XXVII -Missie

24 5 0
                                    



Quando ela achou que sua cabeça não podia piorar, Riley pediu que ela colocasse aquele capacete. Ele havia rasgado a barra de sua blusa e enfaixado o machucado para não ter contato direto com o ferro, mas o tecido era fino e não ajudava muito. A ferida estava começando a suar e coçar, e tudo o que Missie queria era um bom chá e repouso. Principalmente repouso. Os amigos de Riley estavam posicionados entre os cavaleiros e em árvores próximas dali. Uma missão de resgate para os participantes da missão de resgate de Alícia... Que ótimo, pensou. Ela e Riley estavam infiltrados nas fileiras mais afastadas do homem do centro que discursava sobre sacrifícios e ordenava que alguém fosse atrás dos guardas que demoravam de mais. Os esqueletos daquela torre macabra estavam ali também, obedientes, com suas armas inúteis. Eles tinham alguns minutos até o plano iniciar-se. Como Dave descrevera, a Cidade dos Cavaleiros Mortos eram apenas fileiras de lápides que se extendiam por montes e mais montes até sumirem no horizonte. Ela finalmente sentu-se dentro da província da morte. Alguns dos cavaleiros não montavam em cavalos, mas em lobos adultos ou emus. Alfos e Krepto estavam com os companheiros de Riley e Arhem fora amarrado e amordaçado. E mais uma vez, quando Missie julgava não poder ser mais assustador, as pessoas de branco chegaram.

Surgiram de trás de si, caminhando lentamente pelas lápides e aproximando-se do centro da multidão. Eram pessoas vestidas inteiramente de branco que carregavam cabras, frascos com líquidos fumegantes e preás agitados nos braços. Alguns estavam distribuindo giz branco para os zumbis. Missie recebeu um. Riley sussurrou para ela seguir o que os outros faziam, e ela apenas concordou. Dave estava afastado dos dois, mais a frente, com Mata-Touro escondida e preparada para o ataque. E Bia estava longe do alcance de sua visão. Ela havia se voluntariado para essa posição e Missie sentia-se muito culpada. Só sabia que era Bia algumas fileiras à esquerda porque ela carregava uma tocha para iluminar a noite. As pessoas de branco não eram zumbis e isso confortou Missie até ela ver um deles cutucando uma cabra com um punhal.

-Missie, vai! –Riley falou.

Ela percebeu os outros desenhando no chão, e abaixou-se. Os símbolos que faziam eram diferentes uns dos outros, e ela não tinha muita idaia do que fazer. Desenhou uma flor, na dúvida. Riley deve ter revirado os olhos e chegou um pouco mais perto dela.

-É como o símbolo que está gravado no Castelo de Mármore –ele observou. –Triângulos, círculos, retângulos... Tudo se intercalando em padrões que nunca vi...

-E agora uma flor para deixar tudo mais belo –ela falou. Riley não riu. –Ei, aquele é o Dave?

Uma das armaduras aproximava-se dos dois, desajeitadamente. A mão direita estava mal conectada ao braço por causa da espada que ele escondia. Quando chegou perto dos dois sussurrou, sem virar o rosto:

-Eu vi algo parecido nas memórias de uma cozinheira.

-Como é? –Missie sussurrou de volta

-No ano passado, quando fiquei de castigo estufando papagaios na cozinha da escola –ele explicou. –Estava usando meu legado, testando-o, e vi uma cena muito parecida nas memórias de Imani. Havia gente descalça vestida de branco, uma fogueira, cantos bizarros, esses símbolos... E sangue. Um sacrifício.

-E o que acontece se eles não tem o material necessário para o sangue? –Riley perguntou.

-Vamos descobrir agora –Dave voltou para sua posição.

Todos que seguravam tochas deram um passo a frente e atiraram-nas na forgueira. O fogo pegou de imediato e todos urraram em comemoração. Os que vestiam branco estavam próximos da fogueira, com exceção dos que carregavam as cabras. Estes, que também tinham punhais, furaram os animais e recolheram seus sangue em bacias rasas de madeira. As cabras gritavam de dor, contorciam-se e uma até conseguiu fugir, com sangue pingando de sua barriga. Missie sentiu um gosto amargo na boca e respirou fundo. Pior do que ter o ferro em contato com a ferida aberta e latejante, seria ter restos de cereal, maçã e bile inundando seu capacete. Enquanto o sangue era transportado para mais próximo do fogo, as pessoas arrancavam pelos dos preás e soltavam-nos nas misturas fumengantes que carregavam. Estas ficaram mais grossas e coloridas, e foram colocadas junto do sangue de cabra. Missie conhecia algumas coisas sobre poções, era interessante estudar sobre os elfos, quem geralmente trabalhavam com esse tipo de coisa. Mas Missie nunca ouvira falar sobre sangue de cabra e fogo. Aquele ritual não era nada puro como os elfos prezavam. Todas as bacias de madeira foram seguradas acima do fogo, e ninguém se importava com o fogo queimando a pele, a roupa branca ou a própria madeira. O maior cavaleiro, no centro de tudo, tomou um líquido transparente de um frasco que parecia-se muito com o frásco de lágrimas de seria de Dave. Então, tomou o sangue fumegante e pisou na fogueira, com as mãos jogadas para cima. As pessoas de branco começaram a cantar. Sem mover os lábios, faziam sons graves com a garganta e os outros cavaleiros batiam suas armas no chão, ajudando no rítimo deles. Os símbolos desenhados no chão adquiriram um brilho, incluindo a flor simpática de Missie. Então, o cavaleiro no fogo tirou sua armadura, e sua pele morta começou a voltar a ser nova; viva. A carne fechava-se nos ferimentos, rejuvenecia por todo o seu corpo e deixava de ser verde para voltar à cor chocolate que ele tinha antes da morte.

Érestha -Castelo de Pedra [LIVRO 3]Onde histórias criam vida. Descubra agora