Era estranho estar ali novamente.
A visão daquela casa lhe trazia as melhores e piores lembranças, entretanto era impossível se concentrar em qualquer uma que não fosse a última. Podia ouvir naquele mesmo momento, como uma expectadora, os gritos escapando pelas janelas, abafados, mas nítidos.
Lindsey e Gerard.
Suas desculpas ressoavam altas em sua mente, a fazendo se sentir pequena. Minúscula em comparação a postura altiva de seu marido, sempre contido, apesar de ter as íris flamejantes. E era essa característica dele que mais a assombrava, a fúria tão presente, representada por sua antítese, a calma. Não conseguia prever o que realmente passava-se em sua mente, seus próximos passos.
Os olhos fixos mantiveram-se no seu antigo lar enquanto dirigia-se a casa vizinha.
Nada era como antes.
Mas voltaria a ser.
Não precisou tocar a campainha, a porta se abriu instantaneamente com a sua aproximação:
- Estava preocupada com a sua demora. – Começou Veridiana, a cumprimentando com um beijo no rosto e fazendo um gesto para que entrasse.
Lindsey hesitou fitando a casa ao lado por mais alguns segundos e suspirou antes de, enfim, aceitar o convite. Sem dizer nada e acompanhada pela outra, sentou-se no sofá, recusando a bebida que lhe foi oferecida.
Diana sentou-se ao seu lado e quieta avaliou o semblante da amiga. Não parecia feliz – e nem poderia depois do rompimento brutal com Gerard e a mudança de um dia para o outro –, mas havia algo além. Um brilho nos olhos, talvez, ou um ínfimo sorriso nos lábios que demonstrava alguma esperança.
E isso bastou para desarranjar seus pensamentos.
- Preciso confessar algo. – Começou Ballato, remexendo-se no sofá de maneira desconfortável. A curva nos lábios alargou-se em sinal de nervosismo enquanto uma das mãos esfregava a nuca.
Wood franziu o cenho.
- O que houve, Lyn? – A voz quase nem saiu tamanha era sua ansiedade. Algo lhe dizia que o plano estava prestes a ruir.
- Vou... – Puxou o ar pela boca, buscando coragem para dizer. – Vou tentar voltar para Gerard, você sabe, fazer com que ele me aceite de volta. – Assim disse de uma vez como um curativo arrancado da pele. Parecia prever a repreensão oculta, mas palpável que transpassaria da amiga para si.
Entretanto, interpretava a atitude como preocupação, afinal, eram melhores amigas.
Diana levou alguns segundos para absorver a informação, ponderando os contras da decisão tomada por Lindsey, esta que continuou:
- Não assinamos o documento de separação ainda. – Reforçou o fato óbvio, buscando incentivar a outra finalmente a falar.
- Uau! – Exclamou, sem ânimo, embora fingisse surpresa. Naquele momento, não sentia-se disposta a continuar a conversa, mas decidiu que não podia ser tomada pelos sentimentos. Precisava ser prática. – Qual é o plano? – Não pretendia soar tão fria, mas não pôde evitar.
- Vou contar a verdade.
Wood tinha as pernas inquietas, não sabia lidar com frases pela metade.
- Mas... Você já não tentou isso?
- De certa forma, sim, mas aconteceu algo... – Mordeu o lábio inferior e sorriu minimamente, Veridiana mantinha as íris escuras fixas em si tentando prever o que diria a cada menor gesto. – Vou dizer de uma vez! – Jogou as mãos para cima, deixando-as caírem sobre as pernas com um estalo. – Estou grávida!
- O que?
Não havia entendido direito.
- É muito recente, mas é isso! Vou ter um bebê.
Dentre todas as coisas que pensou em dizer, Diana escolheu a mais apropriada:
- Meu Deus... – Levou a mão à boca e, em seguida, em um gesto robótico abraçou a amiga que tinha os olhos marejados. – Parabéns!
- Obrigada, Ana! – Riu enquanto secava uma única lágrima do rosto. – Eu estou um pouco nervosa, ainda não decidi quando vou contar... Você sabe o que ele pensa sobre ser pai.
Way nunca quis ter filhos.
Lindsey conhecia o que o marido lhe contava, apesar de não gostar de tocar no assunto. Havia crescido em um lar atípico, longe dos princípios morais da sociedade, entretanto sua educação fora rígida, com pouco afeto.
O maior medo de Gerard era ser como seu pai.Por mais que tivesse tentado se distanciar ao máximo da personalidade difícil de Donald, a sentia como parte de si prestes a se manifestar ao mais mínimo deslize.
Way não era tolo. Sabia que havia seguido o estilo de vida de seu pai, embora modificado, por influência. Nunca fora uma escolha. Não desejava isso para seus próprios filhos e, por não saber como evitar, preferia não tê-los.
Esta questão lhe assombrava.
- Sim, eu sei... – Respondeu pensativa, lembrando-se do que a amiga lhe contara. – Ainda assim, ele não vai abandoná-la.
Não fazia o perfil do homem.
- Não. – Concordou, radiante. – Ele vai ficar receoso, mas vai querer o filho por perto! – Continuou com ânimo. – Ele vai ser um excelente pai!
Após a frase, um silêncio incômodo tomou conta do ambiente. Havia algo que não estava claro e, obviamente, para Diana, era a questão mais importante.
- Lyn – Chamou, dando um clima de mistério para o que viria a seguir. Esperava que com a pausa, a amiga imaginasse o que se passava em sua mente. – Como sabe que não é de Jack?
- Ana! – Exclamou, levando uma das mãos ao peito.
- Eu... Me desculpe, Lyn. Eu só precisava saber. – Fingiu desconforto com a indiscrição, mas estava mais concentrada em analisar a reação de Ballato. Viu os traços no rosto da amiga se desarranjarem, tentou ocultar o nervosismo com um sorriso simples.
E sua resposta limitou-se a uma frase.
- Uma mulher sabe dessas coisas.
Esta que bastou para Veridiana concluir que Lindsey sabia tanto quanto si própria, mas que usaria do benefício da dúvida para voltar para o marido. Aquilo não estava certo.
- Estou tão feliz por você. – Disse e a abraçou mais uma vez.
- Obrigada, Ana. – Respondeu com sinceridade e continuou emocionada. – Eu juro, ninguém nunca me entendeu como você.
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In The Dark || Frerard
Fanfic"De repente, por mais que estivesse em frente a um espelho, fitando-se por minutos em silêncio, não se reconhecia. Nos traços faciais refletidos, não havia sequer um ínfimo resquício do temido líder dos Leviathans e, sim, uma trilha de ruína e devas...