Um começo clichê

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  Bom, essa história começa com um dos maiores clichês do mundo.

Casal de classe média completamente diferentes que se apaixonam loucamente.

Ela com seus 20 anos, ele 22, ela trabalhando num supermercado chinfrim para pagar a faculdade, ajudar nas despesas da casa mesmo ainda morando com os pais pois queria sua independência, ralando nos estudos.

 Ele, nem aí pra nada, desempregado sem a menor vontade de voltar a estudar ou arrumar responsabilidades, bebendo todos os dias perdendo noites nas festas.

Acredito eu, que ela encontrou nele o que faltava nela e vice versa. Ela super centrada, madura, sempre preocupada. Ele descolado, nem aí, cem por cento relaxado.

 Apesar das diferenças e dos conflitos de uma relação entre pessoas tão diferentes e a desaprovação da família da minha mãe, por saber que aquele nunca seria um homem bom o suficiente pra ela, eles ficaram juntos por um ano. 

Minha mãe então com 21 anos no final de sua faculdade, descobriu-se grávida. Por algum motivo que eu não posso nem imaginar, a minha mãe acreditou que meu pai, quase com 23 que apesar de ter conseguido seu primeiro emprego em um loja de surf de amigos da família (aonde não durou muito), continuava a vagabundear, e não ter responsabilidades, iria gostar da notícia. Ela marcou um jantar e arrumou-se toda para ele.

Minha mãe é uma mulher linda, até hoje com 39, continua arrancando suspiros, naquela época então... 

Quando ele chegou enfim, eles jantaram, dançaram a noite toda no salão do restaurante e por fim ela deu-lhe a notícia. Estava esperando um bebê. Não sei exatamente o que ela esperava, mas com certeza não era que ele a encarasse friamente e perguntasse

-Grávida de quem Juliana? - Ela sem acreditar lhe perguntou 

- Como de quem? O que você acha? - ao que ele respondeu:

- Eu vou saber? Sabe-se lá o que você faz quando diz que vai trabalhar ou estudar, some o tempo inteiro, quem me garante que esse filho não é de outro? Você pensa que desse jeito vai me prender? Que vai me forçar a arrumar um trabalho de almofadinha e casar com você? Está muito enganada, ou você tira essa criança, ou a gente termina agora. - Ela com os olhos cheios d'água lhe respondeu:

- Pois então nós terminamos agora. - e foi se levantando da mesa, mas ele foi mais rápido e a segurou pelo cotovelo e a puxou de volta, ela por uma fração de segundo achou que ele tinha se arrependido ou voltado a razão, mas ele simplesmente disse: 

- Tá pensando que eu vou pagar essa conta? É toda sua. - e saiu na frente, deixando-a sozinha em prantos naquele que era seu restaurante favorito.

Minha mãe, pagou a conta, pegou um táxi e foi pra casa, enxugou suas lágrimas e foi deitar com a desculpa de que tinha aula no dia seguinte, não conseguiu dormir pensando no que a família diria sobre ela estar grávida daquele homem de quem tanto lhe alertaram. A irmã mais velha, Adriana, já era casada e tinha uma filha, e a do meio Luana não tinha filha ainda (estava grávida e ainda não sabia) mas também era casada, ela era a única que daria tamanho desgosto a família. 

Mas na verdade foram todos muito compreensivos e a apoiaram todo instante. Ela assim que terminou a faculdade, conseguiu uma proposta maravilhosa de emprego, foram também muito compreensivos com sua gravidez, seu chefe, o Sr. Rodrigues, a adorava, e como não? Ela era e é super dedicada, competente, inteligente e esforçada, uma excelente profissional. Quando eu nasci passou a trabalhar em casa pois não queria deixá-lo na mão, e quando eu tinha seis meses, voltou a trabalhar normalmente e a minha avó cuidava de mim com o meu avô, me babavam o dia inteiro. 

A minha mãe desenvolveu excelentes projetos, dando muito lucro a empresa e cresceu muito com ela. Hoje, vivemos no melhor bairro da cidade, com tudo de melhor que o dinheiro pode comprar, porém sem perder o essencial. Nunca poderei dizer que fui trocada por trabalho, que me faltou atenção ou que minha mãe deixou de estar comigo por motivos profissionais. Nunca mesmo. Ela supriu totalmente a necessidade de um pai, juntamente com os meus avós, tias, tios, primas e primos. Claro que meus questionamentos existiram, principalmente quando algumas amiguinhas cruéis resolviam usar isso só para me chatear, perguntei pra ela se eu não tinha pai mas ela sempre dizia que eu tinha pai sim, só que ele estava muito longe. Quando eu cresci, por volta de uns 12 anos ela me contou toda essa história de uma maneira mais leve e disse que se eu quisesse ela encontraria ele para que eu pudesse conhecê-lo. Eu não quis, é claro. Mas ele não me quis primeiro. Não tenho mágoa, não tenho mesmo, nada. Eu tenho a minha mãe, e isso basta. 

AcrediteiWhere stories live. Discover now