Capítulo 2

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Sem revisão


Cinco meses depois

Com os olhos fechados por um momento Catarina Novaes puxou uma respiração profunda antes de abrir os olhos novamente na tentativa de acalmar o coração disparado. Tirou as mãos suadas do volante. Felizmente, não havia ninguém na garagem do prédio de escritórios àquela hora; enxugou as mãos, notando um leve tremor. Tudo vai ficar bem. Vinha repetindo essa ladainha pra si toda vez que entrava no carro e seguia para o trabalho.

Antes de sair do carro, encarou o rosto negro de traços delicados e os olhos castanhos; expressão serena de seu reflexo no espelho desmentia a inquietação interior. Retocou o discreto batom e conferiu o coque impecável e o conjunto de saia e blazer cinza e sóbrio.

Entrou no prédio, estava de volta ao trabalho há duas semanas. Passou pela recepção que começava a se agitar às 7h da manhã, e pouco se incomodou com os olhares curiosos que a seguiam. As pessoas ainda se impressionavam com sua recuperação milagrosa. Tivera sorte. Ouvia essa declaração ou o equivalente vezes sem fim desde que acordara do coma cinco meses atrás.

Subiu até o lugar onde se sentia em casa. O escritório Pacheco, Novaes & associados ocupava todo o andar e ficava num bairro nobre da cidade. Cumprimentou algumas pessoas pelo caminho, a maioria dos funcionários chegaria daqui à uma hora.

De sua cadeira atrás da mesa e antes de se concentrar na pasta diante de si, ela deixou o olhar vagar pela ambiente elegante. O sofá caramelo ocupava um canto da sala, próximo a ele ficava uma mesinha baixa de madeira e as cadeiras confortáveis; todo espaço fora decorado com simplicidade e bom gosto.Chegar até ali a enchia de orgulho. Ser sócia de um dos maiores escritórios de advocacia da cidade era um sonho que começara na adolescência pobre e se intensificara no início da vida profissional. Por ele, sacrificara outros desejos, mas nunca se arrependera.

Relaxou a cabeça contra o encosto da cadeira e, quase sem pensar, abriu o blazer e correu os dedos sobre o ventre até parar na cicatriz, contornou a pele enrugada. Fazia esse gesto com certa frequência e, embora ela mesma ainda não percebesse, o gesto parecia funcionar como um lembrete aterrorizante de como as coisas podiam mudar a qualquer momento. Piscou quando o som do celular interrompeu as lembranças.

Xxx

- Segura aí! – Roberto Rizzo se atirou, quase sem fôlego, para dentro do elevador segundos antes que as portas se fechassem. A ascensorista e as pessoas ali receberam o moço loiro e bonito com um sorriso que ele correspondeu um pouco nervoso. Puta merda! Só faltava essa! Quinze minutos atrasado e era segunda vez nessa semana. Paciência! Não adiantava ficar tão estressado, contudo, se desejava impressionar a exigente Catarina Novaes chegar depois dela ao escritório não era uma boa estratégia.

O expediente para ele começava uma hora antes desde que a chefe resolvera retornar do mundo dos mortos. Ele recordou entrando de supetão na recepção e tropeçando em Érica, a secretária. Agitado, segurou com firmeza as pastas com trabalho acumulado contra o peito.

- Ih! Perdeu a hora de novo? Vou começar a contagem regressiva de quantos minutos vai continuar no seu emprego depois de entrar naquela sala! - O rosto redondo da mulher baixa demonstrava uma nítida satisfação com essa ideia.

- Bom dia pra você também! – Roberto respondeu seguiu pelo corredor sem perder tempo com a "senhorita" Macedo.

Érica era secretária do outro sócio, Manuel Pacheco há mais de trinta anos e, atualmente supervisionava a contratação dos novos secretários para firma. Inexperiente, ele jamais teria sido escolhido para o cargo se, durante a entrevista e cercado por várias mulheres com currículos muito melhores que o seu, Catarina em pessoa não tivesse surgido e o contratado. Isso despertou cochichos e críticas entre os funcionários e a antipatia instantânea da secretária. A aposta era que ele não duraria nem um mês, no entanto, após oito meses ali ainda andava na corda bamba.

Por mais uma vezOnde histórias criam vida. Descubra agora