Capítulo 18.

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Acordei super atrasada e morrendo de preguiça de levantar da cama tão macia e quentinha, mas a vontade de conhecer a cidade de Morretes era a motivação necessária para despertar da moleza que meu corpo estava, talvez pelas poucas horas de sono ou a noite de muito vinho e espumante, mas a verdade é que esse passeio de trem pela Serra do Mar era um desejo antigo e então, encarei um banho frio pra animar a alma e em meia hora já estava pronta para minha aventura. Interfonei para a recepção do hotel e pedi um táxi com urgência e enquanto pegava um achocolatado do frigobar, enviei mensagem pra mamãe avisando que já estava de saída para meu desejado passeio.

Impossível pegar o elevador e não lembrar do acontecido da madrugada. Aquele homem me olhou de um jeito tão intenso... Pelamordedeos... Até salivei! Mesmo depois de tanto tempo eu simplesmente não conseguia me interessar afetivamente por homem nenhum. A psicóloga explicou que talvez eu estive inconscientemente "boicotando" meu coração, devido o trauma do divórcio, talvez seja isso mesmo, mas a verdade é que a vida além de corrida, estava realmente boa. Eu fazia o que queria, na hora que dava vontade e sem prestar satisfação pra ninguém. Estava realizando desejos antigos, desenvolvendo projetos que tomavam tempo e atenção e um envolvimento agora iria atrapalhar muita coisa. Mas meu corpo lembrava que apesar do tal " boicote amoroso" sugerido pela terapeuta, dentro dele morava a Gabi fogosa, saudável, sempre disposta para o sexo e que já estava há mais de um ano sem "namorar". Essa realidade me absolvia de olhar com uma pontinha de malícia pra uns bonitões da academia, pro gostoso do Rodrigo e até pro desconhecido da madrugada, sem fazer de mim uma vadia. Eu até era discreta no flerte. Duvido que tenham percebido meus pensamentos pecaminosos... Bem, nem tão pecaminosos assim.

Meio distraída pelo movimento dos carros nas ruas, cheguei na estação ferroviária, onde apanharia o trem. Optei pela classe turística, pois dizem que as janelas são mais amplas e de fato, eram. Acomodei-me e preparei a máquina fotográfica. Uma paisagem linda, de muito verde, pontes antigas e alguns túneis e belas cachoeiras brindavam minha doce pequena aventura. Para minha alegria, o vagão estava com poucas pessoas, o que facilitava minha movimentação dentro dele para olhar por vários ângulos toda aquela beleza de mata preservada. Estava encantada, fotografando tudo e sorrindo de alegria por me permitir viajar sozinha, superar medos e finalmente cuidar inteiramente de mim. Pela primeira vez em muitos anos eu era a minha melhor prioridade e isso estava me fazendo um bem enorme. Eu adquiri um novo olhar para tudo o que era novo, desejável e diferente. Agucei sentidos: sabores, aromas, toques, sons... Tudo ganhou mais intensidade um minha vida. Eu passei a curtir o momento de cada coisa que acontecia: uma ida ao cinema por exemplo, tem gente que vai meio com o automático ligado, eu fiz isso por muito tempo inclusive, mesmo com André ao lado,achava chato esperar na fila, me incomodava com o barulho das pessoas, lamentava o valor do ingresso quando o filme não agradava... Hoje, começo por curtir a escolha dos filmes, presto atenção nas pessoas que estão na fila, o que fazem, com quem estão, afinal, dividiremos uma sala com uma tela gigante por duas ou três horas e juntos vamos rir ou nos emocionar e atualmente acho isso o máximo. Saboreio a pipoca pelo cheiro, ainda na fila do ingresso, não tenho pressa , vou devagar, olho ao redor o local que ficarei, me aconchego em meu assento e se o filme não for bom, não lamento o dinheiro, afinal, o cheiro da pipoca, o escurinho tranquilo do meu cantinho por duas horas e quem sabe até o cochilo pelo tédio do filme, valeram o tempo vivido e não perdido, como considerava antes.

Eu realmente estava mais centrada no caminho e não apenas, no resultado das coisas. Tudo era maior e melhor que antes. Acho que mudar o foco e pensar que meus sentimentos são mais importantes que qualquer outra coisa, colaborou para viver tudo o que eu pudesse da maneira mais incrível, com olhar alegre e intenso. Disponibilidade para viver até as coisas mais simples e triviais, era uma nova rotina em minha vida e eu abusava e me lambuzava com tudo isso.

A viagem duraria aproximadamente 3 horas e eu estava amando cada minuto daquela visão de natureza quase selvagem e uma biosfera riquíssima.Depois de quase 40 minutos do início do passeio, de visitar alguns janelões e tirar dezenas de fotografias, eu me aconcheguei no banco e fiquei apreciando a vista e sentindo toda a paz daquela serra. Máquina na mão, cabeça encostada suavemente no vidro e olhos atentos ao lado de fora, faziam com que eu ignorasse o movimento no lado de dentro do vagão. Fechei os olhos e me concentrei nos sons. Para muitos, apenas barulho, mas eu queria guardar um pouco daqueles sons na minha memória e tentava me concentrar nisso. Era boa a sensação do movimento do trem, sentido de olhos fechados e de tudo o que eu ouvia. Até o cheiro eu queria guardar. E foi assim, de olhos fechados, que senti alguém sentar ao meu lado. Um cheiro bom de perfume amadeirado abraçou meu olfato e neutralizou tudo ao redor. Agora, meus pensamentos que antes estavam focados em memorizar os cheiros e sons do ambiente, voltavam para o calor de um corpo cheiroso que resolveu sentar ao meu lado, mesmo com bancos vazios num vagão com pouca gente. Permaneci quieta por um tempinho, até que uns 15 minutos depois uma voz masculina, um tanto grossa, um pouco rouca e quase macia, falou baixinho junto ao meu ouvido, demonstrando ao mesmo tempo curiosidade e uma ponta de preocupação.

- O passeio já te cansou ou você não está se sentindo bem?

Essa voz não é estranha... Abri meus olhos e virei a cabeça pro lado oposto da janela, onde meu, agora, companheiro de banco estava e vi um par de olhos negros olhando- me com ternura e um sorriso largo se formando à medida que eu também iniciava um sorriso lembrando da onde eu conhecia o dono daquela voz.

Renato... O moço do aeroporto.

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