Minha respiração ainda estava pesada e meus pensamentos desordenados voltados para Erik quando sou levada para um passeio ao parque. Uma enfermeira de cabelos grisalhos me guiou até a porta dos fundos do sanatório, que se abriu para um canteiro amplo e verde, regado de flores, balões, uma trilha e um lago azul cristalino que se estendia junto ao caminho de pedras.
Caminhei hesitante sobre a grama fresca enquanto observava as demais pessoas passearem pelo parque, exercendo todo o tipo de atividade que lhes era apresentada. Mal notavam minha presença. Uma sensação de alívio e decepção se apoderou de mim.
Me sentei embaixo de uma árvore levemente isolada das demais, observando as figuras ao meu redor. Enquanto meus olhos pulavam de pessoa para pessoa, uma em questão me chamou atenção. Sua pele branca como neve parecia brilhar sobre o Sol, enquanto seus cabelos longos negros dançavam sobre o vento. A mesma trajava um vestido de penas negro, com leves detalhes vermelhos. Logo a reconheci de mais um de meus delírios.
__O que você quer?__Sussurrei, tão baixo que mal consegui ouvir minhas próprias palavras, que foram levadas pelo vento até alcançarem a jovem morena.
A mesma se virou e prosseguiu com passos rápidos em minha direção. A cada centímetro de distância diminuído me proporcionava uma visão melhor da garota. Seus olhos obscuros, esfumados, seus lábios cor de vinho e seu cabelo brilhoso criando formas ao vento. Minhas pupilas se dilataram quando a mesma se sentou ao meu lado, fixando seus olhos nos meus. A semelhança dela com Ashley era espantosa, apesar das características opostas. Do vermelho ao negro...
__Você sabe o que quero... Só precisa se lembrar.__Sua voz era relaxante e perigosa ao mesmo tempo, tendo um toque de dor em cada letra pronunciada.__E eu irei te ajudar com isso.
A mesma levantou sua mão e vendou meus olhos, inclinando minha cabeça para trás delicadamente até se choca contra a árvore. Exatamente no momento do impacto, minha mente foi corrompida com milhares de imagens, flashs rápidos e confusos que se fundiam uns com os outros.
Respirei fundo e me concentrei na primeira imagem que me ocorreu. Era eu. Sentada em meus aposentos, trajando uma camisola linda e me observando no espelho, enquanto deturpava o reflexo com a substancia brilhosa vermelha que saía de minhas mãos.
Passei para a próxima. Era a mesma figura, porém a garota de cabelos negros agora se encontrava ao meu lado. Com apenas um gesto, a mesma transformou o vermelho vivo de minha mágica à um negro pálido, que logo se reduziu a nada menos do que pó sobre meus dedos.
Ainda atormentada pela imagem, mudei meu foco para a outra mais próxima. Quando finalmente me concentrei na mesma, ela simplesmente sumiu, como se a mesma fosse censurada para mim.
Guardei a crescente curiosidade sobre o conteúdo da tal imagem, e passei para a seguinte. Assim que a imagem se tornou clara aos meus olhos, senti todos os meus sentidos relaxarem, exceto a audição. Meus músculos se tencionaram e meu cérebro se recusava a focar em qualquer outra coisa a não ser aquela imagem, ou melhor, aquele momento. A causa de toda essa mudança não era uma simples figura, mas sim a reprodução de um momento do qual aparentemente eu estava envolvida.
Respirei fundo e, como em um vídeo, ''apertei o Play''. Eu estava em m palco enorme, na frente de milhares de pessoas. Havia os nobres, os plebeus, os que representavam o parlamento e a ''família real''. Me sentia nervosa. Minhas mãos suavam e eu ainda não tinha total certeza sobre o que estava prestes a falar. Contudo eu tinha que fazer isso. Pelo bem de todos.
__Caros súditos. Me apresento hoje para vocês, com uma proposta. Uma solução. Uma medida da qual acreditamos ser a única capaz de colocar um tão esperado fim nessa terrível guerra, e acabar com essa Era Alarmante. Declaro agora dessa forma, oficialmente e irreversivelmente, minha ida a Erde.
