Capítulo 7 - Ontari

222 30 2
                                    

E no fim das contas, eu fiz. Amigos, quero dizer.

Não que eu tivesse feito força. Eu nem mesmo queria. Já tenho amigos suficientes lá no Brooklyn. Tenho a Raven, a melhor amiga que alguém poderia ter. Não precisava de mais amigos.

E não achava realmente que alguém aqui fosse gostar de mim – muito menos depois de terem sido obrigados a fazer uma redação de mil palavras por causa do que aconteceu depois que cheguei. E muito menos ainda depois do que aconteceu quando fomos informados de que tinha chegado a hora do segundo período – a Academia Missionária não tinha sirene, nós trocávamos de sala de hora em hora e tínhamos cinco minutos para chegar ao destino. Mal o professor Walden nos dispensou, a menina albina virou-se na cadeira e me perguntou, com os olhos violetas brilhando de raiva por trás das lentes dos óculos:

— Suponho que agora espera que eu te agradeça pelo o que disse para a Debbie?

— Por mim você não tem que agradecer — respondi, levantando-me.

Ela também se levantou:

— Mas foi por isto que você fez aquilo, não foi? Defendendo a albina... Por acaso sentiu pena de mim?

— Fiz aquilo porque Debbie é uma mala — respondi, dobrando a capa no braço.

Vi que os cantos dos seus lábios se contorceram. Debbie agarrara os livros e praticamente correra em direção à porta no exato instante em que o professor Walden nos dispensara.

Dava para ver que a garota albina ficou com vontade de rir quando chamei a Debbie de mala, mas ficou firme. Disse então, toda cheia de orgulho:

— Posso perfeitamente me defender sozinha, ok? Não preciso da sua ajuda, Nova York.

Eu dei de ombros.

— Tudo bem por mim, Carmel.

Desta vez ela não conseguiu deixar de sorrir. Ao fazê-lo, mostrou uma fileira de dentes com aparelho que reluziam tanto quanto o mar lá fora.

— Cee Cee — disse ela.

— O que é Cee Cee?

— Meu nome. Sou a Cee Cee — completou, estendendo a mão branca feito neve, com as unhas pintadas de laranja chocante. — Bem-vinda à Academia Missionária.

Às 9 horas, o professor Walden já nos havia dispensado. Dois minutos depois, Cee Cee já tinha me apresentando a vinte outras pessoas, e quase todas vieram trotando atrás de mim a caminho da aula seguinte, querendo saber como era morar em Nova York.

— Lá é mesmo tão, tão... — quis saber uma garota com aparência cavalar, toda ansiosa na busca da palavra exata para exprimir o que desejava — tão metropolitana quanto dizem?

Essas garotas, talvez nem precise dizer, não eram as tipicamente populares. Não demorou para eu ver que não se davam com a lindinha bronzeada e com a garota cujos dedos eu ameaçara quebrar. Nada disso. As garotas que se aproximaram de mim eram dos mais diversos tipos, umas cheias de acne, outras gordas, ou então completamente esqueléticas.

Cee Cee parecia ser a líder daquele grupinho. Editora do jornal do colégio, o Notícias Missionárias, ao qual se referia como "mais uma resenha literária do que um jornal de verdade", ela dissera a verdade quando me informou que não precisava de ajuda para ir à luta. Munição era o que não lhe faltava, com direito a um belo arsenal de torpedos verbais e uma ética do trabalho das mais sérias. Praticamente a primeira coisa que ela me perguntou, depois de superar a raiva que lhe provoquei, foi se eu estaria interessada em escrever alguma coisa para o jornal.

— Nada muito complicado — foi dizendo, toda espevitada. — Quem sabe simplesmente um ensaio comparando a cultura adolescente na Costa Leste e na Costa Oeste. Aposto que você está encontrando um monte de diferenças entre nós e os seus amigos lá de Nova York. Então, o que diz? Meus leitores teriam o maior interesse, especialmente garotas como Kelly e Debbie. Talvez você pudesse publicar alguma coisa sobre o mico que pode ser aparecer bronzeado na Costa Leste.

Sempre ao seu ladoOnde histórias criam vida. Descubra agora