Capítulo 28 - Uma história sobre voar

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Faena eventualmente recuperou a consciência. A primeira coisa que escutou foi o crepitar de fogo. Cheiro de carne, ela pensou, dando-se conta de seus arredores. Estava com a cabeça apoiada em algo mais macio do que o chão, e seu corpo fora coberto. A elfa se ergueu, com certo esforço, e abriu os olhos. Viu o garoto pálido a pouco mais de dois metros de distância, sentado junto a uma pequena fogueira. Havia tirado o manto azul-claro e vestia apenas a roupa de baixo, uma túnica de algodão até os joelhos. Parecia estar assando alguma coisa. Faena ainda podia ouvir o Sankar, mas os dois estavam mais afastados da margem, cercados por olmos e carvalhos.

– Clérigo... – ela chamou, rouca.

Sobressaltado, Eladar virou-se em direção a ela. O garoto pálido de repente não era mais tão pálido; seu rosto ficou vermelho, e ele sorriu, sem graça.

– D-Dokalfar! – exclamou. – Desculpe ter de me ver neste estado, mas minhas vestes estão secando. Sua capa e suas luvas também. Como está se sentindo? Bem? 

Ela olhou para si mesma. Estava coberta por um trapo marrom que fedia a estábulo, e seu "travesseiro", na verdade, era um amontoado de folhas. Faena tocou o abdômen e não encontrou um mínimo sinal de que havia sido ferida. Os três talhos largos tinham desaparecido como mágica.

– Hei... – ela tateava a barriga. ­– Você...

– Ah, eu curei você, mas estava um pouco fraco ainda... – ele disse. – Depois que eu descansar de novo, talvez possa...

– Não – ela retrucou, tentando não parecer impressionada. – Está bom assim. O que aconteceu?

Ele levantou e se aproximou, tirando a poeira da túnica com as mãos.

– Você desmaiou – o elfo disse. – Passou cerca de seis horas dormindo.

Faena arregalou os olhos.

– É muito tempo. Temos que ir.

– Calma – Eladar pediu. – Sei que está com pressa, mas você precisa se alimentar. Infelizmente, sua bolsa foi arrastada pelo rio, então, nada de raízes. Mas... está vendo ali? Comida.

Ele apontou para a fogueira, onde havia um espeto com um peixe. Faena franziu as sobrancelhas.

– Como conseguiu...?

O elfo deu de ombros, mas corou. 

– Bom, um clérigo é capaz de conjurar um pouco de fogo. No meu caso, algumas faíscas, mas já foi o suficiente. E eu tenho um tio que me ensinou muitas coisas, inclusive a caçar com armadilhas, pescar, tirar escamas, limpar... você tem sorte que ele está viajando, ou senão já teria rastreado nós dois há tempos. De qualquer jeito... desamarrado, posso ser um pouco mais útil. Ah, eu usei a sua espada para fazer um espeto e limpar o peixe; espero que não se importe. Aliás, ela é tão leve! Impressionante.

Faena sacudiu a cabeça. A espada estava ali, ao lado dela, dentro da bainha.

Que diabos...

– E isto? – ela ergueu o manto que a cobria – Fede.

O rapaz baixou a cabeça e ficou vermelho mais uma vez.

– É... bem – ele murmurou. – Você ainda estava gelada, apesar do sol e do fogo. Precisava de algo mais para aquecer seu corpo. Há uma fazenda aqui perto... achei isso cobrindo um asno.

Um asno. A que ponto chegamos... mas...

– Você roubou? – Faena parecia entretida.

Sombra e Sol (EM HIATO - autora teve bebê)Onde histórias criam vida. Descubra agora