Sangue Derramado

86 4 5
                                    


Rayane não sabia mais o que fazer para consolar Mariah.

- Eu não devia estar triste, não é? - ela riu penosamente, sem humor algum.

Bryan encontrava-se seguro em seu berço. Adormecido, sorrindo levemente. Respirando.

Teria toda uma vida pela frente. Teria um futuro.

Seu filho estava vivo...

Graças à morte de outra criança.

- Você não podia ter feito diferente, Mary – Blink falou, afagando-lhe as costas.

- Talvez pudesse – Mariah rilhou os dentes – talvez... devesse. Meio milhar de mães agora estão sem seus filhos... meio milhar de crianças mortas. E Bryan só sobreviveu... por que você fez parte disso. Por que tentou me ajudar – lágrimas lhe escorreram pelo rosto pálido -como vou poder contar à Bryan? Como poderei olhar nos olhos do meu filho, e ver o fantasma de todas crianças que morreram no lugar dele?

A jovem não sabia o que responder. Embora fosse doloroso, sabia que Mariah tinha certa razão. Uma terrível, angustiante e incontestável razão.

Quando voltou a falar, sua voz estava angustiada, embora soasse mórbida.

- Eu devia tê-lo deixado morrer.

A garota sentiu seu corpo se arrepiar.

- Não diga isso, Mariah! - ofegou – ele é só um bebê! Nós tínhamos que salvá-lo!

- Não – Mariah manteve-se sem expressão, ainda soluçante - eu precisava salvá-lo. Eu, achando que só eu tinha o direito. Eu... achando que meu filho era melhor do que centenas de crianças prestes a serem assassinadas. Eu... achando ser a única que merecia ser poupada da dor. Tenho Bryan em meus braços... mas os delas estão vazios. E nada substituirá o que tiveram – ela levantou o olhar para Rayane – e, enquanto ele viver, isso irá me assombrar... a vida dele sempre será uma mácula na memória dessas crianças... - choramingou, trêmula – o que foi que eu fiz...?

- Mariah...

Mariah caiu de joelhos, enterrando os dedos contra o rosto e gritando.

- MEU FILHO BEBEU O SANGUE DE UMA CRIANÇA MORTA!

Bryan choramingou no berço atrás de Rayane.

A jovem mãe estava completamente fora de si, e Rayane não conseguiu refrear o próprio choro de desespero, ajoelhando-se ao lado dela.

- Ah, Mariah...

- Meu Deus... - o chão de madeira rangeu quando Mariah despencou – me deixe morrer...

- Por favor, Mariah! - Rayane forçou-a a levantar, abraçando-a – eu sei, está bem? - apertou-a em seus braços, aflita – eu também vi os corpos. Ouvi os gritos. Foi horrível... – acrescentou, ofegante – Bryan nunca vai compreender isso, amiga. Ele é inocente. Não tem culpa de nada... não deixe que isso desabe sobre vocês... muitas mães jamais teriam se disposto a fazer isso para salvar seus filhos!

Surpresa, sentiu Mariah desvencilhar-se dela lentamente, ostentando uma expressão de velada hostilidade. Porém, percebia que não era dirigida à ela.

- E é por isso – disse, num fio de voz – que eu jamais deveria ter feito – fechou os olhos – me perdoe por envolvê-la nisso. Agora... também não há mais esperança para você. Estará presa para sempre. E a culpa também será minha.

- Não, não vai ser. Eu me voluntariei. Fiz isso por vocês.

Mariah guinchou uma risada fraca.

Fênix NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora