39. little notes

900 101 32
                                    

Play.

A matéria favorita de todo mundo. Tudo bem, a matéria obrigatória favorita de todo mundo é uma comunicação entre jovens. É meio que uma eletiva não eletiva. Todo mundo faria essa matéria, mesmo se não fosse obrigatória, porque é muito fácil conseguir a média.

   E, na maioria das vezes, é divertida. Eu faria essa matéria só por isso.

Tem pouquíssima lição de casa e não esqueçam dos pontos extra por participação na aula. Pois é, incentivam a gente a berrar dentro da sala. Como não gostar?

   Eu me abaixo e agarro a mochila, erguendo-a até colocá-la em cima do banco onde minha mãe estava sentada há apenas alguns instantes.

Depois de me sentir cada vez mais colocada de lado, a aula de comunicação entre jovens tornou-se meu porto seguro na escola. Sempre que eu entrava naquela aula, sentia vontade de abri os braços e gritar: ― Um, dois, três, podem sair da toca!

   Enrolo as três fitas que eu já escutei dentro do plástico-bolha e as coloco de volta na caixa de sapato. Pronto. Trabalho encerado.

Durante um período de aula por dia, vocês não tinham permissão para de me tocar, nem dá risadinhas de mim pelas costas, não importava qual fosse o último boato. A Sra.Bradley não gosta de pessoas que dão risadinhas dos outros.

   Abro o zíper do bolso maior da mochila e enfio a caixa de sapatos de Camila dentro dele.

Esta era a regra número um, desde o primeiro dia. Se alguém desse alguma risadinha de algo que outra pessoa tinha dito, ficava devendo a Sra. Bradley um daqueles chocolates chamado Risadinha. E, se fosse uma risadinha extremamente grosseira, você ficava devendo uma barra tamanho família. 

   Sobre o balcão, ao lado do senhor walkman e do milk-shakede chocolate maltado que pedi em homenagem à minha mãe, estão às próximas três fitas.

E todo mundo pagava a dívida sem discutir. Este era o tipo de respeito que todo mundo tinha pela Sra. Bradley. Não a acusavam de implicar com ninguém, porque ela nunca fazia isso. Se dissesse que você estava dando risadinha, você estava. E sabia disso. No dia seguinte. Teria um chocolate esperando por ela em cima da mesa. E se não tivesse? Não sei. Sempre tinha.

   Junto as duas próximas fitas, rotuladas com o número nove edez, onze e doze, pintados com esmalte de unha azul, e as escondo no bolso interno da jaqueta.

A sra. Bradley falava que comunicação entre jovens era a matéria favorita entre as que ela lecionava – ou moderava como ela dizia. A cada dia, nos recebíamos um texto breve para ler, cheios de exemplos tirados da vida real. Depois, debatíamos sobre ele.

   A última fita, a sétima, tem um treze de um lado e nada no verso. Enfio essa fita no bolso traseiro do jeans.

Bullying. Drogas. Autoimagem. Relacionamentos. Todo assunto era válido na comunicação entre jovens. Algo que, obviamente, incomodava muitos dos outros professores. Era uma perda de tempo, diziam. Eles queriam nos ensinar fatos nus e crus.

   Faróis iluminaram a janela do Rosie's de uma ponta a outra e eu fecho ligeiramente os olhos enquanto eles passam.

Eles queriam nos ensinar o significado de X em relação a Y em vez de nos ensinar melhor a nós ajudar a entender melhor a nós mesmo e aos outros. Queriam nos ensinar quando a Carta Magna foi assinada – não importa o que seja isso –, em vez de discutir controle de natalidade. 

   Nós temos aula de educação sexual, mas é uma piada.

O que significava que, todo ano, nas reuniões de orçamento da escola, a comunicação entre jovens sofria ameaça de corte. E, todo ano, a Sra. Bradley e os outros professores levavam alguns alunos para dar exemplo a diretoria dos benefícios que a matéria nos trazia. Legal, eu poderia continuar defendendo a Sra. Bradley pra sempre. Mas alguma coisa aconteceu naquela classe, não foi? Se não, porque vocês estariam me escutando falar sobre ela?

No ano que vem, após meu pequeno incidente, espero que a comunicação entre jovens continue Eu sei, eu sei. Vocês pensaram que eu ia dizer algo diferente, não foi? Pensaram que, se eu dissesse que essa matéria teve um papelna minha decisão, ela deveria ser cortada. Mas ela não deve, não.Ninguém no meu colégio deve saber o que eu vou contar. E não foi a matéria em si que teve um papel maior nisso. Mesmo que eu nunca tivesse feito comunicação entre jovens, o resultado final poderia muito bem ter sido o mesmo. Ou não. Acho que essa é a questão central. Ninguém sabe ao certo impacto tem na vida dos outros. Muitas vezes não tem noção. Mas forçamos a barra do mesmo jeito.

   Minha mãe estava certa. O Milk-shake é incrível. Uma combinação perfeita de sorvete e chocolate maltado. E eu sou uma idiota por estar sentada aqui, me deliciando com ele.

No fundo da sala da Sra. Bradley ficava uma estante de arame. Do tipo giratória. Do tipo que vende romance em edição de bolso na livraria. Mas essa estante nunca teve livros. No começo de cada ano, o aluno recebia um saquinho de papel pardo para decorar com giz de cera, adesivos e selos. Abríamos o saquinho e os pregávamos na estante com uns pedacinhos de fita adesiva. A sra. Bradley sabia que as pessoas tinham dificuldade pra dizer coisas simpáticas umas pras outras. Daí, ela inventou um jeito de expormos anonimamente o que sentíamos.

Você admira a maneira como fulano fala tão abertamente sobre sua própria família? Coloque um bilhete no saquinho dele dizendo isso. Você entende a preocupação que fulana tem de não passar de ano em historia? Deixe um bilhete pra ela. Diga que estará pensando nela quando estudar para a próxima prova. Você gostou da atuação dele na peça encenada no colégio? Você gostou do novo corte do cabelo dela? 

   Ela cortou o cabelo. Na foto de monet's, o cabelo de Camila estava comprido. É assim que sempre a vejo em minha mente. Até mesmo agora. Mas não era assim que ela estava no final.

Se você conseguir, diga tudo na cara deles. Mas se não conseguir, deixe um bilhetinho e eles receberam seu recado e eles receberam da mesma maneira. Até onde eu sei, nunca deixaram um bilhetinho maldoso ou sarcástico no saquinho de alguém. Nós respeitávamos demais a Sra. Bradley para fazer isso.

Então, Harry Styles, qual a sua justificativa? 

suicide girl ; camila&lauren (revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora