Levamos meia hora para chegar no consultório depois de entrarmos na cidade.
Paramos de frente a um prédio antigo, mas muito bonito. Pegamos o elevador e subimos para o sexto andar.
Apertamos a campainha e uma mulher loira de mais ou menos quarenta anos, abriu a porta e avisou o doutor pelo telefone que Alvaro e eu tínhamos chegado.
Prontamente ele abriu a porta e veio nos receber. Um homem careca, baixinho e de sorriso espontâneo.
- Boa tarde, - cumprimentou-nos - Você deve ser Eleonor?
- Sim doutor. Muito prazer. - Disse apertando-lhe a mão.
- Como vai Álvaro? - Perguntou ele abraçando Álvaro.
- Estou bem Eduardo, - respondeu sorrindo - mas ja agradeço por nos receber em cima da hora.
- Sem problemas amigo. Sentem-se, por favor. - Pediu, apontando o sofá.
- Como funciona doutor? - Perguntei sobre a regressão.
- Primeiro vou induzi-los a um estado profundo de consciência, assim poderão visualizar imagens que me permita decifrá-los em tempo e em tudo mais que precisarmos trabalhar.
- Faremos ao mesmo tempo? - Indagou Alvaro.
- Não. Creio que seria melhor fazer com Elenor primeiro, mas Álvaro precisará aguardar la fora. - Explicou.
- Como saberemos o que aconteceu com certeza? - Insisti.
- Não se preocupe Eleonor. Eu gravo as sessões, para analisá-las posteriormente.
- Melhor então. Estou pronta. - Disse ansiosa.
- Álvaro poderia, por favor, aguardar na sala de espera? - Pediu.
Assim que ficamos a sós, ele pediu que eu me deitasse em um grande divã, diminuiu a luz e ligou um aparelho que fazia um barulho suave de estalos.
- Eleonor, qual a data do diário que leram? - Perguntou.
- Meados de mil oitocentos e oitenta. - Respondi.
- Você agora vai ouvir apenas minha voz ficando distante a cada número que eu contar, já o tilintar do temporizador, vai ajudá-la a não se dispersar. Feche os olhos, por favor, relaxe. Deixe sua mente livre de preocupações. Não pense em nada. Concentre-se no som de minha voz.
Fechei os olhos e fiquei tranquila, ouvindo apenas a voz dele.
- Dez... relaxe. Nove... sinta-se livre como se flutuasse. Oito... tranquilize-se. Sete... Imagine-se entrando em um túnel branco. Seis... atravesse o túnel, estamos entrando no passado. Cinco... minha voz está ficando mais distante. Quatro... O fim do túnel está chegando. Três... minha voz está cada vez maos distante. Dois... estamos agora em mil oitocentos e oitenta e oito. Um...
De repente, algumas imagens foram se formando em minha mente, como um sonho.
- Conte-me o que vê - pediu uma voz bem distante.
- Me vejo dançando, estou em uma festa de casamento.
- Como está vestida? - Perguntou.
- Estou de branco, sou a noiva.
- Você vê o noivo? O reconhece?
Olho nos olhos da pessoa que dança comigo e sorrio.
-Sim, é Alvaro. Estamos felizes.
As cenas mudam e me vejo em um quarto escuro.
- O que vê agora Eleonor? Vejo medo em seu rosto.
- Estou apavorada. Alguém se aproxima. Fique quieto. - Peço amedrontada.
- Observe a cena.
- Álvaro está transtornado, me espancando. Estou sangrando. Começo a chorar e gritar por piedade, mas ele não para. Sinto dores nas costas.
Começo a soluçar com um choro exaustivo.
-Concentre-se Eleonor. Acalme-se, só assim a cena percorrerá.
Tento me acalmar e as imagens vão modificando.
Começo a sorrir. - Álvaro e eu estamos felizes novamente, estou grávida.
- Vocês estão sozinhos? - Ele pergunta.
- Não. Mariana está a mesa conosco.
- Quem é Mariana? - Questiona ele.
- A prima de Álvaro.
- Você gosta dela? - Insiste.
- Não. Tenho ciumes dela com Álvaro, sinto que ela me odeia. - Explico.
- Relaxe para que possamos ir mais adiante.
Então relaxo mais e solto um grito.
- O que está acontecendo Eleonor?
- Estou dando a luz. Está doendo. - Grito em meio a gemidos e dores.
De repente, uma alegria tomou conta de mim.
- E agora? O que está sentindo?
- A dor cessou. Estou me sentindo fraca, muito fraca. Sinto meu corpo deixar o ambiente.
Minha voz foi ficando fraca e senti que fosse morrer.
- Eleonor, volte agora. - Ouvi a voz como um grito e abri os olhos, quase sem fôlego.
- Calma Eleonor, está tudo bem. - O médico disse segurando meus braços.
- Meu Deus! Isso foi uau! Que loucura! - Exclamei ainda sentindo todas as sensações.
- É assim mesmo. Tome esse copo de água, vai ajudar. - Pediu entregando-me o copo.
Bebi toda a água, como se estivesse com muita sede, cansada mesmo.
- Fui eu quem escrevi o diário. Me vi no chão escrevendo.
- Pelo que descreveu, você e Álvaro foram marido e mulher e passaram por muita coisa juntos. Quem sabe fechemos a explicação com o que Álvaro contará. Vá para a sala de espera e peça para que Álvaro entre, por favor.
Fui a sala de espera e olhei Álvaro nos olhos, meu coração despertou, como se todo o amor que senti vendo as imagens voltassem. O abracei forte e beijei seus lábios. Queria senti-lo novamente próximo a mim.
Ele então se afastou de mim e sorriu.
- Pelo jeito sua regressão foi ótima, eu gostei. - Falou contente.
- Sua vez meu amor. Entre. - Respondi com os olhos brilhando.
Ele entrou e eu me sentei, revivendo o beijo que tinha acabo de dar nele. Mesmo estando curiosa, esperei.
Mais de uma hora depois, o doutor Eduardo abriu a porta e fez sinal para que eu entrasse.
Entrei e sentei no sofá ao lado de Álvaro, que estava nitidamente triste e abalado. Peguei sua mão e apertei, como se o confortasse.
Ele me olhou e seus olhos tinham uma sombra estranha. Senti um aperto no peito.
- O que foi? Entro aqui e vocês estão sérios, Alvaro triste. O que aconteceu? - Questionei, sem entender nada.
- Bom Eleonor, a regressão de Álvaro, foi difícil, mas explicou muita coisa.
- Que bom. Então conte. - Pedi eufórica. Minha curiosidade era muito grande.
Alvaro e Eduardo se olharam e percebi que ambos ficaram sem graça, mas mesmo assim Eduardo explicou.
- Pelo jeito. Alvaro mantinha um relacionamento com Mariana e ela a matou, ele acabou morrendo de culpa e desgosto, mas com o tempo aprendeu a amá-la. No começo do casamento ele a odiava, sentia raiva o tempo todo, mas quando você engravidou, ele se apaixonou e fez de tudo para fazê-la feliz, mas Mariana enciumada acabou envenenando-a aos poucos, inclusive o bebê não sobreviveu.
Eu ouvia tudo e a tristeza abateu meu coração. Como se revivesse a perda de algo novamente.
- Vocês precisam resgatar o que lhes foi tirado, por isso se reencontraram. Eu os aconselho a se darem uma nova chance.
Quanto a você Eleonor - Disse olhando para mim - deveria queimar esta diário. Não é bom guardar algo com tantas lembranças dolorosas. Precisam estar livres de amarras e magoas.
- Essas sensação vai passar? - Indagou Alvaro a ele.
- Sim. Fique tranquilo. Por enquanto, cheguem em casa e tenham uma boa noite de descanso, amanhã com a emoções mais tranquilas, tudo se resolverá. - Aconselhou-nos.
Nos despedimos de Eduardo e seguimos para a fazenda, sem conversar. Totalmente em silêncio. Foi a viagem mais longa da minha vida.
Subimos cada um para seu quarto e dormimos.
Precisávamos de um pouco de solidão para digerirmos tudo aquilo.
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O Diário de Eleonor
EspiritualEleonor é filha única de um casal da alta sociedade de São Paulo e casa-se com Alvaro, um homem que guarda vários segredos sobre sua vida, inclusive um caso tórrido com sua prima Mariana. Este casamento os levarão ao extremo. Eleonor no pior momento...