sete

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"Ah, vai" insistiu. "Se você soubesse como fica sexy com as minhas roupas..."

"Não, nada de paradinha!" Bati o pé, as bochechas corando.


Já passava das sete. Nessas alturas, a Sra. Desperdício sabia que, somadas, minhas dívidas giravam em torno de 21 mil reais. Eu, por outro lado, sabia que ela morava em outro país, que estava em Miami para um compromisso de família, embora ela não tivesse se aprofundado nesse assunto. Em frente ao Parque, na entrada de Miami, o celular dela tocou. Ela estacionou e atendeu.

"Problemas na locadora onde eu deveria devolver o Vectra" disse para mim, desligando o telefone. "Posso guiar para lá?"

"Claro." Quinze minutos depois, a Kombi parava junto ao meio-fio da imensa locadora de veículos. As luzes dentro da loja e em volta dos carros em exposição eram impossivelmente claras, de arder os olhos. Não desci da Kombi. Mas, pelo espelho do carona, reparei quando ela começou a tirar a sua bagagem do carro e colocar na calçada.

"O que está fazendo?" Enfiei a cabeça pela janela.

"Liberando a Kombi para" você." Explicou o óbvio que não me interessava saber. "Isso aqui vai demorar."

"Eu espero." Ela tinha sido tão legal comigo, não custava nada retribuir com simpatia. Além do mais, eu não queria me despedir. Não ainda. "Depois te levo aonde for."

"Eu pego um táxi, fica tranquila." disse pegando seu violao

"De jeito nenhum." Falei negando com a cabeça

"É sério" insistiu, segurando o estojo do Martin D-18 com uma mão e fechando a porta da Kombi com a outra. Eu não podia acreditar que o Martin D-18 estivesse indo embora sem que eu tivesse tido a chance de deslizar meus dedinhos pela madeira polida. Eu nem tinha visto a madeira polida!

"Você precisa descansar, olhe só para você!" Fiquei sem graça. Mas logo depois ela estava rindo, então relaxei e ri também. Por mais que eu quisesse, eu não podia insistir demais. Passar a imagem da garota azarada carente desesperada outra vez. Assim, suspirei com pesar e aceitei a derrota

"Você venceu." Levantei as mãos pro Alto

"Sempre." Disse convencida E agora? O que eu tinha de fazer? Descer da Kombi e me despedir? Como? Apertando a mão dela? Um abraço? Três beijinhos? Mas ela tomou iniciativa. Deixou o violão encostado na Kombi. Ajeitou a mochila nas costas e se aproximou da janela. Eu me afastei e ela se debruçou ali.

"Obrigado pela carona, camila." Disse, ela estava tão perto e a boca tão convidativa. Mas eu não podia

"Obrigada por salvar minha vi... Ei! Você não me disse o seu nome." Ela ficou muito quieta, olhou para um lado, para o outro, mordeu o lábio, coçou o queixo. E voltou-se para mim.

"Essa coisa de nome, sei lá... É uma regra social tão sem sentido!" Beliscou o meu ombro. "Não acha?" Fala sério! Às vezes, ela parecia maluca

."Não." Franzi a testa, meio confusa, meio com vontade de rir. "Era para achar?"

"Por exemplo, se eu dissesse a você que meu é nome Tospericajerja... acredite, seria perfeitamente possível... toda a atração que você sente por mim desceria pelo ralo no mesmo segundo." E deu de ombros, como se fosse a pessoa mais encantadora do universo. Gostei disso e me movi no assento para ouvir melhor.

"Mas já que regras são regras... pode me chamar de gata."

"Gata?" Cruzei os braços. "Oi, Gata. Tchau, gata. Cala a boca, gata" disse, experimentando a ideia. "É. Fica bom assim. Mas... por quê?"

Azar o seu! CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora