Uma Escolha A Se Fazer

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Após algumas horas sentada em uma pedra, a viajante submeteu-se à dor de saber que estava errada. O quanto aquilo era difícil demais para assimilar. A culpa estava pesando demais em sua consciência, então Rhea não pensou duas vezes em entrar no mosteiro atrás do monge.

Assim que o encontrou, meditando embaixo da estátua de Ganesha, pediu desculpas. Jéhtro nem sequer reagiu, continuou na posição de lótus, concentrado em sua meditação. Mas a viajante persistente voltou a chamar a atenção dele:

— Me desculpa, mesmo. Não deveria ter gritado com o senhor, mestre.

Um silêncio se estendeu entre Rhea e o monge e a viajante vencida pelo cansaço sentou ao lado de seu, até então, mestre e por um segundo sua mente foi levada as lembranças de Melanie, onde fez com que seu coração sangrasse um pouco.

— Você ainda está muito presa ao seu passado, minha querida. Isso só lhe atrapalha.

— O que? — Rhea estava assustada, teve a impressão de que o Monge estava ouvindo seus pensamentos.

— Não preciso ser um vidente para saber que no meio dessas suas desculpas tão mornas, o nome de Melanie veio à sua cabeça. Seu subconsciente a chamou para si.

— Mas como eu posso não pensar? — Jéhtro desfez a posição e ficou de pé, em frente à viajante, assim que ela questionou.

— Sei que deve ser muito difícil, D'onson, mas hoje, você tem uma escolha a fazer. — Disse o monge, colocando uma das mãos na testa de Rhea.

— E qual é?

Logo tudo escureceu, tudo ao redor foi sumindo gradativamente. Um clarão então tomou conta e Rhea apareceu dentro da sua antiga casa. Ao olhar para trás, ela se deparou com Melanie e sua filha ao lado de uma moça. Todas pareciam muito felizes.

Rhea se sentiu triste ao ver aquilo, a garota que ela sempre amou nos braços de outra. Sua filha, que não era mais sua, chamando outra de mãe. Foi tudo muito doloroso demais: — Me tire daqui — pensou Rhea, e imediatamente, ela retornou ao encontro do monge Jehtró.

— Agora você está convencida de que está na hora de seguir em frente? — perguntou ele. — Sua família só é sua em suas lembranças, elas não sabem quem você é. Não fazem mais parte de sua vida. Está na hora de tirar isso de seu coração.

— O que eu tenho que fazer? Quais são as minhas escolhas? — Perguntou Rhea, cabisbaixa.

— Ou você esquece Melanie com o tempo ou eu apago suas memórias dela.

— Posso pensar sobre isso? — Perguntou a garota, com dor no coração.

— Claro, Rhea. A escolha é toda sua. Vá descansar e amanhã nós conversaremos.

— Ok! — disse Rhea. — Mas olha, o senhor ainda não disse se me desculpava ou não.

— Não me prendo a isso. Com o tempo entendemos que jamais devemos responder à demanda do outro. Você estava nervosa e assustada. Disse coisas que não eram verdades. Se eu ficasse chateado com isso, significaria que você tinha algum poder sobre mim.

— Eu tenho muito a aprender...

— E vai aprender. Com o tempo. — disse o monge, sorrindo.

— Namastê.

— Namastê! — disse o Monge, reverenciando-a. Rhea foi até o interior do esconderijo, que mais parecia com o mosteiro antigo, só que um pouco menor.

A garota entrou em um corredor e foi direto para uma sala enorme, onde ela imaginou que seria o refeitório. Lá ela encontrou alguns garotos e Morelli, que conversava com Philip sobre o ocorrido.

— HEY? — gritou Philip — RHEA?

— Posso?! — disse a garota ao chegar mais próximo da mesa, indicando o assento.

— Por favor! — Exclamou Morelli — Está tudo bem entre vocês? Você vai ficar?

— É! O que você vai escolher, Rhea? — perguntou o vidente.

— Philip? — disse Morelli, olhando de cara feia para ele.

— Tudo bem... — disse Rhea — Eu não vou embora. Mas tenho uma decisão difícil a tomar.

