Birthdayte - Parte I

3K 386 104
                                    

- Trauma injustificado? Trauma injustificado. Sério? Você está me dizendo que eu não tenho razão? – contestei, com as sobrancelhas tão arqueadas que quase alcançavam a raiz do meu cabelo.

- Claro, filha, não entendo porque tanto drama. É uma data como qualquer outra. Seria a mesma coisa se você fizesse aniversário no dia 16 de maio, ou 26 de julho, pelo amor de Deus.

Revirei os olhos com todas as minhas forças.

- ...Disse a pessoa que teve a sorte de nascer em um dia tão inofensivo quanto 20 de outubro, que é SÓ o Dia da Estatística. – rebati.

Ah, me poupe, qual é a pior coisa que poderia acontecer com uma pessoa nesta data? Alguém falar "uau, você já passou 45% da sua vida". Grande coisa.

- Queria ver se você pensaria igual se tivesse vindo ao mundo em primeiro de abril como eu. – prossegui, irritada com o rumo da conversa – Poxa, mãe, você não poderia ter segurado só mais um pouquinho? Dia 2 já seria de bom tamanho.

- Eu me recurso a ter esta discussão de novo com você, Monalisa. – decretou, antes de pegar o prato apoiado no braço do sofá e ficar de pé – Todo ano é a mesma coisa.

- Por que será, né?

E então, uma nuvenzinha metafórica de memória surgiu em minha cabeça, transportando-me para 2011, quando tudo começou:

1º de abril de 2011: 11 anos

O combinado em casa era que cada um de nós teria direito a um aniversário em buffet e mais nada. Afinal, em uma família de quatro filhos era economicamente inviável que todo mundo tivesse uma mega-comemoração-com-pôneis-cor-de-rosa-e-fogos-de-artíficio-todo-ano.

Eu queria muito que ela tivesse tema de Enrolados, mas aí a Gioconda, minha irmã mais velha e bem mais sensata, disse que eu já era grande demais para isso e que deveria fazer algo maduro e abstrato como "vermelho com bolinhas pretas".

Insira aqui meu eu do passado revirando os olhos enfaticamente.

Fato é que organizamos uma super festa no melhor buffet da cidade. Lá tinha uma baladinha nos fundos, um camarim com maquiadoras, uns painéis legais para tirar fotos com as amigas, um fotógrafo contratado para registrar tudo que acontecesse... E muita comida.

E partindo da irrefutável premissa de que a teoria da conspiração não só é verdadeira, como atua nos mais diversos níveis do convívio humano, eu obviamente tinha um plano.

Um plano de pele clara e cabelos morenos compridos-demais-para-um-menino-de-onze-anos. Um plano que pessoas normais chamariam de Leonardo, mas eu, na posição de futura esposa, podia chamar de "Léleo" ou de "meu docinho", a depender do humor.

O problema é que, como já disse, fui amaldiçoada por minha mãe ao nascer e eu jamais, jamais deveria ter considerado boa a ideia de fazer uma festa no próprio dia 1º de abril. Obviamente as coisas estavam predestinadas à catástrofe.

Pois bem.

Bastou que Paula recebesse seu convite para bolar o plano mais maligno de todos os tempos. Minto: o plano mais maligno de todos os tempos até aquele momento, pois dali em diante tudo piorou drasticamente.

Contou para o melhor amigo do Leonardo, o Lipe, que o convite para minha festa era uma emboscada, e que naquele local, dia e horário, haveria uma enorme campanha de vacinação.

Eu sei, estúpido.

Quem, pelo amor de Deus, vacinaria pessoas em um buffet-barra-balada-infantil?

Nossos 12 mesesOnde histórias criam vida. Descubra agora