Capítulo 12 - Passado

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Vamos para casa. Aquele "Vamos para casa" tinha um ar tão aconchegante... Só que a casa na qual ambas estávamos vivendo ainda não me parecia exatamente como se fosse um lar. E como poderia? 

E por outro lado, claro, ela não tinha nada que estar vivendo lá...

De qualquer maneira, fantasma ou não fantasma, ela salvara a minha vida. Isto não se podia negar. E talvez só tivesse feito para cortejar o meu lado bom, para que eu não acabasse por expulsá-la completamente da casa.

Independentemente do motivo, o fato é que tinha sido muito legal da parte dela. Até então ninguém nunca tomara a iniciativa de me ajudar – principalmente, é claro, porque ninguém sabia que eu precisava de ajuda. Nem a Raven, que estava presente quando madame Zara declarou que eu era uma mediadora, sabia por que eu aparecia às vezes na escola com olheiras, ou onde é que eu me metia quando faltava às aulas – coisa que eu fazia com bastante frequência. E eu não podia explicar o que estava acontecendo.

De modo que só podia me sentir agradecida por ter Lexa ao meu lado, embora ela me deixasse meio nervosa. Depois de toda aquela catástrofe, ela me acompanhou até em casa. E até insistiu em empurrar ela mesmo a bicicleta, por causa da minha ferida. Se alguém tivesse olhado pelas janelas das casas por onde íamos passando, teria pensado que estava vendo coisas: eu me arrastando com dificuldade e aquela bicicleta deslizando ao meu lado sem o menor problema – com o detalhe de que minhas mãos nem tocavam nela.
O tempo todo, enquanto voltávamos para casa, a única coisa em que eu conseguia pensar era o que havia saído errado no confronto com a Ontari.

Não voltei a falar do assunto. Nunca, mas nunca mesmo, em todos aqueles meus anos como mediadora, eu havia encontrado um espírito tão violento e irracional. Eu simplesmente não sabia o que fazer. E eu sabia que precisava encontrar uma saída, e bem depressa; faltavam só umas poucas horas para começarem as aulas e Bryce cairia direto na armadilha mortal que estava sendo preparada para ele.

Não sei se Lexa percebeu por que eu estava tão calada, ou se ela estava pensando na Ontari também... Só sei que de repente ela quebrou o silêncio e disse:

Não há no céu fúria comparável ao amor transformado em ódio, nem há no inferno ferocidade quanto a de uma mulher desprezada.

Olhei para ela.

— Está falando por experiência própria?

Ela deu um pequeno sorriso à luz da lua.

— É uma citação de William Congreve.

— Ah... Mas, como você sabe, às vezes a mulher desprezada está cheia de razões de ficar furiosa.

— E você, está falando por experiência própria? — quis saber ela.

Eu dei uma risada.

— Nem de longe.

Para te desprezar, é necessário que tenha gostado de você antes. Mas não falei em voz alta. Não há a menor hipótese de que eu pudesse alguma vez dizer uma coisa dessas em voz alta. Não que eu estivesse preocupada com o que Lexa podia pensar de mim. Por que haveria de me preocupar com o que uma garota morta podia pensar de mim? Mas eu não ia reconhecer diante dela que nunca havia namorado. 


— Mas a gente não sabe o que aconteceu entre a Ontari e o Bryce. No fundo, não sabemos. Ela podia ter muitas razões para estar ressentida.

— Ressentida com ele, acho que sim — disse Lexa, embora parecesse relutante em admiti-lo. — Mas não com você. Ela não tinha direito de tentar machucá-la.

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