E agora?

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Assim que eu fiz dezoito anos de idade, o resultado do ENEM saiu e como eu já disse, o resultado não chegou nem perto do que eu esperava e precisava. Com isso, meu pai teve a oportunidade de jogar tudo na minha cara que esperava desde que eu fui para uma escola pública.

Quando descobri que não tinha conseguido entrar para uma federal mostrei minha média para minha mãe que me deu o apoio que eu precisava, eu já estava triste demais por não ter conseguido realizar meu sonho de cursar publicidade e ela foi a única pessoa que meu forças de continuar lutando pelo meu sonho. Desde que eu era pequena meu pais tinham feito uma poupança para mim em um banco onde guardaram o dinheiro para pagar minha faculdade, e naquela época usar esse dinheiro deles fazia muito sentido pra mim, eu tinha tentado conseguir as coisas sozinhas mas nada tinha dado certo desde então. Eu precisava entrar na faculdade como a maioria das pessoas que estavam lá na escola, mas eu não queria dar meu braço a torcer e admitir que meu pai tinha razão.

Quando meu pai soube da minha nota naquela prova, ele sentiu o gostinho da vitória e não mediu as palavras para jogar tudo na minha cara. Ele queria que eu dependesse dele, queria que eu dissesse que ele estava certo e que eu precisava dele para que a minha vida fosse pra frente. Mas eu não ia fazer isso, não ia deixar ele vencer, eu sabia que ele tinha ganhado a batalha mas a guerra ainda não tinha terminado. Eu sabia que eu era capaz de me virar sozinha, eu sabia que eu podia fazer muito mais do que ele achava que eu conseguiria, eu tinha garra, eu tinha força e eu queria lutar para mostrar que eu não era só mais uma filhinha de papai.

Em meio a nossa briga eu soltei que iria me mudar, e ele concordou, disse que estava mais que na hora já que eu não concordava com as decisões dele e que eu só era um problema dentro de casa. Me deu dois meses para eu sair de casa. Lembro bem de ter ouvido um grito da minha mãe quando ele disse que eu era o problema da família, mas eu estava tão nervosa que não conseguia parar de gritar com ele. Giovanna estava acostumada com aquilo, me ver brigando com meu pai e chamou a minha mãe para ir pro quarto dela enquanto tudo aquilo acontecia. Por fim eu disse que iria me virar sozinha e que seria muito feliz e que eu não queria mais que ele "participasse" da minha vida, aliás ele nunca tinha participado.

Naquela mesma hora, sai de perto dele e fui conversar com a minha mãe, foi a primeira vez que vi minha mãe chorar. Para ela, eu nunca mais falaria com ela ou com a minha irmã, o que ela não entendia era que a única pessoa que eu não aguentava mais era aquele homem que morava com ela que, nesse momento, já não era mais meu pai. Conversei com ela, disse que a amava e que nunca a deixaria, que elas iriam lá aonde eu iria morar sempre que possível e que eu iria buscar minhas irmã na escola todos os finais de semana para vê-la. Ela continuava chorando como se aquele fosse meu último suspiro, como se ela nunca mais pudesse me ver na vida, como se eu fosse virar uma estrela. Eu a abracei bem forte e disse:

"- Eu nunca vou te soltar"

Ela tinha entendido o sentido da frase, não era no sentido de continuar abraçada pra sempre, e sim no sentido de estar sempre com ela e com a Gi, por mais longe que eu estivesse eu sempre estaria ali, com elas para passar por tudo.

Depois disso tudo, resolvi ir me deitar porém o meu travesseiro nunca foi um bom lugar para dormir. Na minha cabeça só vinha as palavras daquele homem, martelando na minha cabeça.

"Você é o problema dessa casa", "Você não faz nada direito", "Desgosto de saber que você veio de mim". Foram palavras muito pesadas que era muito mais que apenas palavras para mim, eu sabia que eu conseguiria ser independente, eu sabia que eu tinha mente forte e era exatamente isso que me motivava, mas e se eu falhasse? E se eu saísse de casa e não achasse algum lugar para morar? Ou se eu não conseguisse comida? Como eu ia fazer pra sobreviver? E agora?

Eu evitei continuar pensando nisso, tentei montar um plano para que eu conseguisse viver. Passei a noite pensando, e quando deu umas cinco horas da manhã eu decidi levantar. Levantei, fui para frente do computador, procurei na internet como se procurava um trabalho porque eu não fazia a menor ideia de como era, fiz meu currículo, deixei salvo no computador. Logo que acabei a fazer, escutei um barulho de chave e a porta abrindo, era a Rosa. Eu desci correndo, fui falar com ela (como sempre já que eu e a Gi eramos as únicas que falavam com ela naquela casa), pedi ela para me ensinar a cozinhar, a lavar, passar pano e tudo mais. Ela me explicou como passava o pano no chão e me deixou lá enquanto ia ver o café. Eu estava passando o pano no corredor até que vejo alguém em pé encostado na porta da sala de estar. Lá estava ele, batendo palmas com ironia, dava pra perceber claramente nos olhos dele que ele estava ali pra me humilhar.

"- Ué Camila, está aprendendo a ser pobre com essa ai? Tá de parabéns" Disse ele batendo palmas.

Abaixei a cabeça e continuei limpando o chão do corredor. Ele disse que iria sair e que iria voltar com um espanador e um uniforme de empregada pra mim, e ao sair cuspiu no chão que eu tinha acabado de limpar. Eu sabia que ele transformar os meus últimos dois meses naquela casa em um inferno e eu estava morrendo de raiva, mas eu não podia falar nada porque eu sabia que ele queria que eu confrontasse ele, ele estava esperando que eu levantasse a voz pra ele e dissesse tudo que eu queria dizer, mas eu não ia dar esse gostinho pra ele. "Os humilhados serão exaltados", quem disse mesmo? Jesus ou Einstein? Enfim não importa, o que realmente importa é um dia é o dia da caça e o outro é do caçador.

Passei o dia aprendendo muitas coisas com a Rosa e no fim do dia eu estava exausta, como aquela mulher tão pequenininha aguentava todo aquele trabalho? Aliás como ela aguentava aquela rotina todos os dias? Eu tinha muito a aprender com ela. Minha mãe foi me dar os parabéns aquele dia (eu notei uma mancha roxa no braço dela porém não achei nada demais), ela me abraçou, disse que estava muito orgulhosa por mim e me pediu desculpas. Eu fui para o meu quarto, entrei no MSN e comecei a conversar com meus amigos, expliquei tudo o que tava acontecendo, e para a minha surpresa a Diana também estava procurando por algum lugar para morar já que a tia Geralda estava trabalhando de caseira na casa de uns gringos e não dava para a Diana ficar lá também. Tivemos a brilhante ideia de dividir um apartamento. Íamos nos encontrar no dia seguinte para conversar e ver algumas coisas sobre o apartamento e tudo mais.

No dia seguinte decidi procurar um emprego antes de ir encontrar a Diana, imprimi meus currículos e fui andando na rua e deixando minha lista de "experiências" em todo lugar que eu via aberto. Andei por todo Leblon, e depois disso fui encontrar Diana. Nos encontramos e ela me mostrou alguns apartamentos que ela já tinha olhado e que não eram tão longe dali, observei todos e escolhemos alguns de nossas preferências, conversamos, vimos como íamos fazer com os eletrodomésticos e tudo estava pronto, só faltava toda a parte prática.

A vida de CamilaOnde histórias criam vida. Descubra agora