Capítulo 08

28 3 0
                                    

Conversamos durante mais algum tempo, enquanto eu terminava de comer. Simon declarou ter andado por aqui e ali, até que decidiu estabelecer-se em Massachusetts, por meio do clube – que na época em que foi inaugurado, não era aberto ao público humano, obviamente, e não passava de apenas um pequeno espaço dedicado a reunir os poucos vampiros que circulavam pela cidade. Eu escutava tudo atentamente, e cada vez me via mais envolvida com tudo. Assim que terminei minha refeição, Simon pagou a conta e pediu que trouxessem seu carro. No caminho de volta, eu já me sentia bem mais confortável e segura estando com ele. Quando chegamos à minha casa, era em torno de onze horas e a vizinhança estava totalmente quieta. Simon me levou até a porta e, apesar de saber que no outro dia teria que acordar bem cedo para trabalhar, eu sinceramente lamentei por nosso encontro já estar terminando.

- Foi um prazer sair com você, Ana – ele disse, parado a minha frente com as mãos dentro dos bolsos da calça.

- O prazer foi meu, Simon. Eu realmente adorei. Foi uma noite muito surpreendente – declarei com sinceridade.

O semblante de Simon de repente transformou-se, e sua expressão passou de relaxada à séria.

- Eu estou indo viajar essa noite – Simon informou com a voz calma.

- O que?! Por quê? Para onde? – exclamei, e para a minha surpresa soei alarmada demais frente à informação.

- Eu vou para Inglaterra, para a sede do conselho. Dentro de alguns dias vai acontecer um evento em Boston para receber os vampiros que fazem parte do conselho, e também outros de várias partes do mundo. Será como um baile, para que os membros do conselho discursem sobre algumas questões da comunidade vampírica. A partir de amanhã à noite, acontecerão uma série de reuniões sobre a organização desse evento e é provável que elas sigam por toda a semana. O Gabriel e eu somos representantes do conselho em Boston, e como ele detesta essas reuniões, eu vou precisar comparecer, enquanto ele fica aqui resolvendo as coisas no clube – explicou.

- Entendo. Então você tem que ir mesmo, né? – perguntei, sentindo-me frustrada.

- Eu não quero, mas preciso ir. Sexta à noite estarei de volta. Você tem o número do meu telefone e, por favor, me ligue, se precisar.

Desviei meu olhar de Simon e busquei dentro da bolsa pelo meu celular e o cartão que ele me entregara outro dia. Quando o encontrei, digitei seu número no meu celular, coloquei o aparelho no ouvido e o vi me observar intrigado. Deixei o telefone chamar uma vez e depois desliguei.

- Pronto. Agora você também tem o meu número e pode me ligar quando quiser.

Simon não disse nada e apenas olhou-me atentamente. De repente, deu alguns passos a frente, diminuindo a distância entre nós. Suas mãos alcançaram meu rosto e o envolveram ternamente entre as palmas grandes, fazendo-me estremecer ao sentir seu toque. Minha respiração saía completamente irregular e foi aí que me dei conta de que eu queria isto. Eu queria beijá-lo.

- Você tem medo de mim, Ana? – Simon perguntou, tendo o rosto detido a apenas alguns centímetros do meu.

- Não mais – respondi.

E então... aconteceu. Lentamente, Simon inclinou o rosto e o trouxe para perto do meu. Fechei os olhos, e quando senti seus lábios frios pousarem sobre os meus, achei que fosse desfalecer ali mesmo. Inicialmente, seu beijo foi calmo e gentil, caracterizado apenas pela pressão de seus lábios contra os meus. Logo ele ofegou, e afastou-se. Quando abri os olhos, o encontrei com a testa franzida, a expressão profundamente séria e pelo que me pareceu um longo momento, ele analisou as linhas do meu rosto, talvez esperando que eu esboçasse algum sinal de recusa. Como não recebeu nenhum, seus lábios entreabertos e descendo novamente em direção aos meus foi a última visão que tive, antes de fechar os olhos novamente e receber sua língua, que ele deslizou apaixonadamente para dentro da minha boca. Em um gesto fervoroso, Simon segurou minha nuca com uma mão e com a outra envolveu minha cintura, pressionando-a, e trazendo-me para junto de seu corpo, enquanto eu mantinha timidamente minhas mãos em volta de seus bíceps. Dessa vez, o beijo ficou mais intenso e ardente, mas também doce. Seu corpo era como uma muralha aprisionando-me, frio e acolhedor ao mesmo tempo, da qual eu não conseguiria escapar nem se quisesse. O que, sinceramente, neste momento eu não pretendia fazer. Eu queria ficar ali, com ele, recebendo e correspondendo ao seu beijo, e deixando-me levar por sua paixão. E pela minha também, agora eu sabia, o que me fez mergulhar as duas mãos em seus cabelos e segurá-lo mais firme. Um gesto que arrancou-lhe um grunhido, em um claro sinal de excitação. Ficamos assim, perdidos neste contato íntimo, que mesmo estando acontecendo pela primeira vez, seguiu de forma quase familiar. Perdi a noção do tempo e a consciência até que, de repente, o toque de seu celular ecoou na noite. Assustei-me com o barulho e diminuí o ritmo do beijo, esperando pelo momento em que Simon se afastaria. Mas ele não o fez, e continuou a me beijar.

