Os Dias eram assim

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Os dias foram passando. À sensibilidade cada vez mais baixa. Já estava atingindo a altura dos mamilos. À fisioterapia havia melhorado um pouco meus braços, mas não o suficiente para coçar a cabeça. O tédio é que era o problema. Não aguentava mais o oitos parafusos. A única novidade era o Frank, o nome que eu tinha dado a rachadura com cara de cachorro. Agora eu batia papo com ele, quebrando um pouco a monotonia. Cada atividade extra era uma sensação. Eu curtia horrores os dois minutos que durava o café da manhã. Dia em que acordava cedo demais, eu ficava perguntando as horas de dez em dez minutos, para ver se chegava logo a danada da Elma pra me dar o café. Mais tarde um pouco, vinha minha mãe com um Danone( já estava ficando viciado, eram cinco copos por dia) e o jornal. O Dr.Alex continuava calado. Só soltava um:

-- Está melhor ?
Dia em que ele estava mais criativo, ouvia um:

-- Bom dia, está melhor?
E quando ele estava muito contente:

-- Como tem passado, está melhor?

O Ding Dong não mudava nunca. Pressão e temperatura de três em três horas. Adorava, era o maior programão. Almoço, sopinha. Depois vinha a farra. Chegavam a Nana e a Gorda, geralmente chapadíssimas. Elas me dava um beijo na boca e ficava escovando meus dentes. O processo demorava uma hora. Era uma viagem. Ficar olhando aquele sorriso carinhoso da Nanda e as palhaçadas da Gorda. Ficavam  contando a zona que tinha virado a minha casa. Todo o mundo dando uma bola, enquanto minha mãe estava tomando banho. Às vezes, quando a escovada de dente era muito rápida, eu pedia e ela fazia tudo de novo. Depois, vinham as fofocas de quem tinha estado no hospital. A cabeça genial da Veroca bolou que todo mundo mandasse cartas, bilhetes, telegramas.
Mais tarde, vinha a Eliana, ou a Veroca. Ficavam lendo o livro do Gabeira ( O que é isso, companheiro?). Na maioria das vezes, eu não conseguia prestar atenção. Aquela infernal dor na barriga me tirava de órbita. Mas era bonito ficar ouvindo uma voz baixinho no ouvido. Às vezes, eu dormia com aquela voz. Então, minha irmã saía, mas ficava na porta, pra que, quando eu acordasse, ela continuasse lendo.

Qualquer pessoa que está dentro de um profundo sofrimento, à beira da morte ou de sei lá o que, fica mística. Nessas horas, a gente apela pra tudo. Não que eu tenha me convertido à religião católica, mas estava acreditando nas simpatias, nas abobrinhas populares. Uma mulher, que tinha entrado pra visitar um paciente, me olhou, ficou com dó de mim e me deu uma medalhinha da nossa senhora de aparecida. Eu nem sabia que ela era a padroeira do Brasil, mas pedi para pendurar na minha cama e botei a maior fé naquela plaquetinha de metal. Olhava pra ela, e sentia uma coisa agradável, uma proteção carinhosa.
Ganhei um rádio-gravador estéreo do François, mas preferi continuar com meu radinho do lado da cama. Um dos motivos foi o medo de que estragasse naquela UTI cheirando a éter. Mas o motivo mais forte mesmo foi não querer ostentar, já que a maioria não tinha onde cair morto. Sempre fui assim, meio popularesco, fazedor de média com a classe baixa. Mas tudo bem, o pessoal lá em casa foi quem se divertiu com o gravador.

Minha fisioterapeuta chamava-se Rosana. Linda, simpática e falante. Conversávamos muito sobre Campinas. Olhos pretos, rosto bem queimado do sol, cabelos moreno liso. Chegava, me dava um beijo e ia para as pernas. Dava pra ver o quanto curtia a profissão. Pegava nas pernas com delicadeza e, enquanto falava, flexionava o joelho, levantava, dobrava o pé. Às vezes, parava de falar e ficava movimentando a perna com carinho, bem devagarinho. Depois, sentava na cama e punha meu braço sobre sua perna.

--Tente dobrar. Isso! Mais força! Bom!

Fazia uma massagenzinha nas juntas para relaxar e, depois, a mesma coisa. Eu sentia um prazer enorme com aquelas mãos morenas na minha pele.
Quando me cansava, encostava ao máximo meu braço em toda a superfície de sua coxa. Estava melhorando, já havia uma certa força nos meus ombros. Ela colocou uma mesa ao meu lado e eu ia abrindo os braços, na posição horizontal. Uma hora de terapia, sessenta minutos de carinho e prazer.

Um dia, ela trouxe suas alunas da PUC para me ver. Um monte de menininhas bonitinhas me examinando, me olhando com olho clínico e, ao mesmo tempo, ternura. Acho altamente sensual estudantezinhas de fisioterapia da PUC, uma mistura de inocência com sacanagem. Puro preconceito machista achar que fisioterapia é o mesmo que massagem erótica. Lembrei-me que, por um bom tempo, não teria um relação sexual. Primeiro, essa borracha, a sonda, instalado no meu pinto. Não ia ter útero que aguentasse. Também não ia adiantar, não estava sentindo nada, embora o François me dissesse que, já no primeiro dia, meu pau ficará duro. Estranho não mexer nada debaixo do pescoço e o pinto se levantar. Deve ser um órgão independente, autônomo. " Mas como ele se levanta? Quando alguém põe a mão ou quando penso em alguma situação sexy?" É, não entendia nada dessas coisas e estava ficando curioso. Sabia que existem duas coisas que fazem o pinto ficar puro. Uma reflexiva independente de nossa vontade: isto é, quando fica duro mesmo sem a gente querer. Sempre que pego um ônibus em dia de sol, sentado, ele fica duro. O saco é quando chega a hora de descer. Tenho que fazer altas manobras pra ninguém perceber. A outra ligação é psicológica mesmo, dependendo do estado de excitação. Essa, todo mundo conhece,

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