III

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Lamento fazer isto, mas iremos retroceder alguns dias antes do ocorrido. Não se preocupe. Será apenas uma recapitulação de alguns fatos. Não vamos brincar com o espaço-tempo, tudo bem? Não que eu não possa fazê-lo... Se eu fizesse acabaria com todo o caos lá fora em instantes... bem, talvez não fosse tão rápido, mas poucos iriam perceber. A questão é que eu fizesse acabaríamos gerando uma anomalia no tecido da realidade. Imagine um mundo onde nós perdemos a guerra para as forças aliadas. Quem tomaria conta da humanidade? Os ingleses? Ou pior... Os americanos? Seria uma verdadeira piada. É provável que este mundo exista em algum lugar do multiverso entre as infinitas possibilidades impensáveis. Se eles vencessem as pessoas não teriam acesso a todas as maravilhas cientificas que nós temos. Nosso mundo não é perfeito, mas nenhum mundo, em realidade alguma, será. A humanidade é podre e está longe da perfeição. A Ordem tentou dar continuidade aos sonhos do Führer à sua própria maneira. Fazer do mundo uma utopia livre do que não é belo. Depois de terem dominado o globo resolveram parar com o extermínio, mas antes disto reduziram a parcela dos impuros a uma quantidade diminuta. Eles ainda existem, sempre existirá a minoria, mas fizeram dela invisível. Ninguém mais se importa com eles a não ser estes fanáticos que resistem ao poder. Também pudera, aceitam qualquer um em seus exércitos. Eles veem beleza em aberrações. Loucos! Eu mesmo tentei elevar-nos a outro nível, mas as coisas não saíram como esperado. Brincar de serem deuses é um hobbie arriscado, porém comum entre cientistas. Até eu me arrisquei, mas é mais difícil do que pensei. Criei um jogo mais divertido e nele eu dou as cartas. Ao menos por enquanto... há gente apostando alto pra tirar minhas fichas. No começo eu acreditei que seria mais fácil vencer... Eu tinha quatro ases na mão... Eu tinha quatro anjos intercedendo por mim. Eu as encontrei, as protegi... Entretanto, elas estão realizando meus desejos do jeito delas. Eu queria destronar Klaus. Achava que Gehard era um líder melhor. Eu era o mais velho dentre nós três e cria que seria ouvido por nossos superiores, mas para eles eu era apenas mais uma máquina. Eu nunca fui uma engrenagem essencial, apenas uma peça descartável tal como os ghoul são para Ordem. Aliás, eis uma questão interessante! A razão das tropas serem nomeadas assim. Em 46, estávamos em Auschwitz desenvolvendo algumas pesquisas. Agradaram-se da ideia de terem soldados desprovidos de medo. Portanto, começamos a desenvolver um inibidor de emoções. A droga expandia as capacidades neurais, mas tinha efeitos colaterais: degradava bastante à aparência dos usuários. A pesquisa foi engavetada. Quando A Ordem assumiu o lugar do Partido Nacional Socialista – o que foi feito às pressas e acusado de golpe de estado – decidiu-se reaproveitar este e outros projetos. Os soldados ficaram pálidos e logo começaram a usar a máscara com filtros de ar que conhecemos. Disseram que era para protegê-los da toxidade que a queima de combustível trazia ao ar. Não foi uma total mentira. O diesel realmente tem feito nosso ar apodrecer, mas eles não se importam com a saúde de ninguém. Deixam todos nós a mercê disto mesmo depois de terem vencido. Talvez devêssemos roubar a energia solar do Japão antes de jogar uma bomba nele. Seja como for... As máscaras com feições de caveira e as fardas pretas dos ghoul dão um motivo a mais para qualquer um temer a Ordem. Todo este meu trabalho de documentar os fatos provavelmente será perdido no futuro, mas o faço com prazer. É necessário que alguém conte a parte da história que eles vão querer apagar. Inclusive, o fato de eu ter mencionado um retrocesso temporal diz respeito a algumas cartas trocadas dias atrás pelos rebeldes as quais transcreverei a seguir. Foram escritas antes da partida de Raquel, mas só obtive-as agora e por isso peço perdão pela bagunça. Seja como for, vejo estes registros igualmente importantes e faço meus relatos quase que como uma confissão a um diário e seria inverossímil se eu movimentasse as páginas desonestamente.

MANÁOSOnde histórias criam vida. Descubra agora