Capítulo 46 - "O melhor tolo que eu conheço."

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Faena sacudia a cabeça, inconformada, enquanto balbuciava "não, não, não". Seus pais estavam curados, ao que parecia, mas a que preço?

Eu devia ter adivinhado.

Estivera tão preocupada com as próprias dores que não havia pensado no que a cura poderia trazer ao garoto (por que ele não havia contado, por quê?). A culpa era um dos piores sentimentos do mundo, e Faena estava repleta dela. Lágrimas caíam em seus joelhos dobrados e seus soluços preenchiam o quarto, pungentes.

Eu não queria! – Ela conseguiu dizer, esganiçada. – Eu não queria isso, Ma Ulna!

A anciã, ainda parada no mesmo lugar, arregalou os olhos.

– De que diabos você está falando, filhote? Pare de chorar assim, vai assustá-lo!

A princípio, Faena não entendeu. Sua anciã bufou, impaciente, e se virou de costas para ela, abaixando-se até o suposto cadáver de Eladar. Mas então... como um milagre, a dokalfar viu aquela mão caída por detrás da cama se mexer, trêmula. Seu dono tentava se levantar e, aos poucos, Faena entendeu que o garoto tinha sobrevivido. 

Deusa... graças a Deusa...!

A dokalfar sentiu um alívio tão imenso que a vergonha pelos berros que acabara de dar pareceu um mero detalhe. Faena respirou fundo, engoliu seus soluços e se levantou, enxugando as lágrimas. Olhou para seus pais, que ainda dormiam, e depois correu até Ma Ulna e Eladar. O elfo apoiava-se na anciã, meio acordado, meio dormindo. Ele murmurou alguma coisa enquanto a Asynja se ajoelhava à frente dele, mas Faena não ouviu o que era.

– Garoto! – Ela chamou. – Garoto, você está me ouvindo?

Ele sacudiu a cabeça, parecendo aflito. Faena voltou-se para Ma Ulna.

– Ele está bem? O que aconteceu, o que vai acontecer? Ma...

– Acalme-se, filhote! – A velha disse. – Por causa dos seus gritos, ele acha que falhou. Que tal esclarecê-lo?

A elfa fungou, consternada. É claro... ela havia dado um belo espetáculo e passado a impressão errada, mas trataria de corrigir o mal-entendido.

– Não, Eladar, você conseguiu. – Ela disse. – Conseguiu curar os dois. Não é, Ma Ulna?

A anciã concordou e o clérigo sorriu, aliviado. A Asynja enxugou mais duas lágrimas do rosto. Ele tinha que ter me contado, ela pensou, fazendo uma careta zangada.

– É verdade que podia ter morrido? – Faena disparou, com o coração aos pulos.

Eladar abriu os olhos, um pouco mais desperto. Depois de processar a pergunta de Faena, ele franziu a testa e tentou falar. O que saiu foi sua voz de "pato bêbado", como diria Dufel, mas era o suficiente.

– Como...? Por que me pergunta?

– Explico depois – ela rebateu. – É verdade, não é?

Quando o garoto aquiesceu, o rosto de Faena ficou vermelho.

– Pela Deusa, elfo... – ela soava cada vez mais zangada. – Por que não me contou?

– Eu... ia – ele falava devagar. – Eu ia, lembra? Logo depois da Casa de Pedra.

– Ia? O que te impediu? O que fez com que me escondesse um detalhe tão importante?

O clérigo respirou fundo, tomando fôlego.

– Ouvi uma história... – ele respondeu. – Muito bonita... e então soube que precisava pular da árvore mais alta. Achei que talvez também fosse sobre perder o meu medo... você consegue me entender...?

Sombra e Sol (EM HIATO - autora teve bebê)Onde histórias criam vida. Descubra agora