Capítulo XVI

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Helena e eu voltamos para casa e por mais que eu tentasse esquecer aquele homem, não conseguia.

Seus olhos tinham algo que me tiravam completamente do controle. Era uma mescla de desejo e medo. Como se uma tristeza desmedida me corroesse.

Fiquei dias andando de um lado para o outro durante a noite. Tinha sonhos estranhos, como se tivesse vivido em outro seculo, mas aquele homem estava no sonho. Eu me entregava em seus braços. Sentia algo inexplicável.

Assim que o contrato ficou pronto, voltei para a fazenda, sozinha desta vez, ja que Helena se recusou a ficar por la enquanto os tramites fossem feitos.

- Bom dia senhor Alvaro - O cumprimentei assim que ele abriu a porta.

- Bom dia Eleonor! Entre por favor. - Disse convidando-me a entrar.

Assim que entrei notei que tudo tinha sido recém pintado. Ele tinha decorado o lugar, mas o piano ainda continuava la, agora restaurado e muito mais bonito.

- Que bom que o restaurou. Ele é magnifico. - Disse passando a mão pelo piano.

- Ele é uma reliquia. O restaurador disse que deve ser de meados do século dezoito. - Explicou, fazendo-me sorrir.

- Como o antigo dono pode ter o deixado aqui. Deveria ser uma herança de familia, não acha? - Perguntei a ele, que me olhava gentilmente.

- Sim acho. Mas nem sempre as pessoas valorizam o que tem. Preferem comprar algo novo. Confesso que quando vi este piano, me apaixonei a primeira vista, como se ele sempre tivesse sido meu. - Confessou assustando-me.

- Tive a mesma impressão. Que estranho! - Esbocei algo que o fez franzir a testa. - Você toca?

- Não. Sempre fui amante da boa música, mas só ouvinte. E você toca? - Indagou sorrindo.

- Toco desde os quatro anos. Sou formada em música clássica. - Respondi sem encará-lo.

- Toque um pouco para mim. Assim poderá ver se o restaurador fez bem seu trabalho. - Pediu, olhando-me enquanto eu me aproximava do piano e me sentava.

Fechei os olhos e comecei a tocar minha música predileta Valse Minute Waltz de Chopin. Enquanto tocava, sentia meus dedos nas teclas e balançava minha cabeça como se dançasse no salão acompanhada de alguém.

Assim que terminei, Alvaro estava em lágrimas, batia palmas e gritava - Bravo!

Olhava para ele emocionada, e um pouco ruborizada. Algo naquela música mexia comigo.
-Obrigada Alvaro. Muito gentil de sua parte. - Disse estranhando meu modo de falar. Nunca falei deste jeito. Parece até que alguém está falando através de mim.
- Você merece todos os elogios minha cara. - respondeu sorrindo.
Ele se aproximou de mim e ofereceu-me sua mão. Confusa e sem saber para que ele me chamava, resolvi arriscar e dei-lhe minha mão.
Ele sorriu e fez com que eu o acompanhasse até o andar de cima.
- Aonde estamos indo? - Questionei sem entender nada.
- Calma! Vou levar você pra que veja como ficaram os quartos. Pintaram a casa toda e contratei uma decoradora que terminou toda a decoração ontem a tarde. - Explicou enquanto subíamos as escadas.
Assim que chegamos no primeiro andar, percebi alguns aparadores laterais com vasos do flores naturais. Alguns espelhoscom molduras antigas em madeira talhadas a mão que deixavam o ambiente muito mais requintado e confortável.
Ele foi na frente abrindo a porta dos quartos e mostrando todos os ambientes. Os quartos eram brancos, com camas de casal king size, os castiçais laterais foram pintados de bronze, dando um toque mais fino aos quartos.
Depois de um grande corredor, havia uma sala com teto em gesso, minimamente moldado a mão, com desenhos singelos e um jogo de sofá em formato L, todo branco em Napa, imitando couro. Nas laterais da sala dois enormes vasos de concreto, com plantas naturais, e uma porta imensa de vidro usada como janela, que além de luminosidade fazia o ambiente ficar mais amplo e oxigenado.
Assim que terminamos de ver o primeiro andar, subimos para o segundo.
Neste andar havia uma sala idêntica a primeira, mas com terraço com uma mesa branca de ferro e quatro cadeiras.
Os quartos eram todos clean. Mas um dos quartos tinha algo que chamou minha atenção.
Além dos castiçais bronze, havia uma pequena fonte dourada, com a escultura de um anjo no pequeno terraço do quarto.
Quando entrei, pensei estar só revendo algo que fez parte de mim e não algo novo.
Pensei que deveria ser impressão, já que me apaixonei pela casa a primeira vista.
Alvaro percebeu minha cara de satisfação ao andar pelo quarto e sorriu.
- Este quarto não faz com que queiramos ficar nele? - Perguntou olhando para o terraço.
- Sim. É muito acolhedor. - Respondi passando a mão pelo castiçal. - Seu contrato está pronto. Precisamos ir a cidade. - Mudei de assunto ao vê-lo encarar-me.
- Podemos ir amanhã. Gostaria de curtir a casa hoje. Você me dará a honra de hospedá-la aqui, não vai? - Indagou olhando-me diretamente nos olhos.
- Creio que não terei escolha. - Constatei ao vê-lo sorrir.
- É isso ai. De que adianta ter uma casa enorme desta, com quase vinte quartos e não poder hospedar ninguém. - Desabafou.
- É só transformar essa fazenda em um hotel fazenda. Vai conseguir hospedar muita gente. - Brinquei.
- Engraçadinha- Respondeu fazendo careta.
Estávamos descendo as escadas e voltando para a sala central. Sentei no grande sofá ao lado do piano e ficamos conversando por algumas horas sobre diversos assuntos.
Nem percebemos que o sol havia se posto.
Minha pequena mal estava no carro. Fui até ele e a peguei. Por mais estranho que fosse aceitar o convite de Alvaro, não sentia medo, nem desconforto. Pelo contrário, era como se eu o conhecesse a anos.
Depois de colocar a mala no quarto principal, no qual Alvaro fez questão que eu ficasse, tomei um banho de banheira, me troquei e desci.
Alvaro já me aguardava. Normalmente homens são mais rápidos que mulheres, nada demais.
- Você está linda! - Disse ao me ver de vestido verde escuro, soltinho no corpo e um pouco acima do joelho. Coloquei uma sandália sem salto, para completar o look despojado e menininha, como dizia minha irmã Helena quando me via usar esse vestido.
- Obrigada. - Agradeci sorrindo.
- Vamos jantar? - Perguntou.
- Não via a hora de escutar isso. Estou faminta. Já aviso de anti mão que como de verdade viu. Não sou dessas magras que comem como passarinho. Sou magra de ruim mesmo. - Confessei antes que ele percebesse que sou quase uma passa fome.
- Adoro mulher de apetite, sem frescuras. - Respondeu sorrindo satisfeito.
Entramos no carro e fomos a um restaurante na cidade próxima da fazenda.
O restaurante era bem simples, comidinha caseira e tipicamente mineira. Arroz, couve refogada, carne de porco, torresmo, feijão gordo. Quase me enfartei de tanto comer. Agradeci a Deus por ter ido de vestido, pois ficaria muito feio abrir os botões da calça para conseguir respirar. Cheguei a esboçar um sorriso sem querer do que pensava. O fazendo me encarar divertido.
- O que está pensando hein? - Indagou divertido.
- Se eu te falar vai me achar louca. - Disse rindo.
- Prometo não te julgar. - Falou colocando a mão por cima da minha. Deixando-me sem graça.
- Deixa pra lá. Acho que já comemos muito. Estou cansada. Depois de comer como comemos, o melhor é dormir para digerir.
- Verdade. Vou pagar e te encontro no carro. - Ele falou meio sem jeito.
Assim que pagou, ele entrou no carro e fomos para a casa dele.
Não tenho medo dele, tenho medo do que sinto perto dele.

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