Nora

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Esperei Lana se recompor e me desgrudei de seus braços lentamente.

- Não acredito que te encontrei. - Eu disse, dando um sorriso sincero.

- Também não acredito que você me encontrou. - Ela se afastou um pouco, enxugando as lágrimas que escorriam pelo seu rosto - Também não acredito que quase me matou.

Fiz uma cara de culpa.

- Eu sinto muito pela sua bochecha. - Disse, com sinceridade. - Pensei que você fosse uma daquelas coisas.

- Tudo bem. - Ela sorriu. - Eu sempre quis ter uma sicatriz.

E era verdade, Lana sempre fora conhecida por ter medo de tudo, e consequentemente, nunca ter se arriscado o sulficiente para ter uma cicatriz, algo que ela sempre quis ter.

- Vai ficar bem em você. Olhei para o rio. - A propósito, o que houve com a ponte?

Ela olhou pra mim e fez uma expressão de orgulho.

- Cedeu quando eu fugia de três infectados.

Minhas sobrancelhas se curvaram.

- Você? Fugindo de infectados? E ainda está viva? Sem mordidas?

Comecei a procurar por marcas em seu corpo e ela riu.

- Eu estou bem. Me livrei deles.

- Tem certeza? - Perguntei.

Ela fez que sim com a cabeça.

- E você? - Ela perguntou. - Porque resolveu procurar por mim só agora? Pensei que seu pai tinha proibido todos de sairem de casa.

- E ele proibiu. - Olhei para o céu, que agora começava a ficar claro. - Mas eu fugi para te achar. Preciso que venha comigo.

Ela me olhou séria e perguntou:

- Por quê?

- Existe uma ilha segura, uma sem infecção, e nós vamos para lá. - Ela arregalou os olhos. - Mas meu pai não queria ir te buscar, e eu não queria te deixar pra trás, por issso fugi.

- Entendi. - Ela continuava séria. O que me intrigou.

- Por que você não está feliz?

Ela demorou alguns segundos até responder.

- Você foi até a minha casa não é?

- Fui, mas isso não responde minha pergunta

- As luzes estavam apagadas?

- Estavam, por isso eu vim pra cá, sabia que seria o único lugar para onde você iria, mas isso ainda não responde a minha pergunta.

A expressão dela ficou dura.

- O que foi? - Perguntei, sem entender a expressão de seu rosto.

- Se as luzes estavam apagadas, significa que meu pai não estava
lá, e que minha mãe não voltou.

Aquilo foi como receber um tapa na cara, eu nem ao menos tinha cogitado a hipótese dos pais dela terem morrido ou sumido, ou simplesmente ter pensado no por que dela estar sozinha agora. Como não pensei nessas coisas?

Me senti um lixo.

- Por que você veio pra cá? - Perguntei finalmente.

- Estávamos sem comida, e aqui era o único lugar seguro que ainda tinha comida para pegar.

Eu sabia disso. Antes da epidamia atacar, fizemos daquele galpão um depósito de comida, iamos sempre lá fazer piquenique.

- Qundo vocês vão para essa tal ilha? - Ela prguntou, me trazendo de volta a vida.

- O navio vai atracar hoje na costa da cidade por meia hora, contando a partir do nascer do sol.

- Então ele já atracou. - Ela olhou para o céu, que estava quase totalmente claro.

- Acho que sim. - Respondi.

Ela me olhou cabisbaixa.

- Me desculpe Nora, mas eu não vou com você.

Um arrepio invadiu minha espinha assim que ela pronunciou aquelas palavras.

- Por que não?

- Por que eu preciso voltar pra casa, preciso me certificar de que meu pai está bem.

- Por que ele não estaria? - Perguntei, já sentindo a raiva me possuir.

- Você disse que as luzes estavam apagadas, significa que ninguém está em casa, é uma tradição, você sabe. - Ela suspirou. - Provavelmente ele foi me procurar.

- Ou ele poderia simplesmente estar dormindo. - Rebati. - Ainda era noite quando fui lá.

- Ela não dorme há dias. -
Ela olhou para o chão, e eu imaginei as coisas pelas quais ela deve ter passado sem mim. - E mesmo que ele dormisse não apagaria as luzes.

Suspirei, tentando aceitar que tinha ido até ali para nada, que tinha fugido para nada, que tinha matado um homem para nada.

- Me desculpe mesmo, mas eu não posso simplesmente abandonar o meu pai e fugir. - Ela me encarou nos olhos. - Me desculpe mesmo.

Eu entendia o lado dela, mas não queria aceitar suas desculpas, queria que ela viesse comigo.

- Se você ficar pode acabar morrendo.

- Eu sei.

Ela sabia dos riscos, mas não mudaria de ideia.

- Então isso é um adeus? - Perguntei, temendo que ela dissesse sim.

- É claro que não. - Ela sorriu, e eu me senti um pouco melhor. - Depois que eu encontrar o meu pai, nós vamos até o barco, e fugiremos todos juntos.

Aquela ideia me fez sorrir, e então eu soube que mesmo depois de tanto tempo ainda arrancavamos sorrisos uma da outra.

- Vou esperar por você. - Eu disse.

- Tenho certeza que vai.

Ela me deu um último abraço apertado, molhando toda a minha roupa, e saiu correndo em direção a cidade, sem olhar para trás.

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