Capítulo 39 - Iris Thompson

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Tormenta: tempestade violenta; temporal, borrasca.

Não era leitora, daquelas que passeavam pelos corredores das bibliotecas empoeiradas e liam livros, dicionários e gramática por trás de olhos de grau como os da Liz; a amiga que nunca me abandonou mas que misteriosamente sumiu.

Enquanto dirigia em direção ao hospital, não acreditava que ela estava realmente no banco do passageiro e para não parecer uma idiota, inventava alguma desculpa para ocupar o silêncio da viagem com besteiras e brincadeiras até lá.

Ontem à tarde, pouco antes de ir ao trabalho ela me ligou. Inclusive, afastei o celular do ouvido para verificar se não havia mudado de número, porém era o de sempre. A nossa intimidade que não era mais a mesma. Mas, também era óbvio isso já que ela sumiu sem deixar explicações e ignorou as minhas tentativas de voltar a falar de novo. Porém, a alegria domou o incômodo das duas e de repente eu já estava perguntando sobre o Thomas, seu trabalho e D. Eliza e, entre um assunto e outro, ela pediu a minha ajuda. De fato, queria rever a minha amiga e também conhecer Claude; por coincidência, era lá onde deveríamos entregar as roupas arrecadadas numa campanha.

Falar pelo telefone era fácil, difícil era buscar um novo assunto para a calada ocupante do banco ao lado que observava as insólitas nuvens brancas perto demais de nós. Outras grandes se uniram a essa mais rápido do que eu dirigia, arremessando um vento gelado que entrava pela janela e jogava meu cabelo no rosto.

Portanto, contrariando a imagem que havia criado até agora, magicamente, mal estacionei o carro na vaga e ela começou a conversar. Desceu do carro, contornou a traseira e esqueceu de pegar as bolsas na mala.

Não foi por isso que viemos?

Liz espiou os dois lados e me esperou junto à porta do motorista, esfregando as mãos.

Dei de ombros e saí também, tendo meu braço enganchado por ela até a porta do hospital. Em seguida, trocamos algumas palavras sobre onde poderia estar o responsável por receber os agasalhos e logo ela enganchou seu braço no meu de novo, dizendo ter lembrado em qual dos quartos ele estaria, e então apenas acompanhei seus passos apressados pelos corredores do hospital. Liz estava perdida e até pensei estar errada sobre os rumos em que era guiada, quando enfim paramos de frente para uma porta entreaberta.

– Vamos entregar as roupas aqui? – Apontei para frente, sem entender. Ela assentiu. – Está bem – hesitei – mas elas ficaram na mala.

– Já vamos buscar – prometeu. – Nós devemos falar com um dos organizadores do evento beneficente para nos ajudar a recolher as bolsas. Estou certa de que não gostaria de carrega-las novamente, certo? – Liz brincou e rimos juntas. O clima entre nós estava se tornando leve de novo e, diferente do vento que bagunçou meus cabelos, a atmosfera era calma.

Por meio disso, concluí que ele devia ser médico e por isso estávamos aguardando do lado de fora.

Então, as luzes do hospital piscaram e as portas da recepção se abriram, empurrando uma forte onda de vento gelado até nós e que fez a porta à nossa frente abrir uma fresta; o suficiente para ouvir vozes lá de dentro. Um arrepio estranho, pior do que uma ventania fria explorou cada centímetro do meu corpo quando reconheci a voz do meu pai e sem pensar parti para dentro do quarto sem imaginar o que encontraria.

O quarto era pequeno demais para caber dois visitantes, o médico e um menininho que observava assustado a tempestade que ganhava forma; nuvens cinzentas, gotas de chuva na janela fechada e mais vento. Um espetáculo do lado de fora, assim como aqui dentro. Ao lado de um homem de jaleco, meu pai e uma mulher muito bonita e com roupas de segunda mão conversavam com ele. Ninguém percebeu que eles não estavam mais sozinhos.

Verão Inabalável (Livro 2) - CompletoOnde histórias criam vida. Descubra agora