Capítulo 14 - A terra das sombras

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Corri tão depressa que mais tarde a treinadora de corrida perguntou se eu queria entrar para a equipe.

Mas a Cee Cee estava completamente enganada. Jaha não estava morto. Nem Bryce.

E o que havia acontecido não tinha nada a ver com acidente.

Como praticamente qualquer um podia imaginar, acontecera o seguinte: Bryce entrou no gabinete do diretor por algum motivo, ninguém sabe qual. Talvez por um passe de atraso, já que ele tinha perdido a reunião. Bryce estava de pé em frente à escrivaninha da secretária, embaixo do crucifixo gigante que, segundo Finn, derramaria lágrimas de sangue se alguma vez houvesse uma formanda virgem na Academia Missionária, quando aquela enorme cruz de quase dois metros de altura de repente se soltou da parede. Padre Jaha abriu a porta do seu gabinete exatamente na hora em que ela estava caindo para a frente, a ponto de esmagar o crânio de Bryce. Mas, como o padre Jaha deu um empurrão nele, só a sua clavícula foi atingida.

Infelizmente, Jaha acabou recebendo todo o peso da cruz, que o projetou no chão, esmagou suas costelas e quebrou uma de suas pernas.

O professor Walden e um grupo de irmãs ficaram tentando fazer com que voltássemos para a sala de aula em vez de ficar atravancando o corredor, à espera que padre Jaha e Bryce saíssem do gabinete. Uma parte do pessoal se afastou quando irmã Ernestine ameaçou todos com um castigo, mas não eu. Eu não dava a mínima se ficasse de castigo. 

Irmã Ernestine ficou bem calada depois disso.

Foi pouco depois que vi que o Jasper estava perto de mim. 

— E o que você está fazendo aqui?

— Quero ver se ele está bem — respondeu, e eu reparei tão pálido quanto estava.

— Você vai arranjar problema — adverti.

Irmã Ernestine estava ocupadíssima anotando os nomes das pessoas.

— Não dou a mínima — fez o Jasper. — Quero ver.

Dei de ombros. Fiquei me perguntando até que ponto Jasper sabia, se é que sabia, sobre o que estava acontecendo ultimamente em seu colégio.

Finalmente, quando parecia que já tinham passado várias horas, eles saíram lá de dentro. Bryce foi o primeiro a aparecer, amarrado a uma maca e gemendo, lamento dizer, como um bebe. Eu já quebrei e desloquei um bocado de ossos, e podem ficar sabendo que dói, mas não a ponto de ficar lá deitada gemendo. Geralmente, quando me machuco eu nem me dou conta. Como ontem à noite, por exemplo. Quando realmente me machuco só consigo ficar rindo, dói tanto que chega a ser engraçado.

E vou ter de reconhecer que eu meio que desanimei do Bryce depois de vê-lo agir daquela maneira como um bebê.

Especialmente quando vi o padre Jaha, que foi trazido em seguida pelos paramédicos numa cadeira de rodas. Ele estava inconsciente. Em minha pressa de chegar ao colégio, eu não tinha comido nada de manhã, e tenho de reconhecer que a visão do pobre Jaha com os olhos fechados me fez ficar meio tonta. Na realidade, pode ser que eu tenha vacilado um pouco, e provavelmente teria caído se Jasper não tivesse apanhado a minha mão e dito, confiante:

— Fique tranquila. Eu também fico enjoado quando vejo sangue.

Mas não foi a visão do sangue do padre Jaha vazando pelo curativo em sua cabeça que me deixou enjoada. Foi a constatação de que eu havia fracassado. Eu tinha fracassado terrivelmente. Foi por pura sorte que Ontari não tivesse conseguido matar os dois. Era exclusivamente por causa da rápida reação do padre Jaha que ele e Bryce ainda estivessem vivos. E não havia sido por minha causa. Não mesmo.

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