Cap. 18 - Junior (capítulo especial)

3.9K 443 93
                                    

*** Dedico o capítulo de hoje aos irmãos de Orlando que perderam sua vida por simplesmente serem quem são. Não podemos nos acostumar e muito menos esquecer essa tragédia. Que saibamos compartilhar o melhor de nós nesse mundo que insiste em nos fazer sofrer ***

O engraçado e contraditório do pub era que aquelas pessoas estavam ali para serem elas mesmas e ainda assim sabíamos tão pouco a respeito delas. Às vezes, se queixavam da vida medíocre e fake que levavam, mas ainda assim se mantinham distantes como numa sessão de terapia. Tão logo conseguissem sexo ou droga, os clientes se apressavam e sumiam na penumbra de volta para a vida construída em mentiras. Eu não entendia. Se fugiam de uma vida que não gostavam, porque não ficavam mais? Por que saíam correndo sem nos dizer seus nomes? Eu não conseguia me convencer de que gozar e cheirar pó pudessem ser tudo o que aquelas pessoas precisavam. Eu sentia falta de sorrisos. Sentia falta da coisa boa que é estar com alguém sentindo seu corpo depois do sexo. Era o meu trabalho, eu sei. Eu me acostumaria se quisesse. Mas eu não quis. Sentia que muitos daqueles clientes precisavam de mais do que o cardápio do pub oferecia. Talvez não procurassem por simplesmente achar que não existisse nada além daquilo. Ou pior... Talvez pensassem que não mereciam nada além daquilo. Eu discordava. Não é uma questão de merecer; amor é uma necessidade prioritária.

Para me excitar, eu procurava encontrar naquelas pessoas algo único. Algo que me fizesse querer estar com elas. O olhar, o toque das mãos, a timidez, qualquer esquisitice que me fizesse rir. Também haviam aqueles que, assim como Alberto, eram violentos e despejavam em mim sua raiva do mundo. Nunca passaram do limite, claro. Eles não seriam imbecis a ponto de provocar a ira do Colomba. Ainda assim, com todo o medo do perigo, não perdiam a oportunidade de serem desagradáveis.

Bruce e eu paramos à porta do quarto dezessete para checar o celular. Em uma das mãos, seus dedos seguravam três taças e na outra usava o polegar para rolar uma mensagem no WhatsApp. Seu rosto logo se fechou numa seriedade preocupante.

- Tá tudo bem, Bruce? - perguntei.

- É a Melzinha, cara... Tá sentindo dores. Quer que eu vá logo pra casa.

- Então vai logo. Eu fico aqui com o cliente.

- Não. Vamos fazer essa e depois eu vou... - ele guardou o celular, segurou a maçaneta para abrir a porta e acabou hesitando. - Porra! Deus tá querendo me foder, tá ligado? Ele tá querendo me tirar a Melzinha, mas eu não vou deixar, mano.

- Melhor você ir, Bruce.

- Não. Melhor a gente entrar e trepar. O cara paga bem. Depois eu vou.

- Ok... E quem é o cara.

- A gente chama ele de Junior.

- Junior? Ok... - digo.

- Não faça perguntas pro cara. Só entra no jogo. Ele quer ser fodido por dois. Faz sua parte, eu faço a minha e depois deixa ele ir embora.

Bruce mexeu no pau por dentro da calça jeans para se excitar e logo percebeu o efeito. Havia raiva em seu rosto, mas também havia uma luta interna para não pensar na namorada. Aquilo me afetava profundamente. Eu sabia como era a dor de perder uma pessoa importante. Entendia seu esforço de tentar lutar contra o destino. Ele ainda podia lutar. Eu não pude. A partida é pior quando não te permite se despedir.

Bruce deu um tapa no meu rosto para me deixar atento porque percebeu as lágrimas em meus olhos. Ele foi o primeiro a entrar no quarto e eu fui logo atrás com a champanhe cara dentro de um balde de gelo. O tal Junior estava a nossa espera. Ele, em pé próximo à janela, fumava um cigarro olhando o movimento da rua alguns metros abaixo de nós. Branco, magro e de camisa social amassada, era mais jovem do que eu esperava. Junior deveria ter em torno dos trinta anos e as olheiras acusavam extremo cansaço. Ele apagou o cigarro na parede, meteu as mãos no bolço da calça e ficou nos olhando entrar. Eu o reconhecia de algum lugar, mas até então não sabia de onde.

Com amor é mais caro (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora