Sister

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Aqui está um segredo sobre minha família: Minha irmã contraiu o deliria vários meses antes do agendamento do procedimento. Ela apaixonou-se por um garoto chamado Thomas, que também não era curado.

Durante o dia, ela e Thomas passavam todo o tempo deles deitados num campo de flores silvestres, protegendo seus olhos em frente ao sol, sussurrando promessas um para o outro que nunca poderiam ser mantidas. Ela chorou o tempo todo, e uma vez ela me confessou que Thomas parecia curá-la do choro com um beijo. Ainda agora, quando eu penso naqueles dias — eu tinha somente oito anos na época — penso no sabor de sal.

A doença lentamente trabalhou sua maneira mais e mais profunda no interior dela, como um animal mastigando-a por dentro. Minha irmã não podia comer. O pouco que nós podíamos convencê-la a engolir era vomitado rapidamente, e eu temia por sua vida.

Thomas partiu seu coração, é claro, ninguém ficou surpreso. O Manual de SSF diz: Amor Deliria Nervosa produz mudanças no córtex pré-frontal do cérebro, que resulta em fantasias e ilusões que, uma vez revelados, arrastam sucessivamente a uma devastação psíquica. Por isso minha irmã nada fez a não ser deitar na cama e olhar as sombras deslocarem-se lentamente através das paredes, suas costelas surgindo abaixo de sua pele pálida, como madeira subindo através da água.

Mesmo assim, ela recusava o procedimento e o conforto que ele lhe traria, e no dia marcado, para que a cura fosse administrada, foram necessários quatro cientistas e várias agulhas cheias de tranquilizantes antes dela vir a submeter-se; antes dela parar de arranhar com suas longas e afiadas unhas, que não eram cortadas por semanas, e gritando e praguejado e chamando por Thomas. Eu assisti eles virem por ela, para levá-la ao laboratório; eu sentei num canto, apavorada, enquanto ela cuspia e chutava, e eu pensava em minha mãe e meu pai.

Naquela tarde, embora eu ainda estivesse a mais de uma década longe da segurança, eu comecei a contar os meses antes de meu procedimento. No final minha irmã estava curada. Ela voltou para mim gentil e contente, suas unhas impecáveis e arredondadas, seu cabelo puxado para trás em uma longa trança grossa. Vários meses mais tarde, ela estava prometida para um técnico de TI, mais ou menos da sua idade, e várias semanas depois de sua formatura na faculdade eles se casaram; suas mãos juntas frouxamente sob um dossel, ambos olhando direto para frente, com um futuro que não será danificado pela ansiedade, pelo descontentamento ou pela discórdia, um futuro de dias idênticos, como uma série de bolhas sopradas de modo ordenado.

Thomas estava curado também. Ele está casado com Ella, uma vez a melhor amiga da minha irmã, e agora todo mundo está feliz. Sofia me contou há poucos meses que os dois casais frequentemente veem um ao outro nos piqueniques e eventos da vizinhança, visto que eles moram razoavelmente próximos um do outro na East End. Os quatro se sentam, mantendo uma educada e tranquila conversa, com nenhuma só centelha do passado para agitar a calmaria e a perfeição do presente.

Essa é a beleza da cura. Não há uma menção aqueles dias quentes perdidos no campo, quando Thomas beijava Sofia, que era desligada, e inventavam mundos apenas para que ele pudesse prometer-lhes a ela, quando ela dilacerou a pele de seus próprios braços com o pensamento de viver sem ele. Eu estou certa de que ela está embaraçada por aqueles dias, se ela se lembrar deles de qualquer modo. Verdade, eu não a vejo com frequência agora, somente uma vez a cada dois meses, quando ela lembra que deveria fazer uma visitinha e desta forma eu acho que você poderia dizer que mesmo com o procedimento eu perdi um pouco dela. Mas este não é o ponto. O ponto é que ela está protegida. O ponto é que ela está segura.

Eu vou contar a você outro segredo, este é um para seu próprio bem. Você pode pensar que o passado tem alguma coisa para contar a você. Você pode pensar que você deve ouvir, deve esforçar-se para perceber os sussurros, deve fazer todo o possível, inclinar-se para ouvir sua voz sussurrando sobre a terra, para os lugares mortos. Você deve achar que existe alguma coisa dele dentro de você, alguma coisa para entender ou fazer sentido.

My Only DeliriumOnde histórias criam vida. Descubra agora