olá como estamos?, até que enfim um pouco mais de ação nesse cap :)
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Lembro-me das televisões e das lareiras e das pias de porcelana. Lembro-me dos ingressos do cinema e dos parques de estacionamento e das vans. Lembro-me dos salões de cabeleireiro e das persianas de janela e dos dentes-de-leão e do cheiro das garagens recém-pavimentadas. Lembro-me dos comerciais de creme dental e das mulheres de sapato alto e dos velhos em trajes de negócio. Lembro-me dos carteiros e das bibliotecas e das boybands e dos balões e das árvores de Natal.
Lembro-me de ter dez anos de idade quando não podíamos mais ignorar a
carência de alimentos e as coisas ficaram tão caras que ninguém mais tinha recursos para viver.
Camila não está falando comigo.
Talvez seja o melhor. Talvez não houvesse esperança de que ela e eu
pudéssemos ser amigas. Talvez seja melhor que ela pense que eu não
gosto dela a pensar que gosto demais. Ela está escondendo um monte de
coisas que parecem lhe causar dor, mas seus segredos me assustam. Ela
não me diz por que está aqui. Embora eu também não lhe diga muita coisa.
E contudo e contudo e contudo.
Na noite passada, a lembrança de seus braços em volta de mim foi o
bastante para espantar os gritos, O calor de um abraço amigo, a força das mãos firmes unindo todos os meus estilhaços, o alívio e libertação de tantos anos de solidão. Este presente que ela me deu eu não posso retribuir.
Tocar em mim é quase impossível.
Nunca esquecerei o horror nos olhos de minha mãe, a tortura no
rosto de meu pai, o medo entalhado em suas expressões. A filha deles é
um monstro. Possuída pelo demônio. Amaldiçoada pela escuridão.
Profana. Uma abominação. Drogas, testes, soluções médicas fracassadas.
Interrogatórios psicológicos fracassados.
―Ela é uma arma ambulante na sociedade, foi o que os professores
disseram. ―Nunca vimos algo assim, foi o que os médicos disseram. ―Ela
deve ser retirada de casa, foi o que os policiais disseram.
Sem problema nenhum, foi o que meus pais disseram. Eu tinha 14
anos quando meus pais finalmente se livraram de mim. Quando eles recuaram e me observaram sendo arrastada por conta de um assassinato que eu não sabia que poderia cometer.
Talvez o mundo esteja mais seguro se eu estiver presa em uma cela.
Talvez Camila esteja mais segura se ela me detestar. Ela está sentada no
canto com os punhos no rosto.
Jamais quis machucá-la.
Jamais quis machucar a única pessoa que jamais quis me machucar.
Arrombam a porta e cinco pessoas tomam o quarto, rifles apontados para nosso peito.
Camila está de pé e eu fico feito pedra. Esqueço-me de inspirar. Há muito tempo que não vejo tantas pessoas assim que fico estupefata. Eu
devia estar gritando.
―Mãos para cima, pés afastados, boca fechada. Não se mexam e não atiraremos em vocês. Ainda estou congelada no lugar. Deveria me
mover, deveria levantar os braços, deveria separar meus pés, deveria
lembrar-me de respirar. Alguém está cortando-me o pescoço.
Um deles, gritando ordens, bate com a coronha de sua arma nas
minhas costas e meus joelhos estalam ao bater no chão. Finalmente provo
o oxigênio e uma zona de sangue. Acho que Camila está gritando, mas há uma aguda agonia rasgando-me o corpo, diferente de qualquer coisa que experimentara antes. Estou completamente imobilizada.
- Que parte você não entendeu do manter sua boca fechada? -
Entorto os olhos para os lados para ver o cano da arma a poucos
centímetros do rosto de Camila.
- Levante-se. - Uma bota com biqueira de aço me dá um pontapé
nas costelas, rápido, duro, profundo. Não estou engolindo nada, exceto
os suspiros estrangulados que sufocam meu corpo.
- Eu disse levante-se. - Mais dura, mais rápida, mais forte, outra
bota em minhas vísceras. Sequer consigo gritar.
Levante-se, Lauren. Levante-se. Se não levantar, eles vão atirar em
Camila.
Levanto-me de joelhos e caio novamente sobre a parede atrás de
mim, cambaleando para a frente para pegar equilíbrio. Levantar as mãos é
mais torturante do que eu poderia suportar. Meus Órgãos estão mortos,
meus ossos estão quebrados, minha pele é uma peneira, perfurada por
pregos e agulhas de dor. Eles finalmente vieram me matar.
É por isso que botaram Camila na minha cela.
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Estilhaça-me (camren)
FanfictionLauren não toca alguém a exatamente 264 dias. A última vez que ela o fez, que foi por acidente, foi presa por assassinato. Ninguém sabe por que o toque de Lauren é fatal. Enquanto ela não fere ninguém, ninguém realmente se importa. O mundo está ocup...