"IN TIME YOU'LL SEE THE TRUTH."
A cada segundo o rosto de John ia retornando ao habitual. As linhas de expressão cada vez mais duras. A mascara que a droga tinha deixado cair estava voltando aos poucos. A minha surpresa de saber os podres de Samuel me impedia de tentar arrancar mais informações de John. As perguntas estavam na ponta da minha língua, mas não parecia que valeria a pena. Eu não precisava saber mais, pois já tinha o bastante para não me sentir mais culpada. Não havia obrigação nenhuma em meu coração para com Samuel. Não precisava haver luto. Ele não merecia uma lágrima sequer. Toda minha vida ele me tratou como se eu fosse lixo e eu fui tola o bastante para achar que devia sentir a morte dele. Eu não devia mesmo. Eu estava livre de me sentir vazia por não sentir. John abriu meus olhos para o que eu não queria enxergar: a verdade.
– Que merda hein... – Sem muita emoção ele quebrou a longa falta de conversa. – Joguei a merda no ventilador e você ficou toda chocada.
– Não tão chocada. – Admiti. – Algumas coisas eu até poderia esperar. – Me recompus.
– E o que você não esperava exatamente? – John apertou os olhos e se mostrou curioso.
– A parte do caso com outra mulher. – Respondi desviando os olhos dele. – Minha mãe ficaria arrasada se descobrisse...
– Homens são porcos infiéis April. É a natureza. – Divagou como se não fosse um homem e fizesse parte da categoria que não tem um pingo de lealdade.
Fui amordaçada e observei-o deixar o quarto. Pouco tempo depois pude ouvir o chuveiro velho sendo ligado. As luzes não piscaram, então concluí que ele estava tomando um banho frio. Sentei-me recostando na parede e encarei o nada. Todas as lembranças ruins relacionadas a Samuel foram correndo pela minha mente. As sensações terríveis que ele me fez sentir. As inúmeras discussões comigo, com minha mãe... Uma lembrança em especial me ocorreu. Uma das piores.
...
Toda suja de terra eu corria pelo jardim. Brincava sozinha no quintal como quase sempre. O sol brilhava forte naquela tarde e o calor me fazia muito bem. Qualquer criança de 8 anos consegue se divertir em um dia ensolarado, mesmo sem ninguém. Eu não queria parar de correr e me sujar na grama, porém o grito estridente da minha mãe me fez desacelerar.
– Já disse para você entrar April! – Era a milésima vez que ela me chamava.
– Já vou mamãe! – Respondi desanimada.
Antes de entrar dei uma ultima olhada em volta. Balões coloridos no outro lado da rua chamaram minha atenção. Uma menininha de vestido rosa segurava os balões e pulava enquanto era guiada pela mãe.
– FESTA DE ANIVERSÁRIO! – Exclamou animada.
– É amanha querida! Você está feliz, não é mesmo?
A menininha gritou cheia de felicidade fazendo sua mãe rir. Acompanhei-as com o olhar até que virassem a esquina. Aquilo parecia tão distante do que eu tinha em casa. Meu coração infantil se encheu de vontade. Eu nunca tivera uma festa de aniversário. E a data estava chegando pelo que eu me lembrava.
Entrei em casa correndo e parei assim que vi o olhar reprovador de minha mãe.
– Eu não acredito que você se sujou assim! – Esbravejou. – Vou te bater April!
– Eu escorreguei mamãe. Desculpe. – Abaixei meus olhos, envergonhada.
– Já para o banheiro!
Passei me afastando o máximo possível dela e de qualquer tapa que ela pudesse me dar. Funcionou.
– Mamãe... – A chamei enquanto ela esfregava minhas costas suadas. – Faz uma festa de aniversário pra mim? – Pedi baixinho. – Por favor.
– Isso é bobagem. – Ela respondeu depois de pensar alguns instantes. – Você nunca teve isso.
– É... Eu queria saber como é. A festa da Emily foi tão legal. Você se lembra? – Recordei-a de uma das poucas festinhas que eu tinha participado. – Teve aquele bolo tão lindo...
Novamente silêncio. Eu queria insistir, porém sabia que ela se zangaria com minha falação.
– Vou conversar com seu pai a noite. – A mulher, para minha alegria, me surpreendeu.
Ansiosamente esperei que Samuel voltasse pra casa. Geralmente eu não gostava da presença ameaçadora dele, mas nesse dia era tudo que eu queria. Minha mãe não falou nada assim que ele chegou e esperar estava me deixando louca. Eu fiquei a espreita aguardando o grande momento e principalmente a resposta para meu pedido. Fui mandada para a cama logo após o jantar, mas não me abalei. Fingi que me deitei e fiquei perto da porta tentando ouvir se minha mãe iria realmente pedir a ele uma festa de aniversario para mim.
Demorou um pouco, mas ela começou o assunto. Samuel abaixou a TV, o que me ajudou a ouvir melhor. Mamãe contou exatamente o que eu havia dito.
– Podemos trocar o presente pela festa. Ela não se importaria. – Completou diante da falta de resposta dele.
– Serio isso Louise? Não estou ouvindo isso, estou?
– O que foi Samuel?
– O que foi? Você nunca quis fazer essas merdas pra ela. Porque agora?
– Eu não sei... – Ela parecia realmente confusa. – Ela me pediu de um jeito tão...
– Não estou nem aí para isso Louise. Você não será nenhuma mãe do ano se fizer uma merda de festa para April. Sem contar que seria com meu dinheiro, então está fora de cogitação.
– Seria algo pequeno Samuel.
– Não! – A interrompeu novamente, já nervoso. – Ela não merece que eu faça nada. Você não tem direito de me pedir nada assim para ela. – Senti as lágrimas começando a surgir em meus olhos. – Nem sei se essa menina é minha filha mesmo!
As palavras dele me atingiram com força. Como Samuel não seria meu pai? Porque ele não seria meu pai?
– Não fale assim Samuel. – Mamãe pediu tão abalada quanto eu.
– Falo sim, porque é a verdade! Você diz que ela é minha filha, mas não temos como saber, afinal você dormiu com aquele cara várias vezes.
Eu não podia acreditar no que ouvia. Aquela conversa era demais para uma criança, entretanto eu entendia perfeitamente o que aquilo significava.
– Eu tenho certeza de que ela é sua filha! Você vai insistir nisso até quando?
– Sempre! – Rebateu rapidamente. – Vou insistir sempre porque é o que penso. Não se faça de ofendida. Você sabe muito bem que eu tenho motivos.
Ouvi os passos pesados dele e a porta da frente bateu com força. Enxuguei meu rosto na barra do pijama e corri para a cama. Tentei abafar aquelas palavras e incertezas com meu cobertor preferido, porém nada tiraria aquela conversa da minha cabeça. Eu nunca esqueceria aquela decepção e revelação.
...
Saber daquela hipocrisia toda me enojava. Relembrar de todas as vezes que ele acusou minha mãe durante os anos. Samuel não prestava.
Eu só queria dormir. Pelo menos durante o sono eu poderia sonhar em estar bem distante de tudo aquilo e afastar as memórias tão ruins, porém, a madrugada se arrastava lentamente e não me deixava fugir da realidade.
_xXx_
N/A: Gente, eu montei uma playlist no spotify pra fanfic, quem quiser dar uma conferida... Link: https://open.spotify.com/user/glau_keren/playlist/6Da9FgP1tMMG3hKQzMk9vP
Espero que tenham gostado do capitulo. COMENTEM! Beijos.
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DARK PARADISE
Mystery / ThrillerOs piores pesadelos de April nunca poderiam prepará-la para o que estava por vir. Aquele crime não premeditado arruinou tudo. Os sonhos da doce garota escaparam entre seus dedos e ela não conseguiu evitar. No momento em que os olhos verdes de John a...