Sons de espantos ecoaram por toda a sala, e logo cochichos incompreensíveis inundaram o local. Sentia meus dedos tremerem, mas não iria voltar atrás. Não podia voltar atrás. ''É para um bem maior. Todos estão contando com isso. Seja forte, Anna'' pensei. Respirei fundo, pedi silêncio e tornei a falar:
__ Como estava dizendo, após muita discussão e argumentos jogados a mesa, chegamos a esta conclusão. Usaremos a máquina feita por Nicola Edison para realizarmos o processo, já que após algumas pesquisas, confirmamos que a mesma é capaz de abrir fendas no espaço tempo, onde é possível a passagem para outro universo, assim como podemos escolher a data em que gostaríamos de chegar no mesmo. Naturalmente, nem tudo é perfeito.
Fiz uma breve pausa, repassando o que deveria falar e me concentrando nas palavras, uma tentativa desesperada de deixar o medo ir embora e a coragem finalmente encontrar seu caminho até mim.
__Dessa forma, no momento em que minha mente chegar a Erde, viverei em uma ilusão e não me lembrarei de nada referente a esta vida até o momento certo chegar. Para isso, contarei com a ajuda de Aurora e Freya, para me guiarem pelo caminho que me levará as minhas memórias deste lugar. Mas, para que isso aconteça, precisarei de um gatilho. Um ato ou uma palavra que, uma vez dita, me fará rever e entender verdadeiramente o motivo pelo qual fiz esta viagem. Felizmente, já cuidamos disso.__Olhei instintivamente para Erik, que retribuiu com um sorriso discreto e levemente malicioso e confuso.__Portanto, levando em conta a Lei do Universo, do qual proíbe que peregrinos invadem demais mundos de forma a desafiar a Natureza, bom... Terei de nascer novamente.__Mais uma onda de espantos. Fechei os olhos e continuei.__, crescerei e viverei como qualquer outro humano, durante 18 anos, quando será o momento em que minha memória finalmente retornará. Assim, durante todo este tempo, meu corpo será preservado e jazido nas torres mais altas do Castelo, até o momento em que cumprirei com minha obrigação e, enfim, retornarei a meu corpo. Isso é tudo. Obrigada pela sua atenção e uma boa-noite a todos. Nos vemos em 18 anos, assim espero.
Deixei o local assim que terminei a última palavra, ignorando o tumulto que minha declaração causou e me concentrando na ânsia que invadia meu corpo e se intensificava a cada segundo.
__Anna!
Acordei com um pulo ao ouvir meu nome. Olhei ao redor. Ainda estava no sanatório, encostada na árvore, com o jardim a minha volta. Foquei minha vista na enfermeira que estava ao meu lado, com as pupilas dilatadas e o rosto pálido.
__Esta tudo bem?__ A mesma perguntou, se negando a encostar em mim por algo que julguei ser medo.
__ Sim, porque?__Respondi, tentando parecer normal e indiferente, apesar de estar completamente apavorada e confusa com o que havia acabado de presenciar.
__Me diga você. Acho que acabou pegando no sono e, quando vim acorda-la para o jantar, a senhorita começou a falar repetidamente palavras sem sentido.
__Que palavras?__ Me aproximei rapidamente da mesma, ansiando por informações. A enfermeira se afastou logo em seguida, me olhando espantada.
__Não acho que seria saudável compartilhar tais informações, senhorita.
__Por favor, é de suma importância que eu saiba tais fatos.__Implorei, ainda tentando parecer calma e serena.
A enfermeira espremeu os lábios, pensou por alguns segundos, olhei para os lados e finalmente falou:
__A senhorita repetia palavras como ''Rápido'', ''Estamos sem tempo'', ''Agora é com você'' e...__ Ela parou por alguns segundos, fechou os olhos e completou a frase.__''A morte esta bem ao nosso lado''.
Estava prestes a argumentar quando algo atrás da mesma me chamou atenção. Olhei para a direção e o que vi me fez desligar de vez minha mente e pular em direção a escuridão.
A 100 metros de distancia, Freya, Aurora e a garota de cabelos negros se encontravam nuas, cobertas por sangue dos pés a cabeça, com uma faca em uma das mãos e a outra pairando sobre o ar, exibindo um corte do qual jorrava sangue.
Com os dentes tremendo e visão embaçada, apenas olhei para a enfermeira e falei as palavras mais saudáveis que pronunciei em toda a minha vida:
__Apenas me tire daqui.
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A Princesa Vermelha
Подростковая литератураEscuro, silencioso, assustador. Era assim que eu poderia descrever nosso novo ''lar''. Havia cheiro de mofo em todo lugar e, sinceramente, não sei como eles estavam conseguindo respirar com tanta facilidade. O cheiro chegava a ser sufocante. ...