Seis. Foi a hora exata em que eu acordei naquela terça-feira. No dia anterior estava despreocupada e totalmente relaxada para o meu primeiro dia de aula na manhã seguinte. Só que agora, três horas antes de pisar em um novo colégio, me senti uma criancinha que tem medo do armário quando vai dormir.
No primeiro dia de aula eu pude ir sem o uniforme, já que tinha sido matriculada em cima da hora e eles só poderiam ser pegos na tesouraria do colégio. Quando pisei no colégio pensei estar em um daqueles filmes americanos. Sim, o uniforme era bem atrevidinho. As meninas usavam saias azul marinho e blusa branca de abotoar na frente, os meninos usavam calças jeans ou bermudas azul marinho com a blusa branca igual as das meninas.
Na real isso não foi o que mais me incomodo e sim o que constava na minha grade de aulas. Além de todas aquelas matérias chatas de ensino médio, era obrigatório participar da educação física – no meu antigo colégio não era – e ainda teria de escolher uma matéria extra. Escolhi teatro, já que era a única que não precisava usar a matemática.
Eu entrei atrasada na primeira aula, pois tive que ficar um tempão na secretaria esperando a diretora achar e me entregar os horários das aulas. Os outros alunos certamente os pegaram assim que foram matriculados. Ao entrar toda esbaforida na sala de aula, a professora de Português me olhou de um jeito que me fez sentir um pouquinho de medo. Antes dela falar alguma coisa eu lhe entreguei um bilhete da diretora que dizia para ela não me penalizar pelo atraso e ela ainda fez questão de me apresentar para a turma toda.
– Bom, agora eu acho melhor eu ir me sentar para que você possa continuar a aula. – Sim, eu usei o pronome de tratamento "você", pois ela não era tão velha ao ponto de chamá-la de senhora.
– Você não é carioca né? – A professora perguntou.
– Como você sabe? – Respondi, com outra pergunta.
– Invés de falar "tu" usou "você". Geralmente os cariocas falam tu! – Eu estava impressionada com a observação dela quanto aminha linguagem regional. – E também porque a diretora comentou comigo que eu teria uma aluna de Campos nessa turma.
Eu estava envergonhada, não por ser de Campos e sim por todos estarem olhando pra mim sem piscar. Me senti como um ponto turístico. A professora mandou eu ir sentar, fui depressa para a cadeira do fundão. Lá ninguém poderia me encarar sem que a professora chamasse a atenção, há não ser o garoto loiro sentado do meu lado direito que ficou me observando durante toda a aula. E pra piorar mais ainda a minha situação, a professora pediu que fizéssemos uma redação sobre nossas vidas e que depois lêssemos para a turma. Eu levei um século para pensar em algo e depois mais outro século para começar a escrever.
Quando terminei de escrever já era a minha vez de ler, pois todos já tinham lido os seus.
Um Novo Lugar Para Recomeçar
Não me sinto bem o suficiente ainda para escrever qualquer coisa sobre a minha vida. Escrever esse tipo de coisa em um ambiente novo é meio que estranho pra mim. O que eu queria escrever não seriam boas para ler aqui. E pra mim essa é a parte mais interessante em se mudar. Porque aqui não tem nenhuma recordação velha, e muito menos um espaço vazio á disposição para as coisas darem erradas para depois darem certas.
Me disseram uma vez que pra você encontrar algo você deve arrumar tudo que está em volta daquilo. Que não adianta fazer bagunça em cima de bagunça. Minha vida também é assim porque pra mim encontrar algo, preciso procurar aos poucos ou então deixar o espaço vazio, para que assim eu possa buscar em outro lugar.
Um novo lugar.
Demorei um tempo para descobrir que as coisas em minha volta continuam acontecendo independente de onde eu esteja.
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O Outono Que Mudou Minha Vida
Roman pour AdolescentsNo seu 16° outono, Manuela - ou Manu como gosta de ser chamada - passou por um trauma que ainda não foi superado totalmente, em parte pela falta de atenção e sensibilidade de seu pai advogado/autoritário, e outra parte por não conseguir se livrar da...