Encarei-o boquiaberta.
— Hã, padre Jaha — falei depois de um tempo. — Sem ofensa, mas o senhor andou tomando analgésico demais, ou alguma coisa assim? Porque odeio ser eu a dar a notícia, mas esse negócio de vampiro não existe.
O padre Jaha estava mais perto do que nunca de abrir aquele maço e enfiar um dos cigarros na boca. Mas se conteve.
— Como você sabe?
— Como eu sei o quê? Que esse negócio de vampiro não existe? Bem, do mesmo modo que eu sei que não existe o Coelhinho da Páscoa nem Papai Noel.
— Ah, mas as pessoas falam isso com relação aos fantasmas. E você e eu sabemos que isso não é verdade.
— É, mas eu vi fantasmas. Nunca vi um vampiro. E já estive num monte de cemitérios.
— Bem, para não dizer o óbvio, Clarke, eu estou por aí há muito mais tempo do que você e, mesmo não tendo encontrado pessoalmente um vampiro, pelo menos estou disposto a admitir a possibilidade da existência dessa criatura.
— É. Certo, padre Jaha. Vamos só nos arriscar um pouco e dizer que o cara é um vampiro. Red Beaumont é um sujeito muito conhecido. Se ele andasse por aí depois do escuro mordendo pessoas no pescoço, alguém iria notar, não acha?
— Não se, como você disse, ele tiver empregados ansiosos por protegê-lo.
Isso era demais.
— Certo. Isso aqui ficou um pouco Stephen King demais para mim. Tenho de voltar para a aula, se não o Sr. Walden vai achar que eu desertei. Mas se eu receber um bilhete seu mais tarde dizendo que terei de enfiar uma estaca no coração do cara, nem pensar. Tad Beaumont de jeito nenhum vai me convidar ao baile de formatura se eu matar o pai dele.
O padre pôs os cigarros de lado.
— Isso vai exigir alguma pesquisa...
Deixei o padre fazendo o que ele mais gostava: surfar na internet. Só recentemente a administração da Academia tinha comprado computadores e ninguém ali sabia usá-los muito bem. O padre Jaha em particular não tinha ideia de como um mouse funcionava e vivia arrastando-o de uma ponta da mesa à outra, não importando quantas vezes eu lhe dissesse que só precisava mantê-lo em cima do mouse pad. Seria uma gracinha se não fosse tão frustrante.Decidi, enquanto seguia pela passagem coberta, que teria de colocar Cee Cee no trabalho. Ela era um pouco mais apta para surfar na Internet do que o padre Jaha.
Enquanto me aproximava da sala do Sr. Walden – que na semana passada infelizmente tinha recebido a maior parte dos danos do que todos haviam presumido ter sido um terremoto não explicado, mas que na verdade foi um exorcismo que não deu certo – notei um garotinho parado ao lado da pilha de entulho do que tinha sido um arco decorativo.
Não era incomum ver garotinhos nos corredores da Academia Missionária, já que a escola tinha turmas desde o jardim de infância até o terceiro ano. Mas o incomum naquele garoto era que ele estava brilhando um pouco.
Ele me olhou enquanto eu me aproximava, como se estivesse me esperando. O que era verdade.
— Oi — disse ele.
— Oi.
Os trabalhadores estavam escutando rádio bem alto e felizmente nenhum deles notou a garota estranha ali parada, falando sozinha.
— Você é a mediadora? — perguntou o garoto.
— Um deles.
— Bom. Eu tenho um problema.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sempre ao seu lado
RomansVivi mais de mil anos. Morri incontáveis vezes. Esqueço o número exato. Minha memória é uma coisa extraordinária, mas não é perfeita. Sou humano. As primeiras vidas são um tanto indistintas. O arco da alma segue o desenho de cada uma das vidas. Houv...