Capítulo 23-*A Substituta*

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Quem morava no subúrbio tinha uma obrigação consigo e outra com o povo. A primeira era usar a linguagem de quem passou por dificuldades, o dialeto das ruas que impõe medo baseado no que já sofreu. A segunda era a que separava os fracos dos fortes; a paixão pelo boxe. Por isso Vanessa podia bater a mão no peito e se gabar de ser uma guerreira de seu povo, pois tinha tudo que uma mulher que se preze tinha que ter, força para bater em qualquer um, aparência linda de dar inveja em muita modelo e frescura zero.

Com essas qualidades podia ser o que quisesse, mas amava o boxe e as sensações que ele passava; o treino duro dia a dia pulando corda e fazendo abdominais até o corpo reclamar, passar horas no "road work" para ter condicionamento físico e os socos repetidos inúmeras vezes no saco de areia onde podia ver a cara de quem iria esmagar no mês seguinte. Todo esse esforço para poder pisar no ringue e vencer no primeiro round por k.o sem ser ao menos acertada. Agora à sua frente estava o homem que dizia poder esmagar sua cabeça com um golpe e talvez isso até fosse verdade se ele pudesse acertá-la. O sujeito enorme e careca que sangrava pela boca e nariz tentava acertar seu corpo, assim como todos os outros tinham tentado. Aquele não era um plano ruim, mas ninguém podia pegá-la, era rápida demais, boa demais. Com menos de cinco minutos de combate o grandalhão beijava a lona; era tão fácil que quase não tinha graça, só quase.

Olhando para o público que torcia fervoroso, levanta os braços com o costumeiro sinal de vitória que fazia toda a arquibancada gritar sua alcunha "Tufão Carmesim". Não entendia bem o que aquilo deveria significar e não gostava do apelido, pois preferia algo como "Punho Sangrento" ou "Assassina de Boxeadores", mas se era disso que seus fãs gostavam de chamá-la, iria aceitar. Subindo no ringue vinha seu treinador, seu melhor amigo e muitos dos odiosos repórteres, os mesmos que diziam que uma mulher nunca poderia lutar contra um homem; como era bom calar a boca deles, isso a fazia sentir um prazer imenso.

Seu treinador a abraça discretamente, já estava acostumado às contínuas vitórias:

____Mandou bem, garota! Defendeu mais uma vez o título e me fez mais orgulhoso ainda, como uma boa filha!

Mesmo que aquela sensação fosse repetida, ela sorri como sempre sorria, com a emoção de ter conseguido arrancar aqueles difíceis elogios; o cinturão não era nada perto daquilo. Ao lado estava Jason, seu amigo mais confiável e por causa do lindo corpo moreno, cabeça lisa e músculos perfeitos, também era alguém que tirava seu fôlego. Ele a olha nos olhos de forma enigmática e com um simples sorriso diz:

____Mandou bem, morena.

Ali havia mil vozes, mas a dele fazia todas se calarem. Retribuindo o sorriso com o cinturão já em mãos, responde com um nervosismo que a fazia bem:

____Eu sei, cara... eu sei.

**********

Mais tarde, naquela noite Vanessa tinha o ritual de vitória, comer uma infinidade de batatas fritas na academia junto com todos seus amigos. Enquanto passava uma quantidade absurda de maionese em suas batatas, não consegue deixar de observar aquele local. No centro havia o velho ringue com cordas azuis com vermelho que ela não deixaria que trocassem de forma alguma e em todas as paredes tinham vários pôsteres de lutadores famosos como Mohamed Ali, Mike Tyson, Jack Dempsey e até mesmo o de Rocky Balboa; não era um lutador de verdade, mas ela queria aquele pôster ali e ali ele ficaria.

Enquanto comiam sentados em um círculo e comentavam a curta luta, Jason permanecia quieto como sempre, apenas ouvindo. Porém em um dado momento em que todos a elogiavam, ele diz distraído:

____Deve ser fácil ganhar quando não tem ninguém que dá dificuldade.

Todos se calam de uma vez e encaram o rapaz que parecia ter percebido o que tinha dito somente naquele momento. Zangado, o treinador se levanta e dá um forte tapa em sua careca:

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