— Como assim? — Perguntou Morelli, preocupada.

— De qualquer forma, eu terei que esquecer minha filha, meu passado, minha esposa... — dizia Rhea, com os olhos marejados — A única escolha é se vai ser rápido ou devagar.

— Uau... É tão estranho saber que você já foi mais velha! — Exclamou Philip. — Se eu fosse um viajante do tempo, jamais voltaria a ter 18 anos de novo.

Todos riram das bobagens de Philip, mas Rhea ainda estava com uma certa tristeza no olhar:

— Você não vai comer nada? — Perguntou Morelli, preocupada com Rhea.

— Não.. Eu... Não estou com fome. — respondeu Rhea — Eu só quero ir me deitar. Você pode me levar até o dormitório? Eu quase me perdi para achar o refeitório.

— É claro! — respondeu Morelli. As duas se levantaram da mesa e foram juntas até o dormitório. Ao ver aquela cena, os olhos de Philip ficaram brancos e então ele teve uma visão. Um sorriso de canto apareceu em seu rosto e então, seus olhos voltaram ao normal.

Rhea e Morelli seguiram até um corredor extenso e entraram por uma porta, era um dormitório com beliche. Um pouco mais simples do que o antigo dormitório.

— Esses japoneses... Não sei como conseguem dormir em lugares tão apertados! — Exclamou Morelli ao fechar a porta. — Bom, você pode escolher a cama, eu não me importo.

— Obrigada... — Disse Rhea, a garota deitou-se na cama de baixo, de barriga para cima e fechou seus olhos, suspirando.

Morelli olhou por alguns segundos para Rhea e logo após se virou para sair do quarto, para que ela ficasse à vontade.

— Se importa de ficar comigo um pouco? — Perguntou Rhea, acanhada.

— Hã... Não.. Quer dizer.. Eu fico..

— Não quero ficar sozinha aqui!

Morelli fechou a porta e sentou-se na beirada da cama de Rhea. A viajante sorriu e disse que ela poderia deitar ali se quisesse: — Não vou te agarrar, Morelli. Só preciso de uma amiga. — disse ela.

As duas riram e Morelli deitou ao lado de sua nova amiga.

— Obrigada! — disse Rhea, sonolenta. Morelli apenas assentiu.

As duas quase não disseram nada a partir dali, só ficaram curtindo a companhia uma da outra. Até que o sono chegou.

Ao amanhecer, o despertar de Morelli fez com que ela caísse ao chão. Pois percebeu que ela dormira agarrada com Rhea e isso fez ela se sentir envergonhada com a situação. As duas estavam praticamente de conchinhas.

— Droga! — ela pensou, com o susto.

A sirene do mosteiro soou e então ela se teleportou do quarto após se trocar. Não demorou muito para que Rhea acordasse com o barulho estrondoso. De primeira, seus olhos procuravam Morelli, mas ela deduziu que a garota já não estivesse mais ali.

A garota saltou de sua cama e abriu a porta do quarto, indo em direção ao banheiro. Lá ela se despiu e entrou no chuveiro, deixando cair a água quente em seu corpo rígido e quente. Em Tóquio fazia frio naquela estação e isso a despertara da sonolência ainda mais.

Ao sair, ela notou uma roupa em cima de um banco feito de bambu. Era uma espécie de harém, uma calça típica tailandesa, na cor verde-musgo. Junto havia uma blusa preta, com o nome Azkan bordado, sutilmente na manga esquerda.

Rhea se trocou e foi para o jardim. Rhea viu Jéhtro de longe, o monge estava meditando em cima de um telhado bem alto, quase alcançando a ponta da maior árvore do mosteiro.

— Rhea D'onson?

— Ah... Oi Morelli! — disse Rhea. — Estava à sua procura.

— Ficou bonita com o uniforme de Azkan! — Exclamou Morelli — Vem.. Vamos comer.. Jehtró só sai dali de cima daqui a quarenta e três minutos.

— Ok...

A Filha Do Tempo - A queda de GazuOnde histórias criam vida. Descubra agora