bebês. Ela avisou que seguraria os soldados lá fora por mais um tempo, mas precisávamos ser rápidos e encontrar uma saída daquele lugar.

Eu desci correndo uma enorme escadaria que dava para um calabouço de prisioneiros. Vi que Samyra tentava abrir uma fechadura com a chave, contudo as mãos dela tremiam. Jorge bateu com o tacape uma única vez e a fechadura foi-se ao chão. Encontramos um garoto encolhido no canto da jaula, nitidamente assustado. Ele era magro e usava roupas velhas, em farrapos; e tinha os cabelos totalmente brancos.

– Zeca? – Jorge perguntou dando um passo para dentro da jaula. O estranho levou algum tempo para responder. – Zeca, é você mesmo! Nós viemos te salvar!

– Jorge! Jorge, cadê você? – ele balbuciou. Jorge correu até o garoto e deu um abraço nele. De repente, a expressão do bárbaro ficou séria. – Cadê a minha irmã? Ela também está aqui? E Natália?

– Pâmela não pôde vir para a missão. O diretor achou melhor não a envolver, ela ficou muito preocupada depois que você saiu. E Natália está segurando os caras malvados por um tempo. – Ele ajudou Zeca a se levantar e só então percebi os olhos do coitado, totalmente perdidos. – Zeca, você não está conseguindo me ver não, é? Eles te cegaram.

Zeca apenas assentiu. Eu abracei Samyra quando ela recomeçou a chorar e escutei o grito de um bárbaro enfurecido.


Escola de GuardiõesDonde viven las historias. Descúbrelo ahora