- Simon... – finalmente consegui dizer, ofegante – ...seu celular.

- Eu sei – ele sussurrou, entre meus lábios.

- Pode ser importante...

Visivelmente relutante, o homem interrompeu o beijo.

- Nada é mais importante do que você, meu amor – Simon declarou com uma veracidade tocante. Ele pareceu respirar fundo e então levou uma mão até o bolso interno do terno, retirando o celular, e mantendo a outra ainda em volta da minha cintura. Ao olhar para o visor, decidiu atender a ligação. – É melhor ser relevante, Gabriel – disse bruscamente, em um tom frio, mantendo seu olhar fixo em mim, enquanto ouvia algo ser dito do outro lado da linha. – Ok, entendi – disse seriamente, depois de um tempo. – Eu chego aí em um minuto. Até – despediu-se, com um uma expressão dura tomando-lhe o rosto. Pelo visto, o telefonema fora percussor de más notícias.

- Algum problema? - perguntei, enquanto o observava devolver o aparelho celular ao bolso do terno.

- Nada de mais... – ele respondeu sorrindo, mas sem entusiasmo – ...apenas um imprevisto. Terá que desculpar-me, Ana, mas preciso ir até o clube em auxílio do Gabriel.

Então essa era a deixa que culminaria no final do nosso encontro. Fora um bom encontro. Um ótimo, na verdade. Difícil de esquecer e difícil de saber se voltaria a acontecer.

- Ok, tudo bem – disse por fim, tentando me afastar, mas Simon me manteve junto dele.

- Eu vou sentir sua falta, Ana – ele declarou, acariciando meu rosto com o polegar, surpreendendo-me pela sinceridade contida em suas palavras.

- E eu a sua, Simon – confessei.

Ele inclinou-se e me beijou mais uma vez, breve e carinhosamente, liberando-me logo em seguida.

- Boa noite.

- Boa noite – despedi-me.

Sem mais delongas, Simon virou-se, desceu as escadas e seguiu em direção a Tucson. Observei-o até perdê-lo de vista, quando curvou com o carro no final da rua, e então entrei em casa. Assim que fechei a porta atrás de mim, um vazio se formou em meu peito. Sentindo que ia explodir, se não compartilhasse com alguém o que estava sentindo, peguei o telefone, afundei-me no sofá, e com os dedos trêmulos disquei o número daquela que aparentemente previra isto.

- Alô? – Emily atendeu ao segundo toque.

- Oi, Emily, sou eu – falei, com a voz embargada.

- Ana! Ei! E aí? Como foi a sua noite?

Vi-me emocionada, e sorri, tendo os olhos marejados, quando uma verdade que de repente me pareceu muito óbvia se abateu sobre mim.

- Você tinha razão. Eu gosto dele – admiti.

Após minutos de conversa, em que Emily foi mais do que uma boa amiga ao me ouvir e aconselhar, me recolhi até meu quarto. Antes de adormecer, minha cabeça dava voltas, pensando em tudo o que aconteceu. O jantar, a história de Simon - que ainda fazia meu coração doer - nosso beijo e como fiquei, quando ele foi embora. Busquei na memória e ao relembrar os fatos, me pareceu que Simon dera sinais de interesse, desde a primeira vez em que nos vimos. Só isso explicaria a forma como nos encontrávamos agora. Claro que eu poderia estar equivocada, vendo coisas que não existiam. Porém, se este fosse o caso, de uma coisa eu tinha certeza. Dei-me conta de que não havia mais como negar que eu sentia algo por ele.

Eu estava me apaixonando por Simon.



Ao AnoitecerOnde histórias criam vida. Descubra agora