A Escolhida

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Julho de 2019 - São Francisco

Palavras confusas martelavam na cabeça de Melanie Crosby, como algo maçante demais para conseguir permanecer em sua plenitude. Melanie abriu os olhos, despertando de um "sono profundo". Com uma enorme dor de cabeça, ela saltou da cama e foi até a cozinha tomar um copo de água.

— O que aconteceu comigo? — ela se perguntou. Tinha a leve sensação de que deveria se lembrar de algo importante, mas não se lembrava de absolutamente nada.

Um nome estranho vagava em sua mente — Rhea —, mas, por mais que Melanie tentasse, não conseguia assimilar onde já tinha ouvido esse nome. Por mais estranho que parecesse, repeti-lo causava uma certa nostalgia boa. Mas repentino. Ali naquele momento nascia um sentimento novo, Melanie sentiu saudades de alguém que ela não conhecia. Uma pontada em seu coração foi a consolidação de que algo diferente estava no ar. E a angustia de não saber o que era, a enlouquecia em forma de lagrimas que se escorreram tão gentilmente em seu rosto.

O brilho da lua iluminava toda a sua sala de estar através de um enorme vidro na janela. Melanie olhou para as inúmeras estrelas no céu. Ao abrir uma fresta, o vento gelado tocou seu rosto pálido com delicadeza. Um vazio se estendia dentro do seu coração, como se acabasse de perder algo que era extremamente importante para ela. Algo que mudaria sua vida verdadeiramente. Como se uma parte de sua existência tivesse sido retirada.

Ao fechar a janela, Melanie andou, com cautela, até o quarto de sua filha e tomada por alguns minutos. De certa forma, aquilo a acalmou o suficiente para que ela conseguisse voltar ao seu quarto e se deitar ao lado de sua esposa, Tessa Bilder. Alguém que, para ela, já não tinha mais a mesma importância de antes. Nada era igual. Nada fez algum sentido em seu coração.

Outubro de 2008 - Tailândia

No jardim de meditação, os monges permaneceram imóveis por horas, elevando suas mentes guiadas pelo Celestial Azkan, com seus 507 anos de idade e existência, o fundador do Monastério, Guardião do Oriente e Ocidente. Um dos Poucos Celestiais que possuía a habilidade de manter seu corpo astral em seu corpo físico sem precisar de magia ou feitiço.

Morelli já estava acordada há algumas horas, enquanto Rhea ainda dormia tranquilamente em seu quarto. Philip corria pelos corredores até chegar ao refeitório, onde estavam todos. Ele entrou ofegante pelas portas, fazendo todos olharem para ele:

— Eles estão vindo! —Contra Philip. Juntamente com sua voz, uma sirene estridente e alta soava por todo canto.

— Tranquem todas as portas! — disse o monge Bruno, que tomava café junto com seus alunos. O monge convocou os outros professores, fazendo os mudras de proteção para impedir que qualquer um entrasse no mosteiro, mesmo que por pouco tempo. Tempo suficiente para evacuar o lugar.

Logo, todos saíram correndo. Alguns desapareceram instantaneamente, carregando algumas pessoas. Outros corriam para um esconderijo no interior da propriedade. Ao ouvir uma sirene, Morelli desapareceu, reaparecendo dentro de seu quarto ao lado da viajante. Ela correu para o lado de  Rhea e pegou sua mão, fazendo com que as duas desaparecessem dali instantaneamente.

Ao reaparecerem longe dali, Rhea acordou num pulo com o impacto. Ao abrir os olhos, viu Morelli sentada ao chão, recuperando a respiração.

— O que aconteceu? Onde estamos? — Rhea perguntou, confusa.

— Em... (respiração ofegante)... To-Tóquio — respondeu Morelli, de cabeça baixa. — Bear estava lá... E a Máfia de Gazu...

— Eles invadiram o monastério?

Morelli respondeu com um aceno positivo de cabeça.

— E o que vamos fazer agora? — Rhea estava preocupada. — Precisamos voltar, eles devem estar em perigo. 

— Eu só parei aqui para descansar. Vou levar a gente para o esconderijo de Azkan. Ele sempre soube que um dia poderia haver uma invasão — respondeu Morelli.

— Esconderijo?

— Outro monastério, maior e mais indetectável.

— Os outros também foram para lá?

— Creio que apenas os saltadores, alguns outros alunos que eles devem ter levado junto. Alguns de nós não conseguimos carregar muitas pessoas.

— Saltadores?

— Pessoas como eu, que se movem pelo espaço, abrindo portais.

— E quem ficou lá? — perguntou Rhea, tentando assimilar tudo. Elas estavam em uma floresta, onde havia uma grande quantidade de cerejeiras.

— Existe um esconderijo lá no monastério, devem ter ido para lá... eu espero, aliás. 

— Eu sinto que a gente deveria voltar lá e ajudar. 

— O meu trabalho é te deixar em segurança... não podemos arriscar. 

— A minha vida não pode ser mais importante do que as outras. — Repeliu Rhea, indignada. 

— Mas é assim que é, não torne as coisas mais difíceis, por favor. 

— Não está certo, Morelli. 

— Vamos, não podemos ficar muito tempo aqui! — disse Morelli, estendendo a mão para Rhea. As duas logo desapareceram sem deixar rastros. Ao reaparecerem, deram de cara com Jehtró e alguns alunos.

— Fiquei preocupado com vocês duas — exclamou o monge. — Não as vi durante a fuga.

— Jehtro? Pensei que estivesse lá no monastério — disse Morelli, surpresa.

— Azkan e alguns mestres deteram Bear. Mas ainda é arriscado voltar para lá — respondeu o monge.

— Podem me explicar por que eles invadiram o mosteiro? — perguntou Rhea, séria.

— Devo lhe dizer que foi por sua causa, Rhea — respondeu o monge. — Há muito tempo sabíamos que um dia Gazu iria querer colocar as mãos em você. Por isso Morelli a levou até o mosteiro. É nosso dever protege-la.

— Me proteger para quê?

— Para se preparar para a batalha que está por vir. É você quem deve derrotar Gazu e libertar todos nós — respondeu o monge, enquanto enfrentava Rhea.

— Como é? — Disse ela, sem acreditar no que estava ouvindo.

— Você é a escolhida, Rhea D'onson!

— Eu não posso ser... Eu sou uma...

— Garota normal? Nada disso é normal, minha querida. As pessoas pensam que vivem em um mundo onde tudo isso é apenas ficção: pessoas que sabem voar, que se movem sem andar, que voltam no tempo... Tudo isso é ocultado há gerações para evitar o caos. Mas sua vida está longe de ser normal, Rhea — disse Jehtró, ao se aproximar da garota. — Quanto mais cedo você aceitar isso, melhor será para você.

— Não... Nenhum de vocês me perguntaram se é isso que eu quero. Só estão me empurrando os fatos goela abaixo, esperando que eu assuma uma responsabilidade que não é minha — Rhea caminhava em passos curtos até o monge. Sua expressão transparência raiva e arrogância para cima de Jehtró. — Eu não devo NADA a vocês — enfatizou, com um olhar quase paralisante.

— Renegar seu povo é renegar sua própria existência. Você tem razão, não nos deve nada — disse o monge, virando as costas para Rhea. — Você não é uma prisioneira, pode ir embora se quiser. Mas estará por sua conta e risco a partir daqui — Jehtró adentrou o mosteiro na companhia dos alunos que estavam ao seu redor. A única que ficou foi Morelli, que olhou com tristeza para Rhea, enquanto ela ainda encarava o monge até ele se afastar por completo.

— Até agora pouco você me implorou para voltar no monastério e salvar o resto de nós que ficou para trás... não finge que não se importa, Rhea... é da sua natureza. — Disse Morelli, um pouco antes de sair dali e acompanhar os alunos.

A Filha Do Tempo - A queda de GazuOnde histórias criam vida. Descubra agora