Capítulo 4 - Cumprimento

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Se você não enxerga o óbvio, então é completamente cego e ignorante.

***

Emma


Estava realmente claro aquele lugar.

Com uma luz brilhante praticamente me cegando, cobri meus olhos com as mãos, incomodada. Sabia que estava em mais um de meus sonhos, o que já achava particularmente interessante. Logo à minha frente avistei uma porta branca se materializar, e andei até ela para abri-la.

Deparei-me com um lugar menos iluminado, mas animado e cheio de risadas e gritos de crianças. Meu corpo havia diminuído gradativamente, e me dei conta de que estava em uma visão do passado. Toquei meu vestido rosa de babados e os cabelos arrumados em um coque, então coloquei as mãos na frente do corpo e esperei por algo. Se é uma visão do passado, terei de me comportar como antes. Aqui nada pode ser mudado, de qualquer maneira, pensei.

- Ei, Florzinha, não corra assim!

Senti mãos grandes me segurarem por trás e me levantar, me pegando no colo. Olhei para quem fosse, ficando surpresa com a face - ou somente metade da face - de meu pai biológico. Seus olhos eram cobertos por sua longa franja ruiva, quase sempre impossíveis de ver. Ele sempre estava com um sorriso no rosto, o que o deixava com um ar mais bobo e jovem. Normalmente eu costumava chamá-lo de "bobão"', e ele sempre respondia com bom humor.

Eu já sentia as lágrimas escorrendo do meu rosto antes de conseguir detê-las, parecendo mesmo uma criança chorona. Ele riu e tirou um lenço amassado de seu bolso, as secando para mim.

- Não é uma bronca, você não precisa chorar.

- Eu... Eu... - funguei - não quero que vocês me deixem.

Essa é uma lembrança, impossível de ser alterada, não importa o que eu falasse. Ele só ficaria confuso e diria que eu estava falando coisas sem sentido, deixando a cena continuar a desenrolar-se.

Ele me deu um sorriso consolador e arrumou alguns fios soltos de meu cabelo.

- Não irá durar muito tempo, querida.

Agora sim eu estava surpresa.

A última coisa que eu esperava era isso. Era impossível interferir em uma lembrança ou dizer algo diferente, e ele definitivamente disse algo diferente. Eu não tive tempo para perguntar algo porque minha mãe chegou e parou ao nosso lado, arrumando os cabelos atrás da orelha.

- O que vocês dois estão fazendo? Temos que ir antes que os vizinhos continuem a nos chamar de estranhos.

Ela está com aquele olhar superior e também de tédio, sempre o dirigindo para mim, como se eu fosse um incômodo.

- Papa, por favor, me deixe descer. - Pedi. - Preciso fazer algo!

- Claro, - ele me colocou no chão e eu corri - cuidado para não cair, Em!

O jardim de um dos nossos vizinhos começou a se formar em minha visão, todas as crianças do local estavam em escorregadores, pula-pulas, balanços e outros tipos de brinquedos. Era a festa de uma criança da qual não me recordo o nome, e eu sabia a localização de meu único amigo no meio de todas elas.

Quando entrei na casa de decorações coloridas, a primeira coisa que vi foi ele. Ele estava conversando com algumas crianças, possuindo um sorriso doce, provavelmente se divertindo. Seu cabelo estava desarrumado e suas roupas não eram das melhores, mas isso não o deixava menos encantador. Tentei me aproximar, mas seus pais chegaram e ficaram ao seu lado. Estavam falando com uma das crianças, provavelmente a aniversariante, sorrindo para elas. Eu sabia que a mãe dele estava tratando aquilo como um jogo, a fim de se tornar mais sociável com as pessoas da vizinhança. Para ela, eles não passavam de fantoches para seu pequeno teatro.

O Caso de Emma BrownOnde histórias criam vida. Descubra agora