A Filha Do Tempo

1.4K 134 5
                                    

— Agora vocês estão dispensados. Vão para suas respectivas salas de aula — dizia o monge. — Senhorita Morelli e D'onson, por favor, me acompanhem.

Todos os outros monges e alunos saíram pela porta do refeitório, enquanto Jehtró, Rhea e Morelli caminhavam até o grande jardim da meditação.

— Vai me dizer o que estou fazendo aqui? — perguntou Rhea, olhando para o monge.

— Não se fala enquanto passamos pelo jardim da meditação! — sussurrou Morelli, ao pé do ouvido de Rhea.

— Eu não ligo! — respondeu Rhea, alto. — Quero saber o que estou fazendo aqui.

O monge não dizia uma palavra sequer; andava devagar e concentrado, com as mãos entrelaçadas, enquanto o sol reluzia em sua careca. Seus olhos verdes não se desviavam da grande estátua à frente, e seus pés descalços pareciam amaciar a grama sem quebrá-la. Era uma paz vê-lo tão sereno.

Ao chegarem próximos à estátua, Morelli e Jehtró se curvaram diante dela, enquanto Rhea olhava sem entender nada.

— Curve-se diante da filha do tempo — disse o monge, olhando para Rhea.

— Filha-do...

— Curve-se! — disse Jehtró novamente. Rhea se curvou diante da estátua, mesmo contra a vontade, sem entender a importância daquele gesto, mas o fez assim mesmo.

— Muito bem! — disse o monge, sorrindo. Morelli estendeu a mão para o monge, que assentiu com a cabeça, dando permissão para que ela falasse.

— Mestre, por que o senhor me chamou aqui?

— Sua missão irá mudar, Morelli — respondeu o monge. — A partir de hoje, sua missão será acompanhar Rhea durante toda a estadia dela aqui.

— Durante minha estadia? O quê? — interrompeu Rhea. — Eu quero ir para casa.

— Você já está em casa, viajante.

— Ok... Eu exijo saber o que estou fazendo aqui — disse Rhea, um tanto nervosa. — AGORA!

— Posso esperar em meu dormitório, monge Jehtró? — disse Morelli, desconfortável com aquela situação toda.

— Não, Morelli. Fique! É de extrema importância que você saiba também — disse o monge. — Bom, Rhea D'onson, como você já deve ter percebido, não é a única que tem um dom. Todos aqui conseguem fazer algo extraordinário. Dons concedidos pelo cosmos há milhões de anos. Você pode ser jovem nesta existência, mas sua alma vagueia desde antes deste planeta nascer.

— Como?

— Por favor, me deixe terminar... Nós, os monges, temos a missão de ajudá-los a controlar esses dons.

— Tá... Até aí eu entendi... O que eu que...

— Por favor, saiba a hora de falar. Você me interrompeu...

— Desculpe.

— Como eu estava dizendo, você foi trazida até aqui por dois motivos. Um deles é que você estava correndo risco de morte. Gazu tem um enorme interesse em você e no seu poder de voltar no tempo.

— Posso fazer uma pergunta?

— Sim!

— Quem é Gazu?

— Gazu é um poderoso mestre das trevas que tem sede de poder. Ele aprisiona pessoas com dons e as faz de escravas para conseguir dinheiro e poder. Ele é responsável por muitas mortes no Ocidente e fora dele.

— E por que ele está interessado em mim? Deve haver várias outras pessoas que conseguem viajar no tempo.

— Não há! Um viajante do tempo não nascia há mais de 500 anos. Sua raça foi extinta por demônios na antiguidade — respondeu o monge, apontando para a estátua.

— Mas e o Prexton? Eu o conheci, ele era um viajante do tempo! Me salvou na casa da Melanie...

— É aí que está... Prexton ainda nem nasceu, teoricamente falando... até o presente momento, você é a única viajante do tempo, e é a partir dessa conversa que se levanta uma nova era, onde o despertar dos viajantes começará.

Rhea nem sequer piscava os olhos, ainda impactada com as informações.

— A última filha do tempo morreu protegendo o antigo monastério de Azkan, em 1596. Raj se tornou uma lenda por ter protegido um de nossos celestiais.

— Cele... o quê? — perguntou Rhea, confusa.

— Celestiais são almas que reencarnaram o suficiente para se tornarem puras. Psíquicos que se libertaram da mesquinharia humana. Com isso, seus poderes foram elevados, tornando-se infinitos. É diferente de um Deus, cuja existência foi criada junto com a criação, e com ele, outras milhares de coisas passaram a existir. Um Deus é mais poderoso que um Celestial, mas um Celestial é muito mais digno que um Deus.

— O que ela tem a ver comigo? — perguntou Rhea, olhando para a estátua.

— Você é a reencarnação de Raj!

— Não pode ser. Como assim? Não tem como.

— Mas é. Você é Raj, Rhea D'onson.

— Não sei o que dizer.

— Sei que é muito para digerir! — disse Jehtró, gentilmente. — Morelli, acompanhe-a até o dormitório de vocês. Ela precisa de um tempo para processar tudo isso.

— Sim senhor! — disse Morelli, pegando uma das mãos de Rhea.

As duas voltaram para seus dormitórios. Rhea mal conseguia acreditar em tudo o que ouviu. Em uma hora, ela era só uma garota esquisita tentando salvar seu casamento; em outra, era a reencarnação de alguém muito poderoso. Não dava para acreditar.

Morelli sentou-se em sua cama enquanto observava Rhea sentar sobre a outra.

— Você está bem?

— Não sei dizer.

— Eu sei como se sente... Quer dizer, eu não sou a filha do tempo, mas sei como é a sensação estranha de saber algo assim — disse Morelli.

— Há quanto tempo você está aqui?

— Desde que eu tinha 5 anos de idade... Minha mãe era prisioneira de Gazu. Ela trabalhava para ele roubando diamantes.

— Ela se teletransportava também?

— Sim.

— O que aconteceu?

— Um dia, ela se machucou tentando roubar o maior banco da China. Um dos policiais atirou nela antes que ela conseguisse se teletransportar. Ela morreu. E daí, Gazu imediatamente veio atrás de mim, mas como eu ainda não possuía a magia da prisão, consegui me teletransportar para longe, e Jehtró me encontrou.

— Nossa... Eu... Eu sinto muito por isso — disse Rhea, emocionada.

— Já faz muito tempo...

O monge Bruno era um rapaz singelo que veio do Rio de Janeiro, no Brasil. Desde menino, começou a frequentar o monastério para aperfeiçoar suas habilidades de prever o futuro. Em sua sala de aula, apenas 16 alunos eram capazes de tal façanha. Assim como viajar no tempo, prever o futuro era algo extremamente perigoso. Sem prática e disciplina, o destino poderia ser alterado a cada decisão errada de um vidente.

No meio de sua explicação sobre visões, o monge Bruno se distraiu com sua mente. Logo, a imagem de um rapaz apareceu diante de seus olhos, e ele imediatamente interrompeu a aula, correndo até o jardim da meditação, onde Jehtró estava tomando seu chá.

Ao ver Bruno entrando correndo e esmagando a grama, Jehtró logo soube que algo de ruim estava por vir.

— O que foi, Bruno? O que você viu?

— Monge Jehtró, eu vi o Bear. Gazu mandou ele atrás da filha do tempo.

— Era de se esperar...

— Não, Jehtró... a coisa é bem pior do que parece! — disse o monge Bruno.

— Por quê?

— Gazu sabe sobre a profecia.

A Filha Do Tempo - A queda de GazuOnde histórias criam vida. Descubra agora