Verdade ou Consequência - Parte 4

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"Maldita Shelley. Maldita Shelley e seus malditos filmes de terror e lendas urbanas macabras. Malditos amigos. Maldito mojito. Mil vezes malditos. Mil maldições!" Eu repetia esse mantra enquanto olhava pela janela do Pub do Brownie, para um grupo muito animado de jovens em fantasias espetaculares.

Agora que a névoa da embriaguez já se dissipara um pouco, meu coração batia como se fizesse cosplay de um atabaque em roda de capoeira. Só que sem o ritmo musical feliz. E cheio de uma mistura confusa de sentimentos... Expectativa, empolgação, mas também incerteza e medo de algo dar muito errado. Um pequeno calafrio com tons sobrenaturais arrepiava minha pele, me alertando para ter cuidado.

Após me convencerem que não era nem um pouco necessário retirar minha roupa para essa vingança em questão, meus amigos sortearam uma lenda urbana da lista das histórias preferidas da Shelley. Precisamos excluir as que envolviam crianças e armas porque, claro, ambas poderiam trazer consequências desastrosas nas mãos de jovens bêbados. Aparentemente, todos amadurecemos depois do halloween passado.

Não satisfeitos com o nível de dificuldade, decidiram mesclar a lenda do roubo de órgãos com fantasmas e ficou decidido que eu poderia ter a ajuda de todos eles, mas quem deveria orquestrar e executar o susto final seria eu. Assim, Marcela foi designada para seduzir o babaca do Gregório, porque ele jamais seria capaz de negar uns amassos com uma garota bêbada (sim, esse é o nível de escrotidão abusiva do rapaz). Ainda mais uma com cara de modelo da Victoria Secrets e corpo de rainha de bateria de escola de samba, completamente sensual numa fantasia de Vampira (do tipo X-men, não Crepúsculo).

Nos demoramos debatendo o dilema moral de drogá-lo para pregar uma peça, mas por fim decidimos que Marcela deveria fazê-lo beber até que o álcool saísse por suas orelhas. Aquilo apaziguou nossa moral, considerando que essa era uma prática comum do Gregório em festas (embebedar garotas até que elas esquecessem completamente a existência da palavra "não"). Um leve "blackout" deveria bastar para fazer o que precisávamos fazer.

Mauro me acompanhava na tocaia do lado de fora do Pub, esperando que Marcela atraísse o rapaz para a oficina do pai do Gustavo. A ideia inicial era achar uma casa abandonada assustadora, possivelmente infestada de espíritos e com uma atmosfera de tensão diabólica, mas infelizmente nossa cidade era pacata demais para ter uma dessas. A morte mais trágica de que tivemos notícias em anos foi um acidente de carro na rodovia 46, há alguns meses. Nada que envolvesse possessão demoníaca nem tarados da machadinha, apenas um acidente estúpido com duas vítimas fatais e um motorista ainda foragido.

Então, veja bem, na falta de uma casa assustadora, utilizamos a oficina, um local com muitas molas e objetos de metal capazes de produzir sons esquisitos e muitas janelas para o surgimento de vultos sinistros.

Mauro sugeriu que adicionássemos um toque de O orfanato na brincadeira, escolhendo umas máscaras macabras de animais e umas roupas antigas para completar o visual. Fantasma que não é retro não tem credibilidade, na minha opinião.

Quando vi Marcela e Gregório caminhando em direção à oficina meu sangue gelou, ao mesmo tempo em que meu coração disparava de expectativa. Eu estava horrorizada e empolgada ao mesmo tempo... Parecia tão certo! Ele merecia aquilo! Ele merecia o terror.

Ele estava com o braço ao redor da cintura dela, falando todo tipo de bobagens em seu ouvido. Olhando assim, qualquer um pensaria ser um casal apaixonado. Mal sabiam o grandessíssimo canalha que ele era, se aproveitando de uma moça bêbada. Claro, Marcela sabia o que estava fazendo, e nós estávamos lá para protegê-la. Mas ele achava que estava "se dando bem" com uma "vadia bêbada"... Aquilo era tão, tão, tão errado!

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