Seis

194 19 3
                                    




"Você precisa se permitir" a voz da Sra. Desperdício se fez presente, como se ouvisse meus pensamentos. " Sair do casulo. Ou deixar alguém entrar. Às vezes, ficar é sozinha uma barra. Se quiser conversar..." Continuei olhando a paisagem e fechei um pouco mais a cara para o caso de ela ainda não ter percebido que conversar não me agradava.

" Ah, por favor. Alivie essa cara, camz." Foi aí que virei o rosto e olhei para ela. Sem aliviar a cara

"Você disse camz?" Meus olhos saltaram. " Como você sabe esse apelido?" Perguntei

A mudança repentina em sua fisionomia soava como um "Ó-Óu".

"Eu... Quer dizer, você." Ela coçou a testa. "Com que força você bateu a cabeça na Kombi? Você disse seu nome para mim. Camila. E depois falou que alguém te chamava de camz Lembra?"

"Não." Cruzei os braços. "Não lembro."

"Você estava confusa, então..." a interrompi

"Mas não disse camz para você. " sera que eu falei minha cabeça doía como um inferno

"Infelizmente disse o nome e muito mais." Ela olhou pra mim dando um sorrisinho então eu me calei.

A verdade é que eu não tinha certeza. Havia dito algumas palavras, mas não me lembrava com clareza de todas elas e não fazia sentido me preocupar com isso agora. A Sra. Desperdício sabia meu nome e daí? Eu gostava do meu nome. Lauren também.

"camz, que rima com dia, que rima com poesia, que rima com... linda. Lindo, aliás. Seu nome é lindo."

Um estranho silêncio pairou sobre nós até que a Sra. Desperdício saiu da estrada e entrou num posto de gasolina. Desligou a Kombi longe das bombas de combustível, numa vaga camuflada entre os galhos de uma árvore, perto da lojinha de conveniência.

"Preciso tirar essa roupa molhada." Puxou o freio de mão. "E você deveria fazer o mesmo."

" Não tenho outra roupa." Disse ríspida

"Te empresto uma minha." Ela saltou da Kombi e foi revirar sua mala, no bagageiro atrás de mim. " Toma." Estendeu-me uma blusa branca de algodão e calças de moletom.

"Não se preocupe " eu disse, sem me mexer. "Tomei a vacina da gripe. "

"E daí?" Ela falou jogando as roupas em cima de mim

"Costuma ser eficiente. Além do mais, está calor." Falei com desdém

" Vai esfriar mais tarde. É sério " insistiu.

"Estou bem assim." Virei meu rosto pra o lado oposto do dela

"Camila" suspirou. " Sempre teimosa." Quando acabou de limpar seu assento, deixou a toalha, para que eu limpasse o meu depois. "E a vacina não previne resfriados. Anda. Pega logo. Ainda estão com a etiqueta." Não sei se foi a preocupação carinhosa na voz dela ou a falta de lógica da palavra "sempre". Como assim "sempre teimosa"? Mas eu me rendi e apanhei as roupas.

"Vou comprar alguma coisa pra gente comer. Tô morta de fome." Jogou no ombro uma camiseta azul e jeans limpos. "E você nunca esteve tão bem, pode acreditar em mim." Tive a impressão de que, atrás dos óculos de sol, seus olhos me deram uma boa examinada antes de ela bater a porta e começar a se afastar. Fiquei imaginando a cor de suas íris e, num impulso, eu a chamei

"Ei" ela voltou. Debruçou-se na janela."Por que os óculos se está nublado desse jeito? " perguntei, sem saber por quê. Ela pensou por um momento. Fiquei com medo de levar um fora.

" Bem lembrado" foi o que ela disse. "Preciso comprar uma caixinha de Band-Aid. Cortei o supercílio quando me joguei no asfalto." Ela me deu as costas e se afastou outra vez.

Azar o seu! CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora