Capítulo 26

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Marina
Ao abrir meus olhos, poderia jurar que ainda estava sonhando. Ter aqueles olhos preocupados direcionados a mim novamente me fez viajar e por alguns segundos, esquecer tudo o que havia acontecido. Tentei me levantar quando o barulho de sirene se extendeu por todo o local, tudo veio à tona novamente, olhei ao meu redor e constatei que ainda estava em minha casa, deitada no chão, porém, com a cabeça sobre o colo do Eduardo que logo sorriu ao me ver de olhos abertos. Me levantei de uma vez e me senti tonta, logo Eduardo me segurou com receio de que eu caísse, o que era bem provável acontecer. Sorri em forma de agradecimento. Olhei ao meu redor e vi uma maca, puxei o Eduardo e ao me aproximar da maca, senti meus olhos queimarem e logo, as lágrimas estavam deslizando por todo o meu rosto. Felipe estava ali, ainda inconsciente e com o rosto deformado. Procurei minha mãe e avistei ela conversando com o pai do Gabriel.
— O que ele está fazendo aqui? — indaguei confusa com sua aparição repentina.
— Ele é amigo da sua mãe, deve ter vindo dar apoio. — Eduardo respondeu sem muita convicção, o encarei e o mesmo deu de ombros.
— Foi você, não foi? — sussurrei.
— Que atirou naquele babaca? — indagou e eu assenti. — Sim, fui eu.
— Desde quando você sabe manusear uma arma? — ergui uma sobrancelha com os olhos semi-cerrados.
— Eu sei muitas coisas. — piscou.
— Sabe quem era esse homem? — olhei no fundo de seus olhos.
— Ele é o motivo que me fez ir para Londres, ele é o motivo do nosso afastamento. — lamentou e eu me senti mais perdida.
— Como assim? Não estou entendendo nada. — contei e obtive como resposta um abraço inesperado mas bom, muito bom.
— Fico feliz que você esteja bem. — afirmou ao se afastar de mim.
— Obrigada por ter vindo. — agradeci e ele me deu um beijo na testa antes de ir ao encontro da minha mãe que estava fazendo sinal, chamando-o.
Me sentei no sofá e logo, alguém sentou ao meu lado, não fiz questão de olhar, continuei encarando toda a bagunça que aquele psicopata fez na minha casa.
— Toma, sua garganta deve estar seca. — disse o pai do Gabriel, estendendo um copo com água.
— Obrigada. — agradeci, tomei um longo gole e depois, fiquei fitando o copo e analisando toda a situação. Era muita loucura para um dia só.
— Deve ser bem difícil. — afirmou e eu o olhei, ele nunca foi compreensível dessa forma, o que será que está acontecendo?
— É sim. — concordei e desviei o olhar novamente.
— Felipe deve ser muito importante para você ter se arriscado dessa forma, poderia ter fugido mas não fugiu. — disse com um sorriso orgulhoso.
— Eu o considero como um pai, nem cogitei a ideia de fugir, quem ama, não foge. — afirmei e ele engoliu em seco, fiquei sem entender e o encarei.
— Fique bem. — disse colocando uma mão sobre o meu ombro, forcei um sorriso e ele se retirou.
A voz do psicopata dizendo que ele era meu pai e que matou o Fernando ficou na minha mente, não conseguia esquecer isso de forma alguma. Tinha alguma coisa que não encaixava e eu precisava tirar isso a limpo. Não tinha como ele ter inventado tudo isso e muito menos, acordado com a ideia de que eu era sua filha. Eduardo ainda conversava com a minha mãe quando eu me aproximei.
— Mãe...— chamei e ela me olhou.
— Como você está? Aquele miserável fez algo com você? — indagou preocupada enquanto tocava cada cantinho do meu rosto. — A polícia já está chegando  você vai precisar depor mas fique tranquila vai dar tudo certo e ele nunca mais vai conseguir fugir da prisão! — disse sem pausas.
— Onde ele está? — ergui uma sobrancelha. Poderia jurar que ele estava morto.
— Acabei de ser informada que ele acabou de passar por uma cirurgia, uma das balas estava alojada perto do coração e a outra acertou apenas o ombro. — explicou.
— Eduardo foi muito corajoso. — contei a ela alto o suficiente para que ele escutasse.
— Mas quem quase acertou o coração foi você. — contou e meus olhos se arregalaram instantaneamente.
— Meu Deus! — exclamei assustada e colocando minha mão em minha boca.
— Você se defendeu, fez o correto. — tentou me tranquilizar.
— Mãe, ele disse que era meu pai, que história é essa? — indaguei, mudando totalmente o assunto, Eduardo também ficou surpreso e nós dois a olhamos, minha mãe ficou branca igual papel.
— O que eu posso dizer é que não é verdade. — respondeu meio aflita, senti que ela ainda estava me escondendo algo.
— Responda com sinceridade, eu sou filha do meu pai Fernando, certo? — interroguei e ela se retirou sem me responder, nem ao menos me olhou.
— Ela está atordoada, espera um pouco para fazer seu interrogatório. — Eduardo disse e eu o encarei.
— Tenho o direito de saber, se ela me escondeu algo assim esse tempo todo, eu quero saber agora! — afirmei irritada.
— Seja mais compreensiva. — pediu e eu sorri sarcasticamente.
— Igual a você? — ergui uma sobrancelha.
— Você é muito imatura. — balançou a cabeça negativamente enquanto bufava.
— Ah, me esquece. — falei irritada e fui atrás da minha mãe.
A encontrei em seu quarto, estava sentada no cantinho da cama, cabisbaixa e fungava como se estivesse chorando descontroladamente. Apesar da minha curiosidade e irritabilidade por saber que ela estava me escondendo as coisas, me aproximei, sentando-me ao seu lado e abracei-a fortemente.
— Me desculpa. — pediu ao retribuir o meu abraço.
— Está tudo bem, eu sei que se fez o que fez é porque teve motivos. — tentei ser compreensiva, como Eduardo aconselhou.
— Eu errei... Errei feio. — lamentou.
— Todos nós erramos. — afirmei.
— Você merece saber tudo mas agora não, agora eu não consigo. — disse e seus olhos suplicavam para que tivéssemos essa conversa depois.
— Ok, está tudo bem. — nos abraçamos novamente e me senti próxima como jamais estive, como se fôssemos além de mãe e filha, amigas.
Me retirei do quarto e dei de cara com um Eduardo irritado, não falei nada, apenas segui caminho até a cozinha. Ele me acompanhou em silêncio mas de vez em quando, sussurrava alguns xingamentos.
— O que aconteceu? — indaguei, notando que ele não estava em seu estado normal.
— Seu namoradinho chegou. — contou e eu o encarei. — Gabriel, ou você tem outro? — indagou e eu ri.
— Você fica lindo com ciúmes. — apertei sua bochecha e continuei rindo.
— Princesa, como você está? — Gabriel indagou ao se aproximar de mim, me abraçou forte e sussurrou um "eu te amo", ele realmente estava preocupado.
O modo como ele me tratou não havia sido por maldade mas foi exatamente assim que o Eduardo encarou, resultando nele indo embora sem se despedir. Olhei pela janela e vi ele indo em direção a sua casa, chutando uma pedrinha e pisando firme.
— O que está olhando? — Gabriel indagou curioso e eu apontei para o Eduardo. — Nossa, nem vi ele aqui, depois tenho que agradecê-lo por ter salvado a minha... — disse e eu o olhei, estranhando ele ter pausado a frase. — A minha amiga. — concluiu, dando um sorriso e me abraçando novamente.

◇◆◇

Eu estava exausta, havia feito uma bateria de exames para certificar que nada de ruim havia acontecido, por mais que eu tenha dito umas trezentas vezes que eu estava bem. Felipe havia acordado mas não podia receber visitas, só no dia seguinte. Minha mãe e eu retornamos a nossa casa em um silêncio agradável, enquanto eu jantava, ela ligava para uma diarista vir no dia seguinte. Subi para o meu quarto e peguei meu celular, não havia nenhuma notificação já que pedi sigilo a todos, não queria entrar nesse assunto tão cedo, já bastava eu ter que depor na delegacia. O relógio marcava 10:12PM, fiquei deitada ouvindo música até finalmente dormir.
Acordei com o barulho da porta se abrindo, meus olhos se abriram lentamente por conta da presença da luz, vi que minha mãe estava ali, me observando como se eu ainda fosse a criança que pedia escolta até dormir para que os monstros não se aproximassem.
— Desculpa, eu não quis te acordar. — sussurrou e notei que seu rosto estava vermelho, denunciando que chorara recentemente.
— Está tudo bem. — tentei tranquilizá-la.
— Não. — retrucou balançando a cabeça negativamente. — Ainda não está tudo bem. Desça, por favor. — pediu e eu assenti.
Ela se retirou logo depois, me deixando com um enorme ponto de interrogação na testa. Senti uma sensação estranha, como se eu nunca tivesse sido quem eu realmente deveria ser. Deletei esses pensamentos enquanto tomava banho, senti como se não estivesse lavando somente o meu corpo, mas a minha alma também. Ao triscar meu pé direito no primeiro degrau da escada, senti um arrepio percorrer todo o meu corpo. Me deparei com a família do Gabriel ali, sentada no sofá e aparentemente apreensivos, não tanto quanto eu fiquei.
— Qual o motivo da reunião? Só pra avisar, continuo sem engravidar do Gabriel. — brinquei, porém, todos estavam tensos demais para rir da minha piadinha sem graça.
— Sente-se aqui, meu amor. — minha mãe disse e o sr. Luckmann segurou a mão dela, como se estivesse passando força através do toque.
— O que está acontecendo? — indaguei apreensiva.
— Filha, não é fácil mas... Me perdoa, por favor. — pediu antes de começar a chorar novamente.
— Mãe... — sussurrei enquanto abraçava-a fortemente.
— Fernando não é o seu pai biológico. — disse sem me olhar.
— Como assim? — indaguei totalmente perdida, senti meu coração subir e descer com rapidez.
Gabriel se sentou ao meu lado e me abraçou, encharquei seu ombro com minhas lágrimas. Me senti traída. Não era justo. Eu cresci achando que Fernando fosse o meu pai, eu o amei como um pai e ainda o amava, isso era algo que não dava para controlar e mesmo que desse, não seria justo com ele, pois seus sentimentos para comigo sempre foram sinceros, ele me amava também, eu não tinha dúvida alguma sobre isso.
— Ei, estou aqui com você. — Gabriel sussurrou em meu ouvido enquanto me apertava em seus braços.
— Eu não aguento ouvir mais nada. — confessei baixinho.
— Eu preciso contar tudo. — minha mãe interviu, a encarei e sua expressão demonstrava que se ela não falasse naquele momento, ela iria morrer engasgada ou dificilmente conseguiria ter paz dali em diante.
— Tudo bem...— afirmei, fechei meus olhos e respirei fundo, senti Gabriel apertar a minha mão, abri meus olhos e o olhei, sorri fraco e retribui o aperto em sua mão